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Rolezinho: legitimado e supervalorizado

Rolezinho: legitimado e supervalorizado

Luta de classes, movimento social ou apenas a entrada de novos consumidores em templos de consumo antes habitados apenas pela elite? Será que agora famoso, apesar de sempre existente, rolezinho é mesmo tão perigoso assim?

O perfil do consumidor mudou. Hoje não existem barreiras entre classes sociais no mercado de consumo e praticamente todas as camadas da sociedade têm acesso a bens de consumo antes destinados apenas às classes mais altas.

Uma das consequências mais gritantes e mais relevantes do ingresso desse novo consumidor é o polêmico ‘rolezinho’, que tem dividido opiniões em todas as camadas da sociedade. Os tais eventos começaram em São Paulo, no fim do ano passado. Desde então, vários ocorreram, chegando a reunir milhares de pessoas.

Polêmicas ideológicas à parte, os rolezinhos são provável consequência de certa imaturidade desse novo consumidor. Portanto, fica uma questão: será isso problema de segurança ou mera falta de educação?

Falta de senso coletivo, aliás, não é um problema que atinge apenas o ‘inconveniente’ consumidor de classes ascendentes. Mas certamente qualquer comportamento inadequado por parte de habitués dos shopping centers não seria caso de polícia.

Mas será que o tal rolezinho é motivo para tanto estardalhaço? No fundo o fenômeno pode ser apenas um reflexo social do que já vem acontecendo economicamente. O mercado de consumo se abriu para uma para uma parcela antes excluída, mas ainda não se adaptou ao novo público, seus hábitos e necessidades.

Sem romantizar ou apedrejar, é necessário tratar essa movimentação com normalidade, sem colocar os verdadeiros protagonistas como heróis ou bandidos e não deixar que isso se transforme numa guerra de outros interesses, com acadêmicos e políticos usando a legitimação de um movimento social que sempre existiu como escudo para sua ideologia.

No entanto, uma reportagem da Folha de S. Paulo aponta  que muito antes dos rolezinhos da periferia, centenas de alunos da USP se encontram no shopping Eldorado, sem aviso prévio e sem serem incomodados pela segurança do lugar desde 2007, sempre na primeira semana de aula, e reúne cerca de 500 calouros, que entoam gritos de guerra no saguão de entrada.

Depois dos gritos como “Ei, GV [Fundação Getúlio Vargas, tida como rival da FEA], vai tomar no c…”-, parte dos estudantes almoça na praça de alimentação, onde são entoados mais cânticos. O encontro dura cerca de uma hora e meia.

Para o secretário estadual da Segurança Pública, Fernando Grella Vieira, o rolezinho não pode ser considerado crime, mas um fenômeno cultural, motivo pelo qual não deve ser tratado como caso de polícia. Ele afirma que a Polícia Militar não deixará de cumprir sua obrigação constitucional. “Uma coisa precisa ficar muito clara: a segurança dos shoppings é privada. A PM somente deve agir se houver quebra da ordem”, afirma.

De acordo com a professora da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Ivana Bentes, o fenômeno tem um forte caráter político e surpreende por resgatar o espírito das manifestações do ano passado em um cenário inusitado, os shoppings. “Mesmo que não tivesse uma intenção de causar politicamente, ele é político. A simples existência de um jovem negro da periferia dentro de um shopping center, sendo rejeitado, sendo considerado um consumidor indesejado, já é um fato político, independentemente da intencionalidade”, disse. “Acho muito importante que outros grupos sociais tenham se organizado para manifestar solidariedade a esses jovens”, completou.

Mas existe outro lado que não pode ser ignorado: o dos comerciantes. Longe da luta entre grandes empresários e sociólogos saudosistas (afinal, como citado acima, os próprios praticantes do tal rolezinho são muitas vezes tratados como meros agentes passivos), existe o comércio e os números, que são sempre implacáveis. A associação brasileira de lojistas de shoppings, Alshop, estimou nesta quarta-feira que o movimento nos estabelecimentos em dias de “rolezinhos” — encontros de jovens adolescentes organizados nas redes sociais — tenha caído pelo menos 25 por cento, afetando o faturamento das lojas.

A Justiça de São Paulo concedeu liminar a shoppings do Estado (Capital e Interior) que proíbe os “rolezinhos”. A ação veta estes “mega-passeios” e estabelece multa de R$ 10 mil aos integrantes dos grupos que promoverem tumulto, vandalismos e furtos.
O especialista em direito do consumidor, Dr. Bernard Netto, afirma que é possível buscar a ajuda da justiça para impedir a entrada de alguns grupos. “Expulsar pessoas que já ingressaram, porém, é mais complicado, pois, salvo em uma emergência, não poderá ser feito uso de força física”.

A ministra da Secretaria de Direitos Humanos da presidência, Maria do Rosário, acredita que não se deve supervalorizar o movimento. “Sinceramente, não é possível também que se imprima a essa questão uma supervalorização, como se ela estivesse no plano para além do que é, uma reunião de jovens procurando um espaço público que é de livre possibilidade de conviver”, disse a ministra em reportagem da Folha de S. Paulo.

Para a professora Vivian Blaso, a partir dos anos 90 até os dias de hoje, São Paulo passou por períodos de grandes mudanças, pois na região metropolitana houve uma desconcentração das atividades industriais e uma reestruturação das atividades terciárias, consequência da globalização. A metrópole transformou-se e ficou conhecida como capital dos serviços. Com isso, a segregação espacial tornou-se evidente, e os processos de favelização e o adensamento das populações de baixa renda concentraram-se nas periferias da cidade.

Nesse contexto, segundo a Doutoranda e Mestre em Ciências Sociais, os shoppings centers foram concebidos para garantir às elites um local privilegiado para o consumo. “Promessas de segurança, conforto, lazer, como explicado por Tereza Caldeira e ratificado por Zygmunt Bauman em seu livro Confiança e medo na cidade, mostram-nos como a relação centro/periferia provocou uma tensão que colocou a classe média em risco de acabar vítima de um processo que não conhece e de perder o “bem-estar” conquistado no decorrer das últimas décadas. Essa dinâmica estrutural da ocupação das cidades e a forma como as cidades montam e desmontam seus espaços de elite, excluindo para as periferias as populações menos privilegiadas, acabam gerando conflitos e a segregação”.

Mas ela propõe uma nova reflexão: os jovens praticantes dos “rolezinhos” são estrangeiros?

“O estrangeiro é, por definição, alguém cuja ação é guiada por intenções que, no máximo, se pode tentar adivinhar, mas que ninguém jamais conhecerá com certeza. O estrangeiro é a variável desconhecida do cálculo das equações quando chega a hora de tomar decisões sobre o que fazer”  (Bauman, p. 37, 2005).

“Não, os praticantes dos ”rolezinhos” são os vizinhos que estão separados por muros. Refugiar-se em ilhas de segurança, como os condomínios fechados, é a prova de que nós consumidores estamos atendendo à demanda proposta para as novas cidades. Por isso, é necessário romper com a visão dualista entre centro e periferia e caminharmos na direção de um pensamento que religue esses polos, o jovem de elite e o jovem da periferia; as relações estão entrelaçadas, interconectadas e interdependentes e fazem parte de um mesmo fenômeno: rolezinho”, finaliza.

 

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