No final de semana, o público do The Town, festival de música realizado no autódromo de Interlagos em São Paulo, teve no line up shows de artistas nacionais e internacionais como Ney Matogrosso, Demi Lovato, Bruno Mars e Luísa Sonza. Enquanto isso, os mais de 70 mil frequentadores do festival Burning Man, realizado no estado de Nevada, nos Estados Unidos, se encontravam – e se encontram, até o momento – presos no meio de um deserto. Para agravar a situação, uma morte foi confirmada e está sob investigação.
O evento norte-americano, que começou no domingo, 27 de agosto, acontece no deserto de Black Rock, no estado de Nevada, sobre um antigo lago que secou. No entanto, entre sexta-feira e sábado, 1º e 2 de setembro, uma forte chuva transformou o lugar em um grande lamaçal. Estima-se que a região recebeu a quantidade de chuva prevista para dois ou três meses – cerca de 20,8 milímetros – em apenas um dia. Como resultado, ficou impossível carros transitarem pelo terreno e mesmo caminhar se tornou difícil. Para isso, as pessoas estão tirando o sapato e usando sacolas plásticas para protegerem os pés.
O êxodo do evento começou dia 4 de setembro – mesmo dia em que está previsto para o encerramento do festival, porque as condições climáticas permitiram. Mas os dias que eram para ser de festa e de música foram uma experiência muito diferente daquela esperada. Lidando com a lama, o racionamento de comida e água, a inundação de tendas e abrigos, e ainda assim tentando aproveitar algumas atrações que estão acontecendo no local.
Leia mais: The Town deve reunir 500 mil pessoas: marcas se preparam para festival
O Burning Man
O festival foi realizado pela primeira vez em 1986, organizado por um pequeno grupo de artistas e amigos em San Francisco, na Baker Beach. Para celebrar o solstício do verão, os participantes queimavam a figura de um homem de madeira – por isso, o nome. Desde então, o evento cresceu em tamanho, proporção, custo e valor de ingresso, atraindo não só artistas, mas também celebridades, influenciadores digitais, e empresários e funcionários de grandes empresas e startups de tecnologia.
A cada ano, o Burning Man constrói uma cidade temporária no deserto de Black Rock, reduto do festival desde a década de 1990. São cerca de 70 mil pessoas a cada edição do evento, que precisam dirigir por cerca de três horas desde o aeroporto mais próximo, e enfrentam um trânsito que em condições normais já é bastante congestionado.
O deserto de Black Rock fica em um parque nacional no estado de Nevada, em uma área de 2.600 quilômetros quadrados. A chamada Playa possui um terreno coberto por argila que há 15 mil anos era submerso pelo lago Lahotan. Trata-se de uma das maiores superfícies planas do planeta. Quando seca, torna-se destino para trilhas, veículos e, neste caso, festivais de música.
Mas quando o solo é encharcado pela chuva – principalmente no inverno e no início da primavera – o terreno pode sofrer inundações, além de criar um ambiente cercado por lama de difícil trânsito. As chuvas inesperadas transformaram os últimos dias do festival em um verdadeiro teste de sobrevivência a condições severas. O site do evento passou a atualizar um guia com sugestões e avisos para os visitantes ilhados conseguirem se manter no local até a liberação de carros e a reabertura dos portões. O público foi orientado a respeitar as forças policiais no local, e os que quiseram caminhar na lama até conseguir sair do evento puderam pegar a linha de ônibus que está prestando apoio aos visitantes.
Apesar dos pesares, os organizadores ainda pretendem fazer a queima do Burning Man – a figura humana de madeira tradicional do festival.
Assine nossa newsletter!
Fique atualizado sobre as principais novidades em experiência do cliente
Ethos de sustentabilidade
No dia seguinte à inauguração de 2023 do Burning Man, um grupo de manifestantes bloqueou a rodovia que leva ao parque de Black Rock. O grupo pedia práticas mais sustentáveis e ecológicas na realização do festival. Algumas das demandas incluíam a proibição de uso de utensílios plásticos de uso único, de geradores a combustível e propano, assim como o banimento de jatos particulares por parte dos participantes.
As demandas não são infundadas. Segundo um relatório de sustentabilidade da organização do festival de 2020, cerca de 90% da pegada de carbono do evento tem como origem as viagens de ida e volta do Burning Man. Já 5% das emissões são resultantes da queima de geradores a combustível que mantém equipamentos elétricos como luzes e ar-condicionado ligados durante toda a semana. Cada edição do festival gera cerca de 100 mil toneladas de dióxido de carbono – valor próximo da emissão de 22 mil carros movidos a gasolina em um ano.
No mesmo relatório, a organização do Burning Man colocou três objetivos até 2030: manejar resíduos de forma ecológica, criar impacto ecológico e ambiental positivo, e retirar mais carbono do ambiente do produzi-lo. No entanto, poucas iniciativas foram implementadas até agora.
Além disso, um dos princípios do festival – listado em seu “ethos” – é o “leave no trace”, ou seja, “deixar nada para trás”. Uma vez que a Black Rock City, onde o Burning Man é sediado, é uma cidade temporária, essa missão se torna ainda mais desafiadora. A edição do Burning Man de 2022 mostrou que os visitantes ainda não compreenderam este mandamento. Participantes, organizadores e a mídia apontaram a quantidade de lixo e resíduos deixados para trás ao fim do festival. Uma força-tarefa foi convocada para limpar a área.
A organização do evento ainda precisa mostrar que está comprometida com seus próprios princípios para criar uma experiência, além de prazerosa, sustentável e de impacto positivo.
Tá pegando fogo, bicho!
Seja pela temática ou pelo reduto de milionários, ao falar sobre o Burning Man, é quase inevitável lembrar do Fyre Festival. Realizado em 2017, o evento prometia um festival de música luxuoso em uma ilha exclusiva nas Bahamas. Os ingressos custavam entre US$ 450 e US$ 12 mil. Os visitantes, além de assistir aos shows, ficariam hospedados em tendas refinadas com camas king size, e receberiam refeições preparadas por chefs renomados.
No entanto, ao chegarem ao local do evento, os frequentadores perceberam que o que prometia ser uma viagem de luxo se tornou um acampamento. Com acomodações desconfortáveis, em uma praia bastante frequentada por turistas, sem a presença de artistas nos palcos, muitos tentaram deixar o local. Mas vários foram barrados por autoridades devido à lotação dos voos e da ilha. Pelo mesmo motivo, muitas aeronaves nem conseguiram chegar às Bahamas.
O Fyre Festival se mostrou um grande fiasco e virou objeto de estudo de dois documentários. Pouco depois da data do evento, seu organizador, Billy MacFarland, foi preso sob acusação de fraudes que somavam US$ 26 milhões. Condenado a seis anos de prisão em 2018, MacFarland foi solto em 2022. Esse ano, ele anunciou que pretende criar uma segunda versão do festival e já até lançou a pré-venda de ingressos.
Leia mais: Rep Festival pode ser multado em mais de R$12 milhões
A experiência dos festivais
O primeiro final de semana do The Town, em São Paulo, também passou por alguns perrengues. Antes mesmo da chegada ao evento, os visitantes enfrentaram a linha de trem 9-Esmeralda com falhas e tempos mais longos de parada na estação.
No sábado, o público precisou transitar pelo autódromo de Interlagos sob a chuva, que chegou a molhar até mesmo os palcos cobertos. Os visitantes também reclamaram da fila para entrar no festival, criado pelos mesmos organizadores do Rock in Rio, que estava longa e desorganizada. Alguns visitantes relataram que esperaram mais de duas horas para entrar no local do evento.
No entanto, o saldo do The Town até o momento parece ter sido positivo. O público reverenciou os shows realizados no primeiro fim de semana, que contou com um line up nacional e internacional. Apesar da chuva, os efeitos não foram os mesmos que local do Burning Man – sem lama e com a circulação liberada. A expectativa é que o festival brasileiro receba cerca de 500 mil pessoas em seus cinco dias.
Enquanto o The Town ofereceu uma experiência que superou as expectativas de seu público – apesar dos problemas já conhecidos pelos brasileiros –, o Burning Man ainda precisa rever elementos cruciais de sua organização. Isso vai além da escolha do lugar que receberá o festival. Os frequentadores também criticaram ao impacto ambiental causado pelo evento e os compromissos que ainda precisam ser concretizados.
+ NOTÍCIAS
Conhecer o cliente é fundamental para realmente atender suas necessidades
Como ruptura de canais impacta a jornada do cliente