O jornalista esportivo Flávio Gomes, da Fox Sports, levantou a bola. Por que o tradicional clube paulistano da Portuguesa e o novato Red Bull Brasil, ligado à empresa austríaca de bebidas energéticas, não juntam as operações? De um lado, uma marca quase centenária e uma torcida apaixonada. Do outro, uma equipe estruturada financeiramente e com uma marca global por trás. Faria sentido uma junção dos times?
O questionamento ocorreu após as duas equipes terem sido eliminadas da quarta divisão do campeonato brasileiro na terça-feira (27). Logo depois, a polêmica ganhou na página do Red Bull no Facebook. Nas redes sociais, a empresa postou fotos brincando com a possibilidade. Nelas, o mascote da equipe, o “Touro Louco”, interage com comidas típicas de Portugal, como o bolinho de bacalhau e o pastel de Belém. Torcedores da Portuguesa passaram a fazer campanha na internet, com vídeos e montagens.
Para o especialista de marketing esportivo Amir Somoggi, no entanto, uma eventual fusão teria diversos problemas para seguir em frente. A primeira questão seria a jurídica. Como a Portuguesa é uma associação esportiva sem fins lucrativos, ou seja, de posse dos associados, teria uma barreira de entrada para uma empresa gerir os negócios da equipe.
Uma possibilidade, segundo ele, seria uma associação, nos moldes que o Palmeiras fez com a empresa italiana Parmalat na década de 1990. Isso, no entanto, poderia não agradar aos eventuais investidores. “Só seria interessante para a Red Bull se ela pudesse administrar o clube sozinha, sem terceiros”, diz Somoggi. “Se não, a empresa teria mais riscos do que benefícios.”
Questão de marca
A Red Bull é uma marca global e reconhecida por grande parte dos consumidores. Logo, não seria essa ação que aumentaria a fama da empresa junto ao público brasileiro.
Para Clarisse Setyon, professora de marketing esportivo da ESPM, a parceira não faz sentido em um primeiro momento. Nem mesmo em um segundo. Esse fator de surpresa, no entanto, poderia ser totalmente benéfico para a marca, conhecida pela ousadia nas ações que toma. “Ela pode elevar o seu slogan ‘te dá asas’ para o futebol e isso poderia trazer um grande ganho de marca”, diz Setyon.
Um fator positivo, segundo especialistas, seria um ganho afetivo com parte do público. Afinal, ao contrário de equipes como Corinthians, Palmeiras, São Paulo e Santos, a Portuguesa não possui grandes rivalidades com outras equipes. Ao contrário. A Lusa, durante anos, foi considerado o segundo time de muitos torcedores paulistas.
Outro benefício para a empresa seria utilizar as dependências do Canindé, estádio do clube lusitano, para ações de marca e do próprio clube. Ter um espaço em São Paulo como o Canindé seria interessante até para a empresa realizar outros eventos esportivos e culturais que já costuma fazer, como shows de música e de artes. “Se a uma eventual parceria desse certo, do ponto de vista de marketing esportivo, o case poderia marcar história”, diz Somoggi. “Mas o alto custo para executar o projeto seria um grande impeditivo.”
Torcida seria um diferencial
Apesar de ser um clube com as finanças em ordem e bem administrado, o RB Brasil não conseguiu atrair torcida para os seus jogos. No Campeonato Paulista deste ano, a média de público para os seus jogos foi de quatro mil. Muitos, porém, eram torcedores do time adversário.
O clube, que é baseado em Campinas, tem a concorrência de duas equipes de muita tradição na região, o Guarani e a Ponte Preta. Logo, conquistar adeptos não é uma tarefa fácil. Uma eventual junção com a Portuguesa poderia trazer torcedores apaixonados.
Portuguesa na UTI
Caso a Portuguesa pudesse ser comparada a um paciente de um hospital, com certeza estaria na ala dos enfermos em estado terminal. E a doença teria sido contraída em 2013. Naquela temporada, a Lusa foi rebaixada para a segunda divisão do campeonato brasileiro após um erro de escalação.
De maneira irregular, o jogador Héverton, que não poderia jogar por conta de um cartão amarelo recebido em outro jogo da Lusa, participou da partida. O engano custou pontos e a permanência na primeira divisão da tradicional equipe.
Após o rebaixamento decidido nos tribunais, a Portuguesa entrou em queda livre. Atualmente, a equipe joga a quarta divisão do Brasileirão e a segunda do Campeonato Paulista, da qual quase foi rebaixada em 2017.
A questão financeira também é preocupante. Em 2015, último balanço divulgado da equipe, o clube apresentou um prejuízo de R$ 125 milhões, o maior de todo o futebol brasileiro. Só para se ter ideia do tamanho do problema, a equipe arrecadou apenas R$ 16,7 milhões naquela temporada.
Para completar o inferno astral, a Lusa só não perdeu o seu estádio, o Canindé, por falta de interessados em um leilão realizado em novembro de 2016.
Os touros conquistam o esporte
A Red Bull vende bebidas energéticas, geralmente consumidas por profissionais que trabalham por horas a fio. Também é muito encontrada em casas noturnas, misturada com bebidas alcoólicas. A marca, no entanto, nunca quis ser vista como mais uma do setor de bebidas. Ela se encontrou no lifestyle e, principalmente, no esporte.
A empresa passou a criar equipes para participar dos mais distintos esportes. Sua equipe na Fórmula 1 já conquistou quatro campeonatos mundiais. No hóquei sobre o gelo, a equipe mantém duas equipes na Europa: o Red Bull Munique, na Alemanha, e o Red Bull Salzburg, na Áustria. A investida no futebol, no entanto, vem chamando a atenção.
Em 2016, o RB Leipzig, equipe patrocinada pela companhia austríaca na Alemanha, ficou em segundo lugar no disputado campeonato local. A posição levará o clube-empresa a disputar, pela primeira vez em sua história, a Liga dos Campeões da Europa, o mais importante torneio de futebol do mundo.
Fora da Europa, a equipe possui outras duas equipes. Nos Estados Unidos, o New York Red Bulls, que já teve o super-astro francês Thierry Henry no elenco. Por aqui, a empresa criou o RB Brasil, que já está na primeira divisão do futebol paulista, mas ainda tenta galgar espaço no esporte bretão brasileiro.