Em janeiro, a montadora francesa Renault anunciou o lançamento de um serviço de assinatura de veículos no Brasil com preços a partir de R$ 869 por mês. A notícia chamou atenção não por ser novidade – Volkswagen e Toyota, entre outras marcas, já possuem programas similares no país – mas por reforçar a ideia de que, ao contrário do que pregava o velho comercial de televisão, o desejo de ter está dando lugar ao aluguel por assinatura.
A tendência de substituição da compra pelo uso é mundial e já tem alguns anos. Segundo o autor e estudioso das gerações Mark McCrindle, esse é um comportamento diretamente ligado à chegada à fase adulta dos millenials, os nascidos entre 1981 e 1994, que hoje representam 34% da população brasileira, cerca de 70 milhões de pessoas.
Essa geração, também conhecida como Y, trouxe consigo a era do despossuimento, ou da imaterialização, marcada pela falta de desejo de adquirir bens materiais.
“É uma geração que valoriza o consumo consciente, o comprometimento das marcas com sustentabilidade e com causas sociais e ambientais”, diz a psicóloga clínica cognitiva comportamental, Glauciane Alves de Aro. “O compartilhamento de bens é a nova tendência do mercado dessa geração, que já influencia as gerações anteriores”, explica.
Mercado brasileiro está agitado
Diante desse comportamento de consumo, o mercado brasileiro está se adaptando e todos os dias surgem novos serviços de assinatura nos mais diferentes segmentos.
Além de carros, é possível fazer o aluguel por assinatura de equipamentos de academia, roupas e até de moradia. Ou seja, em vez de comprar ou fazer um contrato tradicional de aluguel, os consumidores podem assinar um plano semestral ou anual e ter acesso ao que deseja.
A Housi, criada em São Paulo em 2019, por exemplo, oferece apartamentos mobiliados, com limpeza e manutenção inclusas, que podem ser alugados, ou melhor, assinados, pelo prazo que o usuário desejar sem todas as burocracias de um aluguel clássico, como necessidade de um fiador ou multa de rescisão. A ideia surgiu porque, de acordo com a empresa, 80% dos novos consumidores já não têm interesse em adquirir imóveis.
Outro exemplo é a Ustyle, empresa que oferece aluguel por assinatura de roupas. É como ter um “closet fora de casa”. Assinando os planos, a cliente tem direito a um crédito mensal de roupas para usar por 20 dias, devolver e escolher as novas peças para o mês seguinte.
Academia em casa
Recém-lançada, a ZiYou é a nova startup do fundador da Netshoes. A startup possui o maior portfólio de assinatura de equipamentos esportivos do Brasil e oferece planos mensais a partir de R$ 149,00.
“A posse tem muitos entraves e alto custo, enquanto o modelo de compartilhamento é muito mais democrático e flexível para dar liberdade às pessoas. Acreditamos num forte crescimento desta modalidade para os próximos anos nos mais variados setores”, diz Marcio Kumruian, fundador da Netshoes e da ZiYou.
A empresa nasceu para atender a necessidade de pessoas interessadas em praticar alguma atividade física, mas sem frequentar uma academia ou ter que desembolsar uma grande soma de dinheiro em equipamentos.
“Este modelo oferece liberdade para as pessoas e democratiza o acesso a produtos e serviços de qualidade a preços muito mais acessíveis se comparado ao modelo de aquisição. Ou seja, você não tem o compromisso do alto custo e nem da mobilização de um item que depois vai ficar parado na sua casa”, explica o empresário.
Brasileiro está aderindo ao compartilhamento
Uma pesquisa realizada antes da pandemia em todas as capitais do país pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) mostrava 81% dos brasileiros estão dispostos a adotar mais práticas de consumo colaborativo, sendo que o percentual era próximo em todas as faixas etárias e classes sociais.
Em um levantamento similar realizado um ano antes, o percentual havia sido de 68%. O aumento, segundo os realizadores da pesquisa, se deve à influência da tecnologia, com a internet e as redes sociais colaborando para desenvolvimento da confiança das pessoas no modelo colaborativo.
“A economia compartilhada une dois propósitos, que é fazer o orçamento render e contribuir para um mundo melhor, a partir do uso racional de bens e serviços. A internet ampliou exponencialmente esse movimento, colocando essas pessoas em contato por meio de sites e aplicativos”, afirmou o educador financeiro do SPC Brasil, José Vignoli.
Na opinião de Marcio Kumruian, a pandemia de Covid-19 potencializou o interesse. “A tecnologia e a evolução do mundo já vinham provocando uma transformação de comportamento na sociedade e a pandemia acabou acelerando alguns novos hábitos que seriam naturais ao longo do tempo, como o de se procurar por assinaturas de produtos em detrimento da aquisição”, diz.
A tendência é que esse interesse não diminua, na medida em que as experiências positivas de aluguel por assinatura transformem seus usuários em advogados da causa.
Essa é a expectativa de Kumruian. “É natural que, mesmo após a pandemia, boa parte das pessoas que iniciaram uma atividade física em casa mantenham o hábito, pela facilidade de adaptação na rotina e comodidade de ter acesso a tudo o que você precisa no conforto do seu lar”, afirma. Outros seguimentos do mercado também apostam nisso.
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