Integração multicanal, atendimento virtual, PDV móvel, personalização de conteúdos e ofertas. Os entusiastas por tecnologia já conhecem essas soluções. E os varejistas brasileiros também. Contudo, essas soluções ainda estão limitadas às rodas de conversa. Vontade não falta para que elas se tornem realidade no ponto de venda, pois são algumas das soluções que os executivos do varejo gostariam de investir mais nos próximos dois anos, mas a intenção esbarra em questões estruturais.
E os recursos para a área de tecnologia são direcionados em massa para tecnologias de infraestrutura e gestão. É a realidade mostrada em estudo feito a pedido do Centro de Inteligência Padrão para a revista Novarejo, com coordenação técnica da consultoria E-Consulting, com 300 CIOs do varejo de todo o País. O intuito é identificar quais são as tecnologias mais relevantes para o negócio.
estudo listou as tecnologias consideradas aos olhos dos varejistas: dominantes (as comuns), maduras (estabelecidas e cujo processo de adoção está sendo ampliado), entrantes (começam a ganhar escala), hots (vistas como importantes) e inovadoras (novidades no mercado). A conclusão é que os executivos têm sede por soluções que atraiam o consumidor para o ponto de venda, dê a eles experiências diferentes e facilite a vida deles na hora de fechar a compra.
Mas, na média e na prática, os investimentos vão mesmo para as soluções que ajudam o varejista a arrumar a casa, por trás do PDV. ?O varejo precisa investir mais em tecnologia de gestão e infraestrutura, porque elas habilitam as outras?, explica Daniel Domeneghetti, autor do estudo e presidente da E-Consulting.
Ele afirma que o varejo acordou para a importância dos investimentos em tecnologia e já os considera fator para torná-lo mais competitivo. São as soluções de base que ajudam o varejo a implantar tecnologias de análise de dados, mobilidade, transações e experiência em loja. ?Eles começam a entender que, para ganhar maturidade, precisam investir e ter plano estruturado?, diz o consultor.
Arroz com feijão
Isso significa aumentar o investimento, mas no back office. A necessidade explica o fato de as tecnologias citadas pelos varejistas serem as mesmas da edição de 2013 da pesquisa. ?As tecnologias mais importantes continuam basicamente as mesmas, porque há um problema estrutural que prevê um investimento mais pesado nas mesmas soluções ? até o varejo atingir certo grau de maturidade?, explica Domeneghetti.
Na lista das soluções com o maior porcentual de incidência de investimento para os próximos dois anos, boa parte é voltada para a infraestrutura, como call center, e-commerce, segurança da informação, video service, sites e intranets. As mudanças legais também justificam a atenção às tecnologias de back office.
?O governo criou uma agenda em que demanda todas as informações das empresas e os varejistas são obrigados a ter tecnologia para atendê-las?, afirma Alejandro Padrón, líder de consultoria para o segmento de varejo da IBM Brasil. Essas exigências chegam do RH às áreas fiscais e tributárias. E, nos últimos cinco anos, os esforços eram nas adaptações dos sistemas.
?Soluções na retaguarda são mandatórias e quem não tem corre o risco de cometer falhas?, completa. Não é por isso, contudo, que as tecnologias voltadas para o ponto de venda estão na gaveta. Como em todo setor da economia, no varejo os processos ocorrem ao mesmo tempo. Há, sim, a busca por sistema de gestão integrada, padronização de processos, soluções financeiras para ter o mínimo de controle do negócio, mas há quem faça mais.
?Existe um nicho que busca gestão de processos para comprar e vender melhor, para ter maior controle de mix e melhor distribuição?, afirma Elia Chatah, especialista de soluções para o setor de varejo da SAP Brasil.
Mais controle
À medida que as tecnologias ajudam o varejo a arrumar a casa, inovações são implantadas no ponto de venda, ainda que não visíveis para os consumidores. Um exemplo é o controle de estoque. ?Se eu não souber onde está o meu produto na cadeia, não consigo ser ágil no meu e-commerce e até no atendimento em loja?, afirma José Gonçalves, diretor para a América Latina da Accenture Interactive.
Há também um grupo seleto de varejistas que já está na fase mais madura de investimento em tecnologia, apresentando inovações visíveis para os clientes no ponto de venda, segundo Frederico Rezende, gerente de produto SQL da Microsoft. Esse grupo já lida com temas como mobilidade e análise de dados dos consumidores e investe em soluções que priorizam o relacionamento.
E mesmo que esses exemplos se limitem às lojas-conceito e aos showrooms, eles mostram que é possível fazer. ?As margens em alguns segmentos não permitem ao varejista ser mais audacioso, mas vamos ver muitos projetos piloto em 2014?, afirma Jean Carlo Klaumann, vice-presidente de operações da Linx.
