A popularização dos aplicativos de mensagens instantâneas transformou significativamente a maneira como as empresas se comunicam com seus clientes. Com a conveniência de enviar uma mensagem a qualquer momento, muitos consumidores abandonaram os tradicionais números 0800 em favor dessa nova forma de contato. No entanto, essa mudança levanta questões sobre a aplicabilidade das leis de atendimento ao cliente, em especial a Lei do SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor).
Diante desse cenário, o painel “O Whatsapp matou o 0800: como fica Lei do SAC?”, mediado por Guilherme Farid, sócio da Advocacia Engholm e Capez Advogados Associados, reuniu líderes de variados setores durante o evento A Era do Diálogo 2024 para debater como as empresas podem se adaptar para garantir um atendimento eficiente e em conformidade com a legislação vigente.
Segundo Alecsandro Cavalcante, head of Customer Care da Globo, o impacto acaba sendo imenso, até pela expansão e pela representatividade que o WhatsApp hoje tem no Brasil. Ele pontua que, por aqui, mais de 147 milhões de pessoas têm acesso à ferramenta, o que mostra o quanto ele é representativo.
“Nós sempre falamos, no meio do atendimento, sobre estar onde o cliente está, e não tentar direcioná-lo a um único canal. Se tem um canal que o cliente hoje está, é o WhatsApp, então, é inevitável que tenha um impacto enorme e que as companhias precisam, de fato, se adequar”, pontuou. O executivo acrescentou ainda que o WhatsApp não irá matar o 0800 por questões legais que determinam a existência de outros canais. Além disso, é necessário que haja capilaridade para consumidores que não têm facilidade com as novas tecnologias.
Transformação do atendimento
A ascensão do WhatsApp impactou diretamente na qualidade do serviço prestado ao consumidor. Diante do cenário, Fábio Magalhães, head of Customer Experience do Banco Bmg, pontua ser necessário medir a satisfação do cliente, e uma forma pragmática de fazer isso é perguntar diretamente a ele se a demanda foi solucionada. Ainda segundo o executivo, muitas vezes é dada uma visão de processo interno à solicitação do cliente, que é dada como resolvida. Mas, para fazer a medição de satisfação, é importante ter a opinião do consumidor.
“Nós fazemos esse tipo de pesquisa. O WhatsApp hoje é um meio de comunicação; é um caminho que não tem volta, e é difícil brigar com o que o consumidor gosta. Acho que tem até que fomentar isso. O Bmg é um banco predominantemente consignado, então, é um público idoso. Vemos nas pesquisas que o consumidor prefere usar o WhatsApp ao invés de um URA, de um bot, de um chat, porque ele é fácil de manusear”, reforçou.
Fábio Magalhães pontua que, quanto à legislação, é necessário ter cuidado quanto ao que o consumidor busca. Além disso, frisa que quando se fala em multicanalidade, significa ter todos os serviços disponíveis através do cliente e ele escolhe por qual meio prefere ser atendido.
Ao integrar o WhatsApp como canal de atendimento, existe o desafio de garantir a conformidade da Lei do SAC. Alexandre Fontes, superintendente de Operações e Clientes da Veloe, a Lei estabelece um patamar e, através dele, é importante entender que ela é o começo de uma conformidade. Sendo assim, apesar de ter o WhatsApp integrado, é necessário garantir que outros canais ainda estejam disponíveis para atender as necessidades de uma série de perfis de clientes.
“Para isso, precisamos garantir a informação, o dado, e esse dado trabalhado cada vez mais para poder deixar claro para nós quais são os perfis de clientes que você terá que atender no dia a dia, além de segmentar, dentro dos canais, serviços que de fato façam sentido. É preciso ouvir o cliente, entender se todos os serviços que ofereço estão com os seus gaps mapeados, para que eu ofereça nesses canais o suporte e o apoio necessários para que esse cliente, quando fizer o contato, seja atendido. Além de, claro, eu ter a disponibilidade do canal”, comentou durante o painel.
Ainda segundo Fontes, em caso de problemas complexos, dificilmente o consumidor usará o WhatsApp para solucionar. Nesses casos, serão usados os outros formatos de contato. Sendo assim, conhecer profundamente os processos das empresas é fundamental para gerar os canais e atender a dificuldade que o cliente apresenta.
Além disso, é necessário adotar boas práticas para oferecer um atendimento eficiente pelo canal de WhatsApp. Diante desse desafio, Rafael Jordan, head of Customer Service da Buser, reforça que o WhatsApp passou a integrar a rotina das pessoas. Quanto ao telefone, é procurado quando há a necessidade de resolver um tema complexo. Sendo assim, para que o aplicativo de troca de mensagem seja de fato um canal efetivo, é importante que passe a oferecer resolutividade.
“Se você garantir que esse canal funcione bem, os seus clientes migrarão para o WhatsApp, porque está no dia a dia dele. Então, é preciso fazer pesquisas recorrentes, perguntar como o problema do cliente está sendo resolvido, entender como está o mix de canais, investir em uma campanha que incentive o cliente a entrar em contato por esse canal. Se fechar esse ecossistema, terá mais pessoas falando com você e satisfeitas. Como consequência, vai reduzir o custo da operação”.
