A corrida pela hegemonia

A corrida pela hegemonia

Altos investimentos em Inteligência Artificial e novas tecnologias criam uma espécie de “Guerra Fria” para definir a nova potência global. Onde está o Brasil nessa corrida?

A Inteligência Artificial (IA) guia a maior revolução social e econômica de todos os tempos. Todas as inovações e possibilidades trazidas pela evolução da tecnologia abriram uma janela que será responsável por fomentar potências. Os países que, desde já, incentivarem o desenvolvimento interno de tecnologias serão os protagonistas nos próximos anos.

O cenário criou uma verdadeira corrida pela hegemonia, com uma competição estratégica acirrada entre países que buscam consolidar a soberania tecnológica. Alguns especialistas, inclusive, fazem comparações a uma nova “Guerra Fria”.

Na liderança dessa corrida estão os Estados Unidos, com o Projeto Stargate e um investimento de US$ 500 bilhões. Logo atrás vem a China, com seu plano quinquenal, alocando cerca de 2% do seu PIB em investimentos e destacando a IA como um setor prioritário, apostando em parcerias público-privadas e na formação de talentos.

O estudo AI Index, da Stanford HAI, mostra os países que estão se destacando nessa disputa.

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Entre os principais investimentos desses países estão pesquisa e desenvolvimento, infraestrutura, economia e governabilidade e política. Outras frentes, ainda mais tímidas, são IA responsável, educação e diversidade.

Quem explica melhor o que esses investimentos robustos significam é a especialista e palestrante internacional Michelle Schneider, professora convidada da Singularity University, universidade localizada dentro de uma base de pesquisa da NASA, no Vale do Silício.

“Fica evidente não só a capacidade desses países de mobilizar recursos, mas há um indício de que a disputa pelo protagonismo na IA tende a se reduzir, em grande parte, a uma batalha entre as duas principais potências: EUA e China. O país que se destacar como líder em IA não apenas definirá os padrões tecnológicos globais, mas também irá se posicionar como a próxima grande potência econômica mundial”, garante Michelle.

Mas, onde está o Brasil em tudo isso? Infelizmente, as notícias não são nada animadoras. Atualmente, o País está consideravelmente atrás na competição global pela liderança em IA, ocupando a 34ª posição entre 36 nações analisadas pelo estudo.

Michelle ressalta que, embora haja esforços pontuais e progressos em algumas áreas, o Brasil ainda enfrenta sérias limitações em relação ao investimento em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e à falta de uma infraestrutura sólida que possa sustentar avanços tecnológicos em larga escala.

“Adicionalmente, a formação em tecnologias emergentes não tem recebido a atenção adequada para preparar a próxima geração de especialistas em IA, o que afeta diretamente a capacidade do País de competir no cenário global.”

O país que se destacar como líder em IA não apenas definirá os padrões tecnológicos globais, mas também irá se posicionar como a próxima grande potência econômica mundial

Michelle Schneider
professora convidada da Singularity University

O rumo foi perdido?

Ronaldo Lemos é cientista-chefe do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS). Ele comenta que, na corrida pela IA, o Brasil está isolado e sem rumo, mas nem sempre foi assim.

“No passado, conseguíamos integrar melhor as redes de desenvolvimento tecnológico. De 2003 a 2010, inclusive, o Brasil foi uma potência mundial em Open Source (código aberto). Todos os anos, Porto Alegre sediava o Fórum Internacional do Software Livre”, lembra.

Ronaldo Lemos
cientista-chefe do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS)

O resultado da adoção do modelo de código aberto pelas principais empresas no Rio Grande do Sul foi significativo, atraindo programadores de renome mundial ao Brasil. O País integrou o código aberto como uma política pública, promovendo programas de compartilhamento de software na administração pública.

Contudo, houve uma percepção de que o Brasil perdeu sua essência, abandonando a liderança em Open Source. “Em  vez de focar o desenvolvimento tecnológico e a inovação, optou por copiar legislações europeias e abandonar suas próprias estratégias que anteriormente funcionavam”, explica Ronaldo.

Exatamente por isso, o cientista-chefe do ITS critica a atual regulação da tecnologia no Brasil, afirmando que ela copia modelos europeus que não funcionaram e que a Europa já está reavaliando suas legislações. Para resolver essa questão, Lemos sugere que o Brasil retome sua especialização em código aberto aplicado à Inteligência Artificial, propondo uma legislação que proteja e promova modelos abertos.

“Essa abordagem poderia transformar o País em um centro de desenvolvimento de IA, respeitando seu histórico e evitando a exclusão da competição global nessa área.”

A especialização em código aberto aplicado à IA poderia transformar o Brasil em um centro de desenvolvimento da tecnologia

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Um sonho possível

Contudo, antes de ir a fundo para entender o cenário brasileiro atual, vamos fazer um exercício de imaginação do que seria possível no País com o avanço e o investimento correto em IA e em novas tecnologias.

“Senhoras e senhores, muito boa noite. Meu nome é Luís Artur Nogueira e eu sou candidato a prefeito da sua cidade neste domingo. Será que vocês votariam em mim?

Minha proposta de governo, na nossa prefeitura, é fazer uma gestão transparente. Mas, como é que isso vai funcionar?

Como prefeito, vou criar um aplicativo que vocês terão no celular, na palma da mão de vocês. E vocês vão acompanhar, em tempo real, cada centavo que o nosso município vai gastar. Vocês vão saber quanto custou cada obra da nossa cidade, quanto custa a manutenção de equipamento público, quanto custa a praça, quanto custam por mês o hospital, a creche, a escola, quanto custa a coleta de lixo!

Pelo aplicativo, vocês também vão poder acompanhar todas as licitações do nosso município, ver quais são as empresas que estão concorrendo, quais são os lances, quem ganhou. E não é só isso, vai ter mais!

Graças à Inteligência Artificial, o aplicativo vai contar com um botão de emergência. E se vocês, munícipes, perceberem algum valor esquisito, que possa gerar alguma dúvida ou alguma suspeