/
/
CM Entrevista: “Tecnologia sem intenção clara é só barulho”

CM Entrevista: “Tecnologia sem intenção clara é só barulho”

O excesso de conteúdo genérico gerado por algoritmos dificulta que marcas criem uma conexão real com o consumidor? Analigia Martins, diretora de Marketing do Duolingo no Brasil, avalia este e outros desafios do marketing moderno.

A conexão emocional no Customer Experience (CX) é um dos temas mais debatidos entre especialistas e CMOs atualmente, e um dos grandes desafios para as áreas de marketing das empresas.

Diante do avanço da IA generativa, a discussão gira em torno de um paradoxo. Por um lado, a IA oferece personalização e eficiência inéditas. Do outro, há o risco de diluição da autenticidade e da empatia que podem sustentar relações duradouras entre marcas e consumidores. Reconhecer que a conexão emocional não é só um diferencial, mas essencial em um contexto hiperautomatizado – no qual a linguagem autêntica e o storytelling podem sofrer risco de saturação com excesso de conteúdo genérico impulsionado por algoritmos –, se tornou imperativo nessa nova jornada de CX e IA.

Como, então, as marcas devem trabalhar suas estratégias de marketing digital sem perder essa poderosa ferramenta de vista? Sobre esse desafio de entre conexão emocional e conexão algorítmica no marketing, conversamos com Analigia Martins, diretora de Marketing do Duolingo no Brasil.

Confira!

A atenção como ponto crucial do novo marketing

Consumidor Moderno: Analistas e líderes organizacionais em todo o mundo afirmam que a nova fronteira competitiva no marketing é a “conexão emocional”. Mas não foi sempre assim para o marketing? O que mudou nessa nova jornada para conquistar o novo consumidor de forma emocional?

Analigia Martins: De fato, a conexão emocional sempre foi uma peça fundamental no marketing e nas campanhas. Mas, é nítido que houve uma mudança. Não no contexto em si, mas na forma como as marcas precisam criar e construir essa conexão, com muito mais velocidade, intensidade e profundidade. Em um mundo cada vez mais digitalizado e com as pessoas sendo expostas a milhares de marcas todos os dias, a atenção é um ponto crucial para criar essa conexão com o consumidor. E, para isso, é preciso gerar afeto.

No Duolingo, por exemplo, para trabalharmos nesse desenvolvimento de reconhecimento e conexão com nossos usuários, utilizamos de estratégias que fazem com que eles se sintam representados, ou seja, culturalmente contextualizadas. No nosso modelo “social-first“, transformamos nosso mascote, o Duo, que é um personagem também do próprio app, em um verdadeiro influenciador digital que conversa com os alunos com humor, empatia e, principalmente, motivação. Essa humanização ajuda a criar uma ligação genuína com o público e aumentar o amor pela marca, fazendo também com que os usuários retornem ao app para fazer suas lições. Então, não é só sobre baixarem o app – e, sim, fazer com que os alunos se sintam compreendidos, representados e incentivados.

CM: Muito se fala em conquistar o novo consumidor no longo prazo. Em criar estratégias que gerem fidelidade à marca. Mas o que temos visto é um consumidor cada vez mais suscetível a preço sem nenhuma fidelidade à marca. O que muda no marketing para marcas que buscam equilibrar recorrência e conversão hoje?

É fato que a fidelidade à marca é algo que não é mais visto como antes, e acredito que ela precisa ser conquistada constantemente, por meio de experiências consistentes e alinhadas ao que o consumidor valoriza. Em um mundo com tantas promoções e oportunidades, o preço pode até atrair, mas isso não significa que o consumidor será fiel. É preciso construir uma proposta de valor que vá além do racional, e que crie valor para além do produto. Ou seja, como um relacionamento construído ao longo do tempo, entregando valor suficiente para que o preço não seja o único fator de escolha.

No Duolingo, por exemplo, acreditamos que a recorrência vem da motivação contínua, da experiência divertida e da identificação com a marca. Utilizamos de ferramentas como a gamificação, humor, mascotes (personagens do app) e presença ativa nas redes sociais, que fazem com que os usuários fiquem engajados e escolham aprender com o nosso app, seja um idioma, matemática, música ou xadrez.

Dados e criatividade

CM: Toda empresa quer agora adotar e entender como uma cultura organizacional orientada a dados influencia nessa conexão emocional com o cliente. Essa habilidade tem trazido grandes desafios para as empresas. As organizações estão lidando bem com esse novo propósito digital para o marketing? Há mais erros do que acertos? Qual sua percepção? Como é isso no Duolingo?

Acredito que o mercado como um todo está em constante amadurecimento sobre esse ponto. Muitas empresas e profissionais estão refletindo que esses dados não são só números, e sim sinais do comportamento humano e dos consumidores, e como isso pode impactar nos resultados a curto e longo prazo.

