Entre várias tendências em atendimento ao cliente nos últimos tempos, sem dúvida, a mais impactante delas recai sobre o uso da inteligência artificial (IA) para o autoatendimento. A colisão entre o comportamento digital do consumidor e os avanços em IA para diversas aplicações colocaram empresas em alerta para o uso dessa tecnologia na busca da melhor experiência do cliente com sua marca.
Ponte sensível do Customer Experience, o atendimento traz consigo muitas particularidades, e até hoje, mesmo com todos os avanços em automação, vemos ainda a importância do acompanhamento e do atendimento humano para a resolutividade de algumas demandas dentro dessa jornada.
Nessa linha, o Procon-SP realizou uma consulta comportamental inédita entre os consumidores que acessaram seu site oficial, sobre o valor do atendimento por Inteligência Artificial (IA). O objetivo foi captar como o consumidor avalia esta forma de atendimento e se as interações automatizadas têm sido suficientes para atender às suas necessidades e expectativas.
Esta iniciativa nasceu a partir da análise de muitas reclamações registradas pelos consumidores, relacionadas à falta de solução de questões nem sempre complexas, pelos canais de atendimento direto das empresas. E os resultados da enquete comprovam que as ferramentas de interação que utilizam IA precisam de muito aperfeiçoamento.
Mais de 90% dos consumidores participantes disseram ter precisado de atendimento humano após os sistemas de IA não resolverem suas demandas
62% dos consumidores afirmaram que se sentem desconfortáveis e insatisfeitos ao serem atendidos por uma ferramenta automatizada
IA ainda causa desconfortos
O levantamento, que foi respondido por 1.043 consumidores que acessaram o site e redes sociais do Procon-SP ao longo dos meses de setembro e outubro, revela ainda que 66% dos entrevistados não encontraram o que procuravam somente com a orientação automatizada ou não tiveram o problema resolvido; dentre eles, a maioria (59%) havia entrado em contato para reclamar de um produto ou serviço.
Os resultados também revelam que mais de 92% dos entrevistados tiveram que recorrer a um atendimento humano após a interação com um chatbot; 60% disseram que sempre foi preciso e 32% responderam que às vezes.
Sobre a avaliação ao ser atendido por uma IA, quase 62% dos consumidores afirmaram que se sentem desconfortáveis e insatisfeitos ao serem atendidos por uma ferramenta automatizada; menos de 18% respondeu ter se sentido confortável ou satisfeito com a situação.
Perguntados se conseguiram identificar rapidamente que estavam interagindo com uma inteligência artificial, 37% declararam que sempre, 35%, que quase sempre, 14% raramente e 15% nunca conseguiram identificar, ou seja, quase um terço dos entrevistados diz não conseguir fazer essa distinção.
Os desafios do atendimento automatizados com o uso de IA
Cada vez mais inserida no mercado de consumo, a IA é uma ferramenta que pode auxiliar no relacionamento com os consumidores; mas, como demonstrou a enquete do Procon-SP, sob o ponto de vista dos consumidores, os canais de atendimento automatizados com o uso de IA ainda precisam se desenvolver bastante.
“Ainda é possível perceber que há frustração dos consumidores com o estágio atual das ferramentas de interação, que ainda não conseguem compreender todas as nuances de cada situação, seja por não interpretarem completamente as falas ou por não terem um amplo repertório sobre os possíveis problemas”, explica Carlos Coscarelli, responsável pela diretoria de Estudos e Pesquisas do órgão paulista de defesa do consumidor.
“As empresas precisam desenvolver seus canais de atendimento levando ainda mais em conta o ponto de vista do consumidor; assim conseguirão reduzir as falhas que impedem na resolução de muitos problemas simples, especialmente em se tratando de reclamações”, completa.
Segundo o Procon-SP, os resultados desta primeira enquete serão utilizados para gerar mais conhecimento sobre o atendimento entre os especialistas do órgão; no desenvolvimento de ações de educação para o consumo e para a produção de materiais educativos como as cartilhas, os cursos e as palestras oferecidos pelo Procon-SP a consumidores e fornecedores. Além, claro, de atualizar continuamente o atendimento e as orientações aos consumidores.
Para as empresas, a expectativa do Procon-SP é que possam utilizar estas informações, como insumos para análises e estudos voltados à melhoria dos processos e das premissas para o desenvolvimento das ferramentas de atendimento aos consumidores.
Uma experiência em construção
O Procon-SP conclui que os resultados da pesquisa permitem analisar questões básicas sobre o atendimento aos consumidores via inteligência artificial: como os consumidores identificam esse tipo de atendimento, a eficácia do atendimento e a avaliação dos consumidores.
Sobre identificar imediatamente que estão sendo atendidos por uma IA, ao fazer contato com um fornecedor, quase 1/3 dos entrevistados afirmaram que não conseguem fazer essa identificação: 14,67% nunca identificam e 14,09%, raramente o faz.
Se por um lado esse fato pode ressaltar uma evolução tecnológica capaz de simular um atendimento
tão próximo ao humano, por outro, pode levar à ineficácia imediata do atendimento. Ao não identificar essa condição, o consumidor irá agir num diálogo habitual e não irá atender a algumas premissas que muitas vezes condicionam o atendimento pela IA, tais como usar palavras chaves, tom de voz audível e com boa dicção, saber escrever determinados termos, entre outras, o que pode acarretar o encerramento prematuro do atendimento.
Evidente que com os avanços em IAs generativas poderão superar alguns desses gaps no futuro próximo. No entanto, o atendimento ao cliente traz consigo muitas variações em autoatendimento. Ainda é muito comum as experiências em diferentes canais de uma mesma empresa demandarem melhorias e um olhar mais próximo e analítico para novas tecnologias que prometem maior resolutividade. A complexidade e os desafios da omnicanalidade ainda persistem nessa jornada.
A IA pode ser muito atrativa para várias camadas da experiência do cliente, mas, ainda sim, estamos diante de um público consumidor muito diversificado, que espera todo cuidado e atenção no contato com uma marca, seja na sua experiência de compra ou na resolução de um problema.