Que a pandemia de covid-19 impactou de maneira substancial as nossas rotinas e hábitos, não há a menor dúvida. A grande questão que se coloca agora é: como o comportamento de consumo da população, especialmente no Brasil, se modificará a ponto de não reconhecermos mais como nos relacionávamos com nossos hábitos anteriores enquanto consumidores, não só em ambientes domésticos mas também em ambientes públicos e eventos sociais.
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Para entender como isso deve acontecer, a Bain & Company se propôs a entender o futuro do consumo no Brasil e como a pandemia impactou o comportamento da população. De maneira geral os efeitos, tanto de saúde quanto de renda, foram disseminados entre todas as classes sociais. O senso de preservação fez com que a preocupação sobre o bem-estar fosse elevada. Resultado disso foi que comportamentos relacionados ao estilo de vida e à saúde foram ressignificados. Além disso, o controle financeiro foi mais rigoroso, com 88% dos brasileiros cortando gastos durante a pandemia.
Esse impacto na renda fez, inclusive, com que o brasileiro fosse mais prejudicado na sua capacidade de economizar, quando comparado com outros países. Nosso estudo mostrou que, no Brasil, o número de pessoas que guardaram menos dinheiro foi 28% maior do que o de entrevistados que pouparam mais. Nos Estados Unidos, só para efeito de comparação, o número de pessoas que guardaram mais ou muito mais dinheiro foi 16% maior. Isso em razão do impacto da menor atividade econômica, do emprego e da renda.
É evidente que, dada a preocupação das pessoas com seu poder aquisitivo e sobre o quão rápido conseguirão recuperá-lo, isso gera um consequente impacto nos seus hábitos domésticos. Nosso estudo identificou que as atividades relacionadas ao ambiente do lar passaram a ter relevância. Entre elas, estão: cozinhar (84%), assistir à televisão (77%) e cuidar da casa (64%). Além disso, o entendimento sobre o trabalho remoto e o ensino à distância ganhou nova dimensão, especialmente por somar-se à preocupação com a saúde. Entendemos que parte desses comportamentos adquiridos, que indicam maior tempo gasto em casa, deve se prolongar mesmo após o fim da pandemia.
A despeito do impacto financeiro que a pandemia trouxe para as famílias, um aspecto considerado positivo no comportamento do consumidor durante esse período foi a adesão ao comércio eletrônico, especialmente nas compras de supermercado. Ou seja, de maneira geral, com as restrições impostas pela crise de covid-19, nosso estudo mostrou que 76% dos brasileiros afirmaram ter feito ao menos uma vez compras de supermercado de maneira totalmente virtual – embora 88% deles ainda mesclem esse novo hábito com as compras físicas. Vale destacar o fato de que não houve fricção na experiência do digital, de modo que todos os espectros socioeconômicos avaliaram como satisfatória a jornada de consumo no ambiente online.
Isso representa uma mudança que ganha tração de maneira mais rápida do que se esperava. É natural que, com a evolução dos meios digitais, os consumidores passem a consumir mais virtualmente. Porém, o que vimos é que esse comportamento foi acelerado na pandemia. Com esse hábito mais arraigado, não apenas as pessoas passarão a exigir experiências ainda melhores como também as empresas precisarão repensar como agradar mais a esses novos clientes.
Colocada em perspectiva, nossa pesquisa mostrou que o comportamento do brasileiro sofreu grandes alterações, com foco, sobretudo, em supermercado, delivery, saúde e bem-estar. Esse último, inclusive, ganha destaque com a busca dos brasileiros por consumo de alimentos mais saudáveis (50%) e atenção ao peso corporal adequado (32%) – sendo esses os aspectos positivos nas mudanças de hábitos mais detectados em nossa pesquisa.
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Ainda levará um tempo até vermos uma retomada da normalidade nas atividades fora do lar. Ainda assim, o grande ponto que se coloca é que, no futuro, dadas as mudanças de comportamento observadas, as empresas precisarão se adaptar rapidamente para oferecer a melhor jornada. Com o surgimento de novos comportamentos relacionados ao consumo doméstico e digital, maior preocupação com saúde e bem-estar, além de uma maior sensibilidade a preços e custos, espera-se que esses novos hábitos sejam incorporados às preocupações sobre conveniência dos canais físicos e digitais (omnicanalidade) e respeito à sustentabilidade – que já eram pontos de atenção observadas no pré-pandemia.
Embora o estudo tenha apontado que há demanda reprimida em várias categorias nas quais os consumidores esperam gastar mais no futuro fora do ambiente doméstico – principalmente em viagens, comida, bebida e beleza -, a pandemia trouxe uma mudança radical nos hábitos de consumo. Portanto, uma coisa é certa: o comportamento do consumidor brasileiro nunca mais será o mesmo. E as empresas precisarão urgentemente se adequar a essa nova realidade.
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*Por Federico Eisner e Luciana Batista, sócios da Bain & Company.
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