No Duolingo, adotamos uma cultura onde os dados nos guiam, mas isso não é tudo. Nas campanhas, usamos dados para nos ajudar a entender padrões e refinar detalhes. Mas, é na humanização, com um olhar criativo, empático e cultural que transformamos esses dados em conexão com os usuários e alunos. Além disso, monitoramos constantemente o que eles estão falando, seus feedbacks nas redes, as tendências culturais e até os memes que eles criam espontaneamente sobre a marca. A partir disso, construímos narrativas e experiências alinhadas com o que nossos alunos realmente querem ver – e viver.

O desafio dessa combinação entre dados e criatividade é o que faz nossa comunicação ser tão eficaz e icônica, que nos permite criar conteúdo que viraliza, ações que emocionam e uma marca que se conecta com milhões de pessoas no mundo todo.

Tecnologia com sensibilidade e curadoria humana

CM: O consumidor evoluiu muito, mas existe a percepção também de que muitas empresas ainda cometem os mesmos erros na abordagem desse novo consumidor. Seja na propaganda invasiva via canais digitais, ou no desconhecimento de suas preferências e perfil (mesmo com tanta tecnologia a favor). Por que isso ainda acontece no marketing?

Na minha visão, quando isso acontece, são empresas que ainda enxergam o consumidor como um número, e não necessariamente olham com atenção sobre quem realmente ele é. Sendo assim, trabalham com algumas ferramentas e acabam arriscando e levando a erros clássicos com campanhas genéricas, linguagem inadequada e falta de escuta ativa. A tecnologia é uma ótima aliada para nós no marketing, mas sem uma intenção clara, é só um barulho, não necessariamente terá a retenção ou objetivo real da campanha. Sem entender que tem um ser humano além dos números, uma visão inteligente, crítica e analítica para utilizar essas ferramentas, temos mais uma automação e dados soltos, do que um uso efetivo do que a tecnologia pode nos proporcionar.

Um dos maiores erros está em usar ferramentas novas, mas com práticas antigas, tratando o consumidor como um número e não como uma pessoa. É preciso testar, ajustar e sempre colocar o consumidor no centro. No Duolingo, por exemplo, temos nossas campanhas regionais e globais já definidas, mas também produzimos muito do nosso conteúdo nascendo do que ouvimos nas redes, dos memes que surgem organicamente, das dúvidas e piadas dos alunos. O Duo, nosso mascote, conversa como um brasileiro – com humor, leveza e opinião forte. Isso exige não só tecnologia, mas sensibilidade e curadoria humana. Na agência, por exemplo, temos um time alocado especialmente que fica focado nas interações, respondendo manualmente e interagindo com os nossos usuários.

CM: Com todo esse cenário de IA e dados, o marketing está deixando de ser intuitivo, mais encantador e criativo para se tornar uma estratégia algorítmica e mensurável para as marcas?

Não necessariamente. Como mencionei, sem uma curadoria e uma visão personificada para as campanhas, não necessariamente criará esse apego emocional com os consumidores e realmente gerará um impacto. Toda essa evolução tecnológica, na verdade, está desafiando os profissionais a serem cada vez mais criativos, e é assim que muitas empresas irão se diferenciar nessa trajetória. A criatividade continua sendo o que nos diferencia, emociona e constrói a marca. A IA e os dados, nesse contexto, não irão substituir o marketing tradicional, mas sim potencializar – se usados da maneira certa.

Autenticidade nasce da escuta

CM: Como criar diferenciação em meio a tanta análise empurrando a criatividade para terrenos semelhantes? É mais difícil hoje ser genuíno no marketing?

Sem dúvida está cada vez mais difícil repetir fórmulas, e dizemos isso com propriedade. Mesmo no Duolingo, em que tivemos resultados incríveis com diversas campanhas, nem sempre a mesma fórmula irá se aplicar para todas elas. Mas, pelo fato de criarmos ações icônicas e únicas, com a linguagem que nós mesmos fomos criando junto com nossos usuários, nosso consumidor reconhece nosso propósito e autenticidade. Ouvimos nossos alunos, entendemos o que os faz rir, o que os motiva, e adaptamos nossa personalidade para o contexto local.

E, nesse ponto, cada marca precisa entender também seu público e o que eles esperam dela. Assim, o risco de cair na armadilha de fórmulas e insights genéricos e acabar criando campanhas semelhantes, diminui. A autenticidade nasce da escuta, e isso faz toda a diferença. No Duolingo temos a coragem para arriscar, mas também temos a confiança no propósito da marca quando criamos as nossas campanhas. E, quando essa base é sólida, a diferenciação vem naturalmente.

CM: Todos dizem que está na experiência do cliente a sensação de pertencimento. Levando em consideração tudo o que analisamos até aqui, você seria capaz de estabelecer um ponto central sobre sucesso na conexão emocional entre clientes e marcas?

