A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) vem buscando meios de atribuir responsabilidades aos grandes usuários de serviços de telecomunicações. E, com isso, certamente, nos próximos meses, o Brasil será palco de um verdadeiro embate. De um lado, as grandes empresas de tecnologia e inovação que desenvolvem produtos e disponibilizam serviços através da internet, as chamadas “big techs”. Do outro lado, as “teles”, que são as empresas de telecomunicações responsáveis por fornecer toda a infraestrutura de internet.
As teles acreditam que estão trabalhando para que as big techs tenham lucro. E a luta, na realidade, é para que os custos de manutenção da infraestrutura para a prestação de serviço de internet sejam repartidos. Então, no dia 29 de janeiro a Anatel divulgou os parâmetros para a segunda consulta pública sobre o Regulamento de Obrigações dos Usuários.
Segunda fase da consulta pública
Para minimizar as adversidades, o objetivo da consulta pública é desenvolver um novo conjunto de regras que possam reduzir similarmente as disparidades regulatórias existentes entre as grandes empresas de tecnologia e as operadoras de telecomunicações.
Essa próxima etapa da discussão, então, deve mostrar a trajetória para a possível atuação da Agência em questões como a compensação das redes, além das práticas chamadas de abusivas e de pirataria.
O destaque da segunda fase da consulta pública é que, desta vez, a Anatel procura apresentar uma análise mais aprofundada sobre alguns tópicos, indicando alternativas viáveis.
Com base nas informações já coletadas, a Anatel elaborou seis temas que serão objeto de Análise de Impacto Regulatório (AIR). São eles:
- Tema 1: Impacto nas redes de telecomunicações.
- Tema 2: Desequilíbrio regulatório entre agentes do ecossistema digital.
- Tema 3: Desequilíbrio da proteção dos consumidores nos ambientes tradicional e digital.
- Tema 4: Indícios de competição desequilibrada entre os atores do ecossistema digital.
- Tema 5: Desequilíbrio entre os investimentos cabíveis a cada agente do ecossistema digital com vistas à expansão e à sustentabilidade da infraestrutura de rede.
- Tema 6: Desequilíbrio entre os distintos agentes do ecossistema digital quanto a medidas de transparência.
Dentre as opções apontadas na consulta pública para sanar o problema estão a compensação das teles pelo uso das redes pelas grandes empresas de tecnologia (possivelmente direcionada a um número limitado de grandes plataformas). Ademais, outras alternativas são: a flexibilização das regras aplicadas às próprias operadoras, novos modelos para a resolução de disputas entre as cadeias e uma possível contribuição das maiores geradoras de tráfego em fundos setoriais.
Impactos na conectividade
A Anatel ressaltou explicitamente que, em contraste com a primeira coleta de subsídios realizada no ano passado, que abordava questões amplas, essa agora apresenta uma conjuntura mais problemática. Evidentemente, com a consulta pública, ela espera contribuições da sociedade para checar se há, de fato, um risco de desequilíbrio entre os provedores de serviços de telecomunicações e os provedores de SVA. E se sim, a pergunta que fica é: quais são os impactos na conectividade e em todo ecossistema digital?
Em evento online, Felipe Lima, gerente de regulação da Agência, afirmou que um dos problemas identificados na primeira consulta foi o uso massivo de conexão de dados ou tráfego telefônico. “Em conclusão, os Serviços de Valor Adicionado (SVA) são considerados usuários dos serviços de telecomunicações”, afirmou o gerente de regulação.
Vale destacar, para esclarecer, que o SVA é um tipo de serviço pago disponibilizado pelas operadoras de telecomunicações que vai além do pacote tradicional de voz e dados. Esses “pacotes adicionais” geralmente estão relacionados ao entretenimento, bem-estar, interatividade, segurança e educação.
Sugestões até 15 de abril
Essa segunda consulta pública sobre o Regulamento de Deveres dos Usuários corresponde ao item 6 da Agenda Regulatória 2023-2024. Os interessados em contribuir poderão enviar suas sugestões através do sistema Participa Anatel, até o dia 15 de abril, de forma sigilosa.
A Agência abordará os pontos nesta segunda consulta pública do Regulamento de Deveres dos Usuários. É possível consultar os quesitos no PDF disponibilizado no Google Drive.
O que as operadoras querem?
Em resumo, o que as operadoras de telecomunicações estão buscando é uma “contribuição justa” das grandes empresas de tecnologia nos investimentos de redes, também conhecida como “taxa da Internet” pelas plataformas digitais.
No ano passado, o presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Carlos Baigorri, reiterou o papel da entidade na fiscalização das grandes empresas de tecnologia. Em uma audiência na Câmara dos Deputados para discutir o Projeto de Lei nº 2768/2022, ele ressaltou a atuação da agência reguladora na área concorrencial de mercados na construção do Plano Geral de Metas de Competição (PGMC).
Projeto de Lei
O Projeto de Lei nº 2768/2022 propõe a regulamentação do funcionamento e operação das plataformas digitais. A regulação abrange ferramentas de busca, redes sociais, serviços de computação em nuvem, e-mail, plataformas de compartilhamento de vídeo, entre outras. Todas as plataformas seriam consideradas SVA, sujeitas à fiscalização e sanção pela Anatel.
Como os SVAs são ofertas extras disponibilizadas pelas empresas de telefonia, no momento, a Agência possui poder de regulação limitado sobre esses serviços. As plataformas digitais poderiam regular, prevenir e reprimir, segundo o texto. A Anatel ficaria a cargo de identificar as transgressões de ordem econômica, exceto pelas atribuições do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).