Mobilidade
E foi-se o tempo em que tecnologias no ponto de venda geravam apenas curiosidade dos consumidores. ?O crescimento da mobilidade é agressivo. No mercado norte-americano, 25% das vendas advêm do móvel. E essa mobilidade nos ajuda a explorar espaços que ainda não foram explorados e potencializa o negócio?, afirma Leonardo Santos, gerente de TI da Billabong. A marca está implantando uma solução de PDV móvel em São Paulo e espera 10% de aumento de vendas.
Segundo Paulo Eduardo Guimarães, gerente de desenvolvimento de negócios da Bematech, os retornos gerados pela mobilidade podem chegar a 30%. ?Não conheço um varejista que não esteja pensando em tecnologia móvel. Está no mapa de investimentos para 2014 e esses cases ficarão ainda mais visíveis?, diz.
ssas experiências mostram que tecnologias reforçam o elo entre cliente e varejista e contribuem para compras mais eficientes, segundo Gissele Ruiz y Lanza, diretora de consumo da Intel Brasil. ?Ao ajudar o consumidor a escolher corretamente o produto, essas tecnologias geram mais vendas e aumentam a rentabilidade e eficiência ? não são mais soluções de efeito?, afirma a executiva.
É em busca dessa eficiência que a Reserva também implantará solução de estoque integrado na operação ainda no primeiro semestre deste ano. A marca de moda, com 32 lojas em oito Estados, tem hoje cerca de 20% dos pedidos não atendidos na loja por falta de produtos, segundo Thiago Ferrari, gerente de e-commerce da marca. A solução funciona como um PDV móvel. Por meio de um tablet, o vendedor pode verificar se o produto que falta em loja existe no centro de distribuição ou mesmo em outras lojas da rede.
A entrega do produto pode ser feita em até seis horas, a depender do horário que o pedido foi realizado (a ser definido). O projeto começa nas lojas do Rio de Janeiro e, se der resultado, será levado para São Paulo e demais Estados.
Movidos pela pressão
O varejo precisou de tempo para encarar a tecnologia como um investimento que gera competitividade e não mais como custo que pesa no orçamento. A mudança, de acordo com Klaumann, da Linx, é uma resposta ao tempo perdido. ?O varejo era pouco comprador de tecnologia, mas a maturidade de processos e a abertura de capital de algumas empresas estimularam a mudança de percepção?, considera. O custo também era (e ainda é, em muitos casos) limitador, mas a pressão exercida pelos consumidores por um varejo mais multicanal fez os executivos encontrarem alternativas.
Segundo Guimarães, da Bematech, até 2010 o varejo tinha o investimento
em tecnologias estruturais como prioritário. De lá para cá, no entanto, o comportamento dos consumidores ?forçou? a mudança de caminho. ?O consumidor de 2010 não é o mesmo de hoje. E a tendência é investir em tecnologias para ele?, afirma
A mudança começou com uso dos smartphones. Segundo pesquisa da consultoria IDC, foram vendidos 10,4 milhões de aparelhos no terceiro trimestre de 2013, um aumento de 147% em relação ao mesmo período no ano passado. E é com eles que os consumidores ganham ainda mais autonomia. Outra mudança é o acesso à informação.
Não é raro encontrar clientes mais atualizados sobre produtos e serviços que muitos vendedores da operação, segundo Chatah, da SAP. Padrón, da IBM, lembra que hoje o consumidor compara preços e varejistas, mesmo se ele estiver dentro da loja ? o que é mais uma pressão. ?Não importa o tema, o varejo tem de estar hábil e capaz de responder a pressões?, enfatiza.
O consumidor 2.0 demanda disponibilidade da informação em qualquer canal, acessibilidade para contatar a marca, diversidade de produtos e ofertas, consistência e confiabilidade nas informações. E foram essas demandas que pressionam o varejo a investir em soluções no ponto de venda. ?Não é mais uma questão de sim ou não, é de quando?, afirma Caio Camargo, gerente comercial da Virtual Gate.
Ele explica que o varejo demora a tomar decisões de longo prazo, pela pressão por apresentar resultados no curto prazo ? e o que conta, muitas vezes, é acelerar a decisão de compra do consumidor. Mas isso também está mudando, na velocidade dos avanços tecnológicos. ?O varejista por natureza é de um setor que espera muito que o concorrente dele faça para que ele vá atrás.
E a velocidade que os outros vão seguir esse líder vai ser muito rápida?, considera Chatah, da SAP. A demora também se verifica na integração das soluções. Quando compra uma plataforma de um fornecedor, o varejo precisa integrá-la aos sistemas internos.
