As empresas de bens de consumo têm enfrentado um momento desafiador, marcado por uma expressiva redução nos gastos dos consumidores. Esse cenário, resultado de fatores econômicos e mudanças no comportamento de compra, tem gerado um impacto significativo nos negócios. À medida que as organizações buscam se adaptar a essa nova realidade, torna-se essencial entender as causas e consequências desse fenômeno para desenvolver estratégias eficazes que possam garantir a sustentabilidade e o crescimento em tempos de incerteza.
Diante disso, o desafios das empresas de bens e consumo é retomar o crescimento em volume após um expressivo aumento de preços em 2023, impulsionado pela inflação. Isso foi indicado no “Relatório Global de Bens de Consumo” da consultoria Bain & Company, que destaca a limitação para novos reajustes de preços e cortes de custos, exigindo que as organizações revisem seus conceitos e estratégias. A consultoria global entrevistou mais de 120 executivos seniores de diferentes regiões do mundo para captar suas percepções sobre como restaurar valor e lucratividade ao setor.
Apesar de 2023 ter registrado um crescimento considerável no setor, há pontos críticos a serem observados. Globalmente, o valor das vendas no varejo (RSV) aumentou quase 10% de 2022 para 2023, mas três quartos desse crescimento se devem ao aumento de preços. Nos Estados Unidos e na Europa, os reajustes de preços foram responsáveis por 95% do crescimento do RSV, enquanto na América Latina essa parcela alcança 85%. Esse cenário reflete, principalmente, o impacto do aumento dos custos e das commodities para as empresas.
Custos de produção
A pesquisa investigou ainda o quanto o aumento dos custos de produção influenciou a desconexão generalizada entre o crescimento dos preços e o volume de vendas. De acordo com 82% dos executivos entrevistados, a inflação teve um impacto significativo em seus negócios.
“De um lado, durante a alta dos preços, os consumidores acentuaram a polarização do consumo, com muitos migrando para marcas mais acessíveis ou para produtos premium em categorias específicas – outros também passaram a comprar menos ou em promoções”, comenta Ricardo de Carli, sócio da Bain e líder da prática de bens de consumo para a América do Sul. “Em contrapartida, os preços não subiram o suficiente e, para reduzir gastos, grande parte das principais companhias do setor está recorrendo a grandes programas de corte de custos para compensar o impacto nas margens”.
Os números do setor refletem essa contradição: enquanto 54% dos executivos relatam ter sido fortemente impactados pela redução dos gastos dos consumidores em 2023, as empresas aumentaram os preços em mais de 20%, em média, desde o terceiro trimestre de 2021. Apesar disso, a margem EBIT média caiu para um dos níveis mais baixos dos últimos 10 anos, atingindo 12,2% no terceiro trimestre de 2023, comparado ao pico de 13% em 2020.
Diante desse cenário, o crescimento sustentável neste novo contexto depende de estratégias como investimentos em mercados emergentes – que ainda oferecem potencial para aumento de volume – e compreensão das novas demandas dos consumidores, que se tornaram mais sofisticados e diversificados. O sucesso nesse ambiente exigirá uma reformulação completa das propostas de valor, dos portfólios e dos modelos de negócios.
IA como vantagem
Investimentos em ESG e tecnologia se destacam como desafios que, se enfrentados com seriedade, podem gerar vantagens competitivas significativas. No que diz respeito à tecnologia, as empresas que liderarem o uso de gestão de dados e Inteligência Artificial (IA) generativa terão uma vantagem, com ganhos evidentes em otimização de tempo, personalização no atendimento e fortalecimento do relacionamento com o consumidor.
A crescente pressão por sustentabilidade exige que as empresas avancem em metas ambientais, sociais e de governança. Atualmente, metade dos consumidores globais considera a sustentabilidade como uma das quatro principais preocupações ao realizar compras. No entanto, apenas 20% dos entrevistados indicam que a proteção ambiental é uma prioridade para 2024. Entre as empresas, cerca de 10% acreditam estar atrás de seus concorrentes em termos de impacto positivo no planeta.
A redefinição da agenda de crescimento é a principal prioridade para o setor de bens de consumo em 2024, e a melhor maneira de alcançar esse objetivo é adotar uma abordagem equilibrada que atenda às necessidades dos consumidores, clientes, colaboradores e do planeta. Para a maioria das organizações, isso exigirá uma transformação completa — do portfólio, das capacidades e das estruturas empresariais. Embora seja um desafio complexo, é possível superá-lo. Com a crescente pressão do mercado, adaptação e inovação serão fundamentais para o sucesso contínuo da indústria de bens de consumo.
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