Diversos fatores contribuem para isso, mas, de fato, é preciso haver uma relevância com empatia. A marca precisa estar presente na vida do consumidor como um todo, se conectando com ele e mais do que conquistar, cultivá-lo e fazer com que se sinta representado. No Duolingo, por exemplo, sabemos como é difícil para algumas pessoas aprender um novo idioma, e nunca escondemos isso. Nossa missão é democratizar o aprendizado, e fazemos isso não só com tecnologia e gamificação, mas com uma marca que faz parte da vida do aluno, que entende suas dificuldades e comemora suas vitórias e progresso com ele.

Por isso, desde as nossas campanhas e na forma como nos comunicamos nas redes, fazemos de tudo para que eles se sintam acolhidos e que nosso humor seja um estímulo para sentirem amor pela marca. O Duo e os nossos personagens são a personificação desse carinho, que cobram lições, mas também são amigos. E é por isso que nossos alunos viram fãs, e nossos fãs viram embaixadores espontâneos da marca. Ou seja, a conexão emocional nasce desse reconhecimento, quando o consumidor se vê na marca, se sente ouvido, respeitado, representado. Assim, construindo uma marca memorável.

CONAREC 2025

Conexão emocional na era da IA. Esse é um dos temas que será discutido no CONAREC 2025 – o maior e mais relevante evento de Customer Experience (CX) da América Latina, que ocorre nos dias 9 e 10 de setembro, em São Paulo. Você não vai perder, né? Saiba mais e garanta a sua presença clicando aqui.

Compartilhe essa notícia:

WhatsApp
X
LinkedIn
Facebook
Email

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Recomendadas

MAIS MATÉRIAS

SUMÁRIO – Edição 292

A evolução do consumidor traz uma série de desafios inéditos, inclusive para os modelos de gestão corporativa. A Consumidor Moderno tornou-se especialista em entender essas mutações e identificar tendências. Como um ecossistema de conteúdo multiplataforma, temos o inabalável compromisso de traduzir essa expertise para o mundo empresarial assimilar a importância da inserção do consumidor no centro de suas decisões e estratégias.

A busca incansável da excelência e a inovação como essência fomentam nosso espírito questionador, movido pela adrenalina de desafiar e superar limites – sempre com integridade.

Esses são os valores que nos impulsionam a explorar continuamente as melhores práticas para o desenho de uma experiência do cliente fluida e memorável, no Brasil e no mundo.

A IA chega para acelerar e exponencializar os negócios e seus processos. Mas o CX é para sempre, e fará a diferença nas relações com os clientes.

CAPA: Camila Nascimento
IMAGEM: Midjourney


Publisher
Roberto Meir

Diretor-Executivo de Conhecimento
Jacques Meir
[email protected]

Diretora-Executiva
Lucimara Fiorin
[email protected]

COMERCIAL E PUBLICIDADE
Gerentes

Daniela Calvo
[email protected]

Elisabete Almeida
[email protected]

Érica Issa
[email protected]

Natalia Gouveia
[email protected]

NÚCLEO DE CONTEÚDO
Head de Conteúdo
Larissa Sant’Ana
[email protected]

Editor-assistente
Thiago Calil
[email protected]

Editora do Portal 
Júlia Fregonese
[email protected]

Produtores de Conteúdo
Bianca Alvarenga
Danielle Ruas 
Jéssica Chalegra
Marcelo Brandão
Nayara de Deus

Head de Arte
Camila Nascimento
[email protected]

Designer
Isabella Pisaneski

Revisão
Elani Cardoso

COMUNICAÇÃO E MARKETING
Gerente
Simone Gurgel

TECNOLOGIA
Gerente

Ricardo Domingues


CONSUMIDOR MODERNO
é uma publicação da Padrão Editorial Ltda.
www.gpadrao.com.br
Rua Ceará, 62 – Higienópolis
Brasil – São Paulo – SP – 01234-010
Telefone: +55 (11) 3125-2244
A editora não se responsabiliza pelos conceitos emitidos nos artigos ou nas matérias assinadas. A reprodução do conteúdo editorial desta revista só será permitida com autorização da Editora ou com citação da fonte.
Todos os direitos reservados e protegidos pelas leis do copyright,
sendo vedada a reprodução no todo ou em parte dos textos
publicados nesta revista, salvo expresso
consentimento dos seus editores.
Padrão Editorial Ltda.
Consumidor Moderno ISSN 1413-1226

NA INTERNET
Acesse diariamente o portal
www.consumidormoderno.com.br
e tenha acesso a um conteúdo multiformato
sempre original, instigante e provocador
sobre todos os assuntos relativos ao
comportamento do consumidor e à inteligência
relacional, incluindo tendências, experiência,
jornada do cliente, tecnologias, defesa do
consumidor, nova consciência, gestão e inovação.

PUBLICIDADE
Anuncie na Consumidor Moderno e tenha
o melhor retorno de leitores qualificados
e informados do Brasil.

PARA INFORMAÇÕES SOBRE ORÇAMENTOS:
[email protected]