Toda crise representa um desafio extremo para empresas de todos os portes e segmentos. Isso porque a capacidade de adaptação a um novo cenário normalmente impõe a adoção de mudanças com a cultura corporativa sendo colocada à prova a todo instante.
Mas empresas são agentes de transformação e, para isso, o uso disciplinado e sistemático de processos de inovação é normalmente o fator que as levam a superar adversidades.
No painel “A gênese da inovação: empresas que se transformaram para enfrentar e vencer a crise”, do CONAREC 2020, foram debatidas as lições de empresas que souberam se adaptar e adotaram políticas de inovação efetivas para enfrentar um momento inédito na história corporativa, assegurando resultados sólidos. Empresas que lançaram as bases para uma reinvenção, com novas competências, ideias e inovações de valor.
O desafio de cada um
A mediadora Petria Chaves, apresentadora da CBN, começa o painel perguntando: “qual foi a primeira lição que emergiu quando chegou a crise?”
Candido Pinheiro Júnior, vice-presidente comercial e de relacionamento da Hapvida, foi o primeiro debatedor a responder, contando que a Hapvida sempre viveu à base das crises. “Nascemos como fruto de uma crise econômica, há 26 anos. Sempre trilhamos em caminhos de dificuldades, e melhoramos continuamente”, conta. O vice-presidente diz que o acolhimento, a qualidade e a inovação são os pilares do quais mais se debruçaram desde que esta última crise começou. “Temos dois comitês que tratam de inovação, trazendo para a prática aquilo que for decisivo”, diz.
No Grupo Fleury ficou evidente que a informação e a comunicação são as habilidades mais importantes para se desenvolver em momentos de contingência. Para Carlos Marinelli, presidente do Grupo Fleury, esta é a única maneira de produzir conhecimento. “Através do compartilhamento de informações, fomos capazes de lidar com o desconhecido”, diz, explicando que o Grupo se organizou em comitês no começo da pandemia para fazerem a informação fluir. “Unimos diversas áreas e nos mobilizamos rapidamente. Mas ainda estamos aprendendo como lidar com esse desconhecido”, compartilha.
Fabricio Coutinho, presidente da Teleperformance Brasil gosta de dizer que a Teleperformance é uma empresa de pessoas: “Nos planejamos e definimos com disciplina para onde estávamos indo, sem perder o foco. Mas isso só foi capaz por uma forte capacidade de adaptação das pessoas. Assim, nossa grande lição foi escolhermos as pessoas corretas para nos dirigirem pelo melhor caminho.”
Pensar nas pessoas também foi a primeira atitude da Cielo, que focou tanto na necessidade dos colaboradores quanto dos clientes ― e dos clientes de seus clientes. “Se a pandemia tivesse acontecido há 10 anos atrás, certamente não teríamos tido a aceleração digital que tivemos neste ano. Na área financeira, por exemplo, tivemos uma evolução fabulosa”, compartilha Paulo Caffarelli, presidente da empresa. “E a transformação digital depende intrinsecamente de uma transformação cultural.”
Tecnologia para vencer a crise
Petria Chaves pega o gancho da transformação digital, que todas as empresas mencionaram terem sido aceleradas na pandemia, e perguntou: “Na prática, quais foram as políticas de inovação que vocês conseguiram implementar?”
Graças à criação de comitês de crise, com reuniões diárias na Hapvida, Cândido comenta, hoje todos os protocolos e ajustes de condutas implementados para vencer a crise permitiram que essas reuniões passassem de diárias para semanais.
“Também temos uma healthtech que fez coisas maravilhosas. Avançamos em IA com leitura de diagnóstico e cedemos essa ferramenta ao ministério da saúde”, comemora. “Evoluímos em teleconsultas e fizemos 140 mil atendimentos remotos, com 92% de assertividade ― algo inimaginável antes da pandemia.”
Com exemplos como o da Hapvida, fica claro que organizações que não possuem cultura de inovação e processos ágeis infelizmente ficarão para trás até o fim da pandemia.
Marinelli, do Fleury, comenta que a transformação digital do Grupo só foi possível porque já existiam recursos tecnológicos disponíveis para isso. “Tudo já estava viabilizado. Com a pandemia, as portas apenas se abriram para darmos vida a tudo aquilo que estava sendo subutilizado”. Ele cita os smartphones como exemplo, pois já o utilizamos para comunicação, entretenimento e pedir comida ― e agora e agora também usamos para a saúde conectada.
“Fornecemos telemedicina para quase 4 milhões de pessoas. Se organizarmos melhor a experiência dos médicos e dos usuários, com dados integrados, temos potencial para trazer mais sustentabilidade ao setor.”
As interações remotas e digitais foram totalmente críticas para Teleperformance, que se beneficiou dos canais de atendimento online para manter seus mais de 300 mil funcionários operantes na pandemia. “Sempre tentamos ser mais objetivos e simples possíveis nas inovações. Pra mim, isso é o que traz resultado verdadeiro. Na pandemia as coisas tinham que ser ágeis, possibilitando suporte técnico para todos os colaboradores e aprendendo à medida que as coisas iam acontecendo no mundo”, diz.
A digitalização espontânea trouxe alguns desafios que as empresas nunca antes haviam imaginado. Na Cielo, por exemplo, se depararam com colaboradores que precisaram ter suas cadeiras adaptadas para o home office. “Permitimos que eles viessem à empresa e pegassem as cadeiras daqui, para que pudessem trabalhar melhor”, conta.
Sobre a ótica do cliente, o presidente da Cielo conta que a empresa já tinha um produto chamado superlink há mais de três anos, que passaram a oferecer aos estabelecimentos que estavam prejudicados no início da crise ― o que ele considera uma enorme evolução para os processos de pagamento digitalizado no Brasil.
“O uso do superlink cresceu mais de 800% após a pandemia, além da utilização do QR Code e do NFC. O Brasil começou a sair do tradicional, enxergar novas soluções e vencer a crise”, comemora.
Emerge uma nova sociedade
Petria Chaves encerra a discussão entrando no sensível ponto do campo da saúde em meio à pandemia ― o principal assunto em todos canais de comunicação nos últimos oito meses.
Carlos Marinelli compartilha que já estamos vivendo um momento totalmente novo neste campo, principalmente ao se evidenciar o quanto saúde é escassa no Brasil. “Desde então vemos um movimento de maior valorização das pessoas em relação à saúde.” Mas ele levanta um contraponto: “Ao mesmo tempo que sabemos que essa nova relação é uma evolução, precisamos ter em mente que os problemas antigos continuam ― apenas adicionamos novas tecnologias para trazermos melhores estatísticas”. Para o presidente do Fleury, este é um novo momento de tecnologia e conectividade na saúde, mas tudo isso significa apenas que uma nova camada de facilidades foi inserida ― e que as camadas problemáticas continuam lá embaixo.
Fabricio Coutinho concorda que as pessoas estão cada vez mais preocupadas com suas qualidades de vida, e acrescenta:
“Precisamos aprender a fazer a gestão de todas essas novas mudanças. Com isso, acredito que iremos nos tornar uma sociedade cada vez melhor. Os líderes e gestores já não são mais os mesmos, os colaboradores não são mais os mesmos. Estamos mais próximos, mas de uma forma diferente”, finaliza.
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