É notório que os países da Europa e os Estados Unidos possuem leis consistentes que garantem os direitos dos consumidores. A legislação contudo, não padroniza o relacionamento com o consumidor. As características culturais mostram que há diferenças substanciais na forma de atender. Casada com um norte-americano, aprendi cedo a compreender o modo de atender deles. Se por um lado temos informação, produtos de boa qualidade e serviços excelentes, temos um atendimento frio ? totalmente desprovido de entusiasmo; completamente profissional.
Para os brasileiros, um choque! Na Europa, a mesma coisa. A diferença é que as informações prestadas sobre determinado produto não têm tanta exatidão; nem sempre você vai ter do vendedor a resposta que necessita sobre o funcionamento de produtos e serviços. Quando não há um produto que o consumidor procura, não há interesse do vendedor de oferecer algo similar ? ou um produto adicional.
Uma história me chamou atenção. Em visita ao Japão, uma amiga contou que aguardou a abertura de uma loja de departamentos. Quando as portas subiram, o grupo de vendedores e os gerentes estavam a postos para receber os clientes com uma salva de palmas. Um forma extremamente educada de mensurar que o cliente é a razão de ser da loja; a figura mais importante no cotidiano desses trabalhadores. É claro que não podemos sonhar que a polidez nipônica influencie o atendimento ao cliente em países como o Brasil, mas creio que a história seja inspiradora para todo gestor que valoriza um atendimento de excelência.
No Brasil, a criação do Código de Defesa do Consumidor ? Lei 8.078, aprovada em 10 de setembro de 1990 ? foi um marco da luta em prol dos direitos do consumidor, embora a Constituição Federal de 1988 tenha preparado as bases para a defesa do cliente brasileiro. De forma mais ampla, a demarcação desses direitos e deveres foi um estágio anterior à nova cultura de valorização do bem atender o consumidor. À época, vivíamos situações esdrúxulas nas quais o consumidor era constantemente desrespeitado. Em pouco mais de duas décadas, presenciamos uma melhora significativa, porém muito distante do que almejamos e merecemos. Hoje, estamos distantes de países da Europa e dos Estados Unidos no que se refere ao atendimento.
Nos Estados Unidos, a criação da Consumers Union ? na década de 1930 ? deu início a processos de análises, testes comparativos de produtos e preços que eram amplamente divulgados na revista Consumers Report. O consumidor norte-americano tem, desde então, informações precisas e abalizadas que norteiam a relação com marcas, serviços e produtos. Em 1962, o presidente John F. Kennedy enviou ao Congresso dos Estados Unidos um documento com fundamentos da proteção aos consumidores, estipulando direitos à segurança (o consumidor não poderia ser exposto a perigos); à informação (proibia a omissão de dados relevantes sobre o produto); à livre escolha (assegurava a livre decisão de compra ao consumidor); e a ser ouvido ? obrigava os fornecedores a receber queixas dos consumidores e a tomar providências para solucioná-las. A data de entrega do documento, 15 de março, passou a ser celebrada como Dia Mundial dos Direitos do Consumidor.
Na Europa, a França e a Alemanha foram os países que saíram na frente na década de 1940 na questão da defesa dos interesses dos consumidores. Com a organização de pequenos grupos que levavam as reivindicações a comerciantes e industriais, os franceses e alemães mostraram o que seria, em um futuro próximo, a força do consumidor. De forma ampla, na década de 1980, a Organização das Nações Unidas (ONU) passou a reconhecer os direitos do consumidor. Embora recente, a medida deu força a iniciativas empreendidas em todo o mundo.
Esse breve histórico nos ajuda a compreender as relações de consumo que hoje temos nesses países. No Brasil, os rankings de reclamações do PROCON e o fluxo de relatos de consumidores em jornais, revistas e portais on-line revelam o quanto estamos longe de um atendimento primoroso. Na Shopper Experience, transformamos o site da empresa em um canal no qual o consumidor pode registrar suas impressões sobre o atendimento ? uma forma de gerar conteúdo para que as marcas e as empresas tenham a real dimensão da importância de atender corretamente.
Ao incentivar os consumidores a detalhar determinada experiência de compra, excelente ou desagradável, estamos convidando as pessoas a serem coautoras de uma ação importante para disseminar boas práticas e dissecar as más. Além disso, colaboramos conjuntamente para que o atendimento ao consumidor atinja patamares de excelência no Brasil.
* Stella Kochen Susskind é presidente da Shopper Experience ? empresa pioneira em cliente oculto no Brasil.
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