Recentemente, especialmente do ano passado para cá, a Anatel tem publicado medidas rígidas em relação aos serviços de telemarketing e telecobrança, tendo como alvo práticas abusivas contra o consumidor. O problema é que essa forte interferência do governo no setor tem trazido consequências graves para as empresas. De acordo com a Associação Brasileira de Telesserviços (ABT), as novas normas publicadas pela agência reguladora, em especial as presentes no Despacho Decisório 250/2022, podem chegar a inviabilizar a atividade econômica.
O despacho, publicado no dia 19 de outubro, reforça que o uso de soluções tecnológicas para o disparo massivo de chamadas que não chegam a ser completadas ou são encerradas em até 3 segundos, é considerado abusivo. Na publicação, a Anatel determina o bloqueio das linhas telefônicas das empresas que gerem 100 mil chamadas curtas por código de acesso em um dia e também aquelas em que a quantidade de chamadas deste tipo representem 85% ou mais do total de ligações efetuadas.
John Anthony von Christian, presidente da ABT, afirma que a partir do momento que tais restrições passaram a valer, foram observadas paralisações das operações de telemarketing e telecobranças. Segundo ele, as medidas da Anatel representam um sério risco à viabilidade dessas atividades no Brasil, caso não haja uma completa revisão do despacho. Isso porque é praticamente impossível para as empresas do setor cumprirem as determinações regulamentadas.
O presidente da Associação explica que, diante da qualidade dos bancos de cadastro utilizados atualmente, o índice de assertividade das ligações de oferta de produtos e serviços ou de cobranças é de apenas 5%. Ou seja, a cada 20 ligações, apenas uma é atendida. John disse ainda que, em grande parte das operações, cerca de 50% das ligações efetuadas são encaminhadas diretamente à caixa postal, sem contar as que não são completadas por problemas técnicos.
“Caso seja mantida a exigibilidade de que ‘o total de chamadas curtas represente proporção igual ou inferior a 85% das chamadas totais’, todas as operações de todas as empresas que prestam o referido serviço serão bloqueadas”, constata von Christian. O presidente da ABT também falou sobre a lista de empresas ofensoras, que vai incluir aquelas que ultrapassem o limite de 500 mil chamadas em 15 dias. Ele reforça que qualquer empresa que realize uma operação humanizada, por menor que seja, atinge esse limite.
“A manutenção dos dispositivos nestes termos acaba por considerar o mero exercício da atividade como abusivo, julgando ilegal, do ponto de vista regulatório, as atividades de telemarketing e telecobrança, independentemente da análise individual da conduta adotada pela empresa”, enfatiza o presidente da ABT.
A abordagem que está sendo feita pela Anatel, ele avalia, representa sérios riscos reputacionais, institucionais e jurídicos às empresas, além de impactar decisivamente sobre os resultados financeiros e de empregabilidade do setor.
Impactos do prefixo 0303: o poder na mão do consumidor e não do governo
Em relação ao impacto da adoção obrigatória do prefixo 0303 em ligações de telemarketing, a ABT informou que houve uma redução na efetividade das operações da ordem de 40%. Também foi reportado um grande congestionamento das ligações, problemas de rede e dificuldades para completar chamadas. Tudo isso, de acordo com a Associação, causou um forte impacto na performance das vendas, mesmo com as empresas fazendo os ajustes necessários para se adaptar às novas circunstâncias.
Em entrevista à Consumidor Moderno, John Anthony von Christian reforçou que a ABT concorda com a importância do combate às más práticas de mercado que geram incômodo ao consumidor. Mas, entende que as normas precisam ser aperfeiçoadas, adotando modelos regulatórios já testados e que não resultem na inviabilidade da atividade econômica.
“Nos Estados Unidos há um modelo regulatório que permite a identificação de quem oferta produtos e serviços e permite também o bloqueio de quem incomoda o consumidor. É o poder na mão do consumidor e não do poder público. Acreditamos que este exemplo de caminho seja bom para o setor e para os consumidores brasileiros”, analisa o presidente da ABT.
A obrigatoriedade do prefixo 0303 passou a valer em junho deste ano. A ideia era permitir que o consumidor identificasse as ligações de telemarketing. Apesar das críticas, a Anatel entende que a medida está cumprindo seu propósito e que teve impacto imediato no empoderamento dos consumidores.
Empresas também combatem telemarketing abusivo
Empresas de telecomunicações têm se mobilizado para combater a prática do chamado “telemarketing abusivo” e fortalecer o direito dos consumidores. A Conexis, que substituiu o SindiTelebrasil na representação do setor, afirmou que as ações adotadas têm feito com que as empresas de telecomunicação deixem de figurar no ranking de ligações indesejadas.
Em posicionamento enviado à Consumidor Moderno, a Conexis citou que dados indicam que, em 2019, 48% das chamadas de telemarketing foram feitas pelas operadoras de telecom. Já em 2020, esse percentual caiu para 6% e, em 2021, o setor não apareceu na lista dos que mais fazem esse tipo de ligações.
A nota também aponta que o empenho das associadas à Conexis tem levado a resultados expressivos em indicadores monitorados pela Anatel e que dados de agosto deste ano, mostram uma queda de 18% no número de reclamações de usuários de serviços de telecomunicações registradas na agência.
Segundo a Conexis, esses resultados positivos estão sendo possíveis pois, desde 2019, as empresas de telecomunicações, por meio do Sistema de Autorregulação de Telecomunicações (SART), formularam iniciativas para redução da prática de telemarketing abusivo. Dentre elas está o “Normativo de Telemarketing”, que estabelece regras para limite de abordagens e horários de ligações. As empresas também criaram a plataforma “Não Me Perturbe”, para atendimento de solicitações de bloqueio de usuários que não desejam receber chamadas de telemarketing. De acordo com a Conexis, a plataforma já conta com mais de 10 milhões de números de telefones cadastrados e segue sendo um exemplo de respeito à vontade do consumidor.
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