WhatsApp, 0800 e o futuro da ligação telefônica
Quanto ao futuro do 0800, Alecsandro Cavalcante reforça que os demais canais ainda existem. Na Globo, por exemplo, ainda há pessoas que expressam suas demandas na coluna de reclamação do consumidor. Sendo assim, tem acontecido uma migração ao longo do tempo. O surgimento do 0800 criou uma cultura do consumidor falar com a empresa, e isso vai continuar acontecendo. Porém, cada vez mais, o canal telefônico segue para um viés de ouvidoria.
“Temos que ter a competência de resolver as demandas dos nossos consumidores nos nossos canais digitais. Se você quer ligar para a empresa, você se prepara e separa um tempo do seu dia, mas ninguém quer isso. As pessoas querem praticidade e que a empresa seja proativa, entregando informações que o cliente não precisa colocar energia para ir buscar. A empresa tem que passar por esse desenvolvimento dos seus canais digitais, com uma jornada fluida com o consumidor”, comentou.
Ele reforça também a necessidade de oferecer um atendimento sempre que o cliente não conseguir resolver sua demanda no canal digital. As empresas devem pensar nas transposições das barreiras, pois ajuda o consumidor a ter suas respostas rapidamente. Além disso, reforça que o 0800 continuará existindo e as empresas devem estar em todos os canais.
Diante desse cenário, para buscar uma eficiência no atendimento, é importante identificar qual perfil de cliente prefere o atendimento digital, e qual irá optar pelo 0800. Alexandre Fontes reforça estarmos vivendo uma era onde a informação é a base do negócio. Seja a Inteligência Artificial (IA) ou chatbot, serão usadas informações capturadas através de todos os canais, para poder definir claramente qual o perfil de cliente tem sido atendido.
“No mundo em que nos julgamos multitarefas, acho que precisamos oferecer soluções simples para que as pessoas consigam resolver seus problemas paralelamente às atividades do dia. Então, isso aqui traz, além de facilidade, um direcionamento para que as empresas estejam cada vez mais atentas ao que eu preciso de fato oferecer em um determinado canal”, pontua.
Para garantir um atendimento humanizado no WhatsApp, algumas medidas devem ser adotadas. Um deles é deixar claro para o cliente que ele está falando com um bot, e o que a empresa deve buscar é que as demandas do consumidor sejam resolvidas, reforça Flávio Magalhães. Além disso, ele aponta que o cliente deve ser atendido de imediato, no exato segundo do contato.
“É importante fazer um meio que o problema seja resolutivo. Quando a economia de tempo, a resposta tem que ser dada em 10 segundos, porque em dois minutos se perde, o cliente vai para outra coisa, volta ao atendimento, e isso gera mais um custo para a empresa. Só o recontato custa mais que colocar uma pessoa para responder instantaneamente”, ressalta.
Já no cenário da Buser, que nasceu digital, a visão quanto ao 0800 é que ele deve ser disponibilizado para situações de carga emocional muito grande, como, por exemplo um acidente com feridos, assédio e discriminação. Rafael Jordan pontua ser os momentos que o cliente precisa de acolhimento e de pessoas específicas, com conhecimentos específicos, para atender essa solicitação. “São coisas que são difíceis para a pessoa escrever, e ela quer ser ouvida. Então, a nossa visão é essa: o nosso canal digital é recomendado para ser utilizado na grande maioria das situações, e para isso precisamos que ele funcione e seja resolutivo”.
Efetividade nos canais de atendimento
Alecsandro Cavalcante aconselha ser necessário entender o que o cliente quer. Principalmente no atendimento humano, tem que passar cada vez mais por um trabalho de aperfeiçoamento e de adequação a cada perfil de consumidor.
“Nos canais digitais, temos que fazer o processo de melhoria que de fato seja contínuo. Que possamos revisitar nossos canais, processos e entender se de fato a resposta que estou dando para aquele consumidor, dentro daquele canal, ainda faz sentido, ou se ela precisa realmente ser tratada. Podemos melhorar muito na questão da preditividade e colocar camadas no atendimento digital para o cliente, ao mínimo esforço, tenha resposta para a intenção dele”, comenta
Quanto à resolutividade das demandas dos consumidores nos canais telefônicos e digitais, é preciso que o canal esteja preparado para suprir as demandas dos clientes. “Também entender que, o contato com o cliente, independentemente de qual seja o canal, ele dá a oportunidade para a empresa de entender não apenas probabilidades que ela tem de melhorar a entrega que faz, mas de poder direcionar serviços adequados para os canais”, aconselhou Alexandre Fontes.
Segundo Fábio Magalhães, dentro das empresas é necessário solucionar o problema na causa raiz, ao olhar o processo e identificar o que não funciona. “Se deu problema na venda, ou em uma oferta, olhe o que causou e volte para a causa raiz. Temos que ser obcecados por solução de problemas. Se é digital ou telefone, não importa; o que importa é o que você faz a partir daquilo que você recebe”, frisou.
Quanto ao atendimento no WhatsApp, a Inteligência Artificial tem ajudado a conversar com o cliente em uma linguagem mais natural, afirma Rafael Jordan. Além disso, o executivo pontua que o consumidor precisa saber em qual momento ele está falando com uma IA ou um humano. “Quem não olhar para isso hoje, está atrasado. A todo momento temos que entender que o cliente está toda hora tentando nos dizer o que ele quer, e precisamos entregar o que ele busca”.