Alguns meses após o final da Segunda Guerra mundial, os estudiosos de marketing da época começaram a observar um gasto adicional em produtos com algo grau de indulgência pessoal. Essa atitude ficou conhecida como “revenge spending”, em tradução livre, um gasto por “vingança”, como uma forma de se esquecer o ocorrido e se recompensar emocionalmente. Outro efeito bastante estudado, com impactos semelhantes, é o “lipstick effect” ou efeito batom, que se caracteriza por gastos com pequenos luxos, em momentos de crise.
Neste caso, o conceito é que, quando a renda fica pequena para gastos maiores, as pessoas transferem parte do desembolso para categorias mais baratas, porém comprando marcas premium dessas categorias. E, como você já se deu conta, estamos vivendo um momento muito propício no Brasil para ambos os efeitos. Não apenas a pandemia deixou um impacto emocional e econômico profundo, mas também o longo e intenso processo eleitoral, além de notícias tristes de guerras, mortes e perdas de emprego, que vêm dominando o noticiário desde o ano passado.
As oportunidades do efeito batom
A grande pergunta é: o efeito batom serve apenas para cosméticos? Eu acredito que não e dou como exemplo a categoria de máquinas de bebidas quentes, as famosas “máquinas de café domésticas”. Em anos anteriores, a categoria vinha crescendo bastante, porém, a explicação básica era o trabalho “em casa” (home office). Outras categorias de eletroeletrônicos também cresceram muito.
No entanto, quando comparamos o acumulado das vendas de janeiro e fevereiro de 2023, contra o mesmo período de 2022, vemos um crescimento de impressionantes 25%. Para tornar a análise ainda mais interessante, o segmento de máquinas mais caras, acima de R$600, cresceu 80% e já representa 17% das vendas. Isso está acontecedo mesmo com o retorno ao trabalho presencial – ou seja, é uma venda quase “contracíclica”, se considerarmos o home office como um elemento da economia do comportamento.
O mais interessante é observar como as marcas aproveitam esse desejo dos consumidores e o transformam em experiências no varejo. No final de 2022, foi inaugurada uma loja conceito para Nescafé Dolce Gusto NEO, em São Paulo, idealizada por um arquiteto (Guto Requena) especializado em experiências imersivas. A loja permite degustação de diversos sabores, apresenta cápsulas de papel, enfim, a narrativa completa para o momento.
Modelos que dão certo
Outro elemento a se observar é a execução da ativação da marca em parceria, já que a Arno produz, mas a maior parte do relacionamento com o consumidor final é feito pela Nestlé (pela Dolce Gusto). As vendas diretas ao consumidor nessa categoria, seja para máquinas ou cápsulas, também merece destaque, já que o controle da jornada de compra é maior por parte das marcas. Isso não impede que a máquina tenha boa distribuição no varejo de massa, estando presente em quase todos os marketplaces.
Isso ainda traz uma vantagem adicional aos potenciais compradores: com uma rápida busca, após terem decidido modelo da máquina ou sabores das cápsulas, podem comprar pelo menor preço.
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O importante desse caso é que há maneiras de se conquistar a carteira e o coração dos consumidores, mesmo no ambiente em que estamos vivendo. Há um desejo genuíno de se “presentear”, de dar um tempo nessa vida maluca, de ter um prazer um pouco mais exclusivo. Cabe às marcas explorarem bem o sentimento latente, apresentando histórias sensíveis e execuções bem integradas.
Felipe Mendes é General Manager Latin America da GFK
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