E isso demanda tempo e tem um custo alto de execução, afirma Gonçalves, da Accenture. ?Cada vez mais, vemos que os varejistas não compram mais a solução, eles se associam a um fornecedor para desenvolver junto e oferecer a tecnologia como serviço?, diz.
Para Domeneghetti, cada vez mais a tecnologia se confunde com o próprio varejo ? ou seja, é difícil pensar em uma operação e na comunicação com o consumidor sem que uma solução tecnológica esteja envolvida. Todos os modelos de relacionamento são dependentes de tecnologia, do SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor) ao e-commerce.
?O consumidor do varejo é cada vez mais multicanal, então não dá mais para empurrar com a barriga, como se costumava fazer?, diz. Gissele, da Intel, reforça que as soluções estão chegando ao Brasil, principalmente aquelas que ajudam o varejo na tomada de decisão, desde o correto sortimento de produtos às campanhas de marketing, como o big data.
Segundo o estudo da E-Consulting, a incidência de investimentos nessa seara para o ciclo 2014?2015 foi a que mais cresceu, se comparada aos dados da edição anterior do estudo.
Big data: mais do mesmo?
Embora colocado nos planos dos varejistas, o big data ainda não é realidade na média do mercado varejista brasileiro. E não é para menos. Para fazer a correta análise dos dados dos consumidores e transformar as informações em estratégias direcionadas, o varejo precisa primeiro ter os dados organizados.
E é aí, de novo, que entram os investimentos no back office. Camargo, da Virtual Gate, afirma que a busca pelo entendimento do histórico, gostos e desejos dos consumidores passa por uma gestão em tempo real do que entra e sai do estoque e para quem esses produtos são direcionados. No fim das contas, o que conta não é a quantidade da informação, é a qualidade dela.
Elas precisam estar organizadas para que sejam analisadas e, com elas, sejam traçadas tendências de consumo. A captação da informação começa no ponto de venda, mas é o CRM bem estruturado que ajuda o vendedor saber a quem ele está oferecendo produtos e serviços. Para Klaumann, da Linx, o desafio do varejo é traduzir dados em ações que tragam resultados. ?As iniciativas nesse sentido ainda são tímidas?, diz
?O big data é importante, mas o varejo precisa ter as condições de trabalhar com essas informações. E, na média, eles não estão preparados para fazer a análise dos dados dos consumidores?, reforça Domeneghetti. Para ele, não é de grande valia querer entender o comportamento dos usuários de redes sociais se a companhia sequer sabe se o usuário tem histórico de compra. A deficiência, avalia o consultor, é a base da ineficiência do varejo em várias pontas, como na resolução de reclamações, por exemplo
Guimarães, da Bematech, também acredita que a aplicação completa da tecnologia mais desejada pelos varejistas ainda está no campo das ideias. ?Existem tentativas de compor um grande banco de dados, mas ninguém organizou e concentrou tudo isso ainda para captar as informações que interessam ao varejo. Os motores de busca dessas informações ainda estão no laboratório?, considera.
Apesar disso, as fornecedoras consultadas acreditam que 2014 será o ano do big data. ?É um tema quente, porque a informação gerada pelo big data resulta não apenas em experiência única para o consumidor, como diminui o tempo de resposta do varejo ? um dos índices de competitividade do setor?, avalia Rezende, da Microsoft.
Entre varejistas consolidadas, como Pão de Açúcar e O Boticário, já é possível enxergar iniciativas de personalização de conteúdo e oferta, com base nas informações dos clientes que participam dos programas de fidelidade. Rezende afirma, porém, que até varejistas menores buscam soluções de inteligência para se preparar para a captação e análise de dados dos clientes.
?O big data é o grande guarda-chuva?, diz. Na busca por implementá-lo, as companhias aceleram os investimentos na retaguarda. E nesse ciclo virtuoso de investimentos, ganha aquele que tiver a base mais sedimentada.
CONSUMIDOR MULTICANAL
A IBM ENTREVISTOU 30.554 CONSUMIDORES EM 16 PAÍSES PARA ANALISAR O COMPORTAMENTO DE CONSUMO A FIM DE DESCOBRIR SE ELES ESTÃO ADOTANDO A MULTICANALIDADE:
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- Caiu o número de consumidores que fizeram a última compra em loja física, de 85% para 72%, entre 2012 e 2013.
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- Subiu o número de consumidores que fizeram a última compra em loja virtual de 14% para 17%
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- 40% dos consumidores pesquisam informações sobre produtos e serviços, mas não exigem as últimas inovações de compra.
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- 29% estão interessados em utilizar tecnologias SoLoMo (Social, Local e Móvel) para comprar e utilizam com certa frequência
- 19% dos entrevistados utilizam extensivamente as tecnologias SoLoMo enquanto compram.
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