Imagine um jogo de xadrez, onde cada movimento é cuidadosamente planejado para não apenas capturar as peças do oponente, mas para dominar todo o tabuleiro. No mundo dos negócios, as grandes empresas estão jogando esse jogo em uma escala global. Em seu livro “Everybody Wants to Rule the World” (HarperCollins Leadership, 2021) – ainda sem tradução para o português –, R “Ray” Wang argumenta que, na era digital, a competição não é mais apenas sobre produtos e serviços, mas sobre criar ecossistemas digitais que conectam e ampliam seu alcance.
Para o especialista, fundador, membro do Conselho de Administração e principal analista da Constellation Research Inc., baseada no Vale do Silício, assim como no xadrez, onde antecipar os movimentos do oponente é crucial, as empresas precisam prever tendências tecnológicas e adaptar-se rapidamente para sobreviver e prosperar.
Wang foi um dos palestrantes presentes no Avaya Engage, conferência anual da empresa global de soluções de tecnologia para organizações, realizado em Denver, no Colorado. Enquanto nos poucos minutos em que subiu ao palco discutiu as oportunidades de inovação à vista, na obra, o autor detalha as dinâmicas pelas quais grandes empresas estão construindo suas posições no mercado.
Conheça as DDDNs
Por que a configuração do mercado que temos hoje não é mais a mesma de cerca de 20 anos? Segundo o especialista, os monopólios e duopólios de hoje não são o resultado de uma evolução natural, quase aleatória, de mercados maduros. Em vez disso, são frequentemente deliberada e implacavelmente construídos desde o primeiro dia como data-driven digital networks, ou redes digitais orientadas por dados (DDDN).
“DDDN é qualquer negócio que capture, aproveite e implemente insights a partir de enormes quantidades de dados, frequentemente fornecidos ‘gratuitamente’ por uma grande rede de usuários”, explica o autor.
Dentro dessa lógica, temos grandes indústrias bastante reconhecidas no mercado que representam esse modelo: desde Google – que utiliza dados de pesquisa para vender anúncios personalizados em troca de serviços gratuitos, até Amazon, que utiliza informações de compras na plataforma para vender ainda mais produtos. É também o caso do Facebook – agora, Meta –, que encoraja seus usuários a construírem uma rede de contatos e compartilhar conteúdos, para que então possa vender anúncios baseados em perfis e preferências.
O novo monopólio
“Quanto mais dados de qualidade essas DDDNs coletam e analisam, mais precisamente elas podem direcionar os usuários com produtos, serviços e publicidade mais atraentes… O que leva a mais engajamento dos usuários… O que leva a ainda mais coleta de dados… O que leva a um marketing ainda mais poderoso. Na verdade, isso não deixa espaço para concorrentes porque o usuário fica preso em um ecossistema fechado. Esse efeito de volante impulsiona a dominação exponencial das DDDNs”.
Essa é a premissa para toda a lógica da obra, que explora em minúcias a forma como as DDDNs conquistaram seu lugar ao sol e impediram demais companhias já bem estruturadas no mercado de desenvolverem suas próprias inovações. Desde altas valuations a investimentos de fundos de Venture Capital e ao surgimento de duopólios, tudo aponta para a formação de um ambiente cada vez mais competitivo e concentrado em poucos players.
Assim, Wang oferece dicas, conselhos e diretrizes para que lideranças possam romper com o ciclo e aproveitar também uma fatia desse mercado tão valioso. Ao longo de oito capítulos, o autor explica a evolução desse novo cenário e formas pelas quais organizações podem capturar oportunidades e aprender com quem lidera a inovação global.
De livraria online à loja que vende tudo
Wang realiza uma análise minuciosa da Amazon e seu impacto no varejo, detalhando como a empresa, sob a liderança de Jeff Bezos, transformou-se de uma pequena livraria online para o gigante global que é hoje. O autor descreve a estratégia de Bezos de reinvestir continuamente na empresa, priorizando o crescimento a longo prazo sobre os lucros imediatos.
Nessa construção de sucesso, a Amazon utilizou tecnologias avançadas, como IA e análise de dados, para personalizar a experiência do cliente e otimizar suas operações logísticas. A criação da Amazon Prime, com sua promessa de entrega rápida, é mais um passo nessa excelência, redefinindo as expectativas dos consumidores em relação ao tempo de entrega, forçando concorrentes a melhorar seus próprios processos logísticos.
“Cada DDDN deve encontrar uma maneira de monetizar os cinco modelos de monetização: publicidade, bens digitais, serviços digitais, assinaturas e adesões”, destaca Wang. “Algumas DDDNs se concentrarão em um, mas eventualmente as líderes aplicarão múltiplos modelos de monetização digital à medida que competem pelo maior lucro por cliente”.
Ao analisar essa lógica, o autor apresenta como a Amazon está explorando cada uma dessas cinco abordagens de monetização, desde anúncios e promoções em seu marketplace, a serviços digitais e de assinaturas como streaming, assinatura premium e muito mais.
A história da Amazon exemplifica como uma visão de longo prazo, combinada com um uso estratégico da tecnologia, pode revolucionar um setor inteiro. Líderes empresariais podem aprender valiosas lições sobre inovação, reinvestimento e foco na experiência do cliente.
*Foto: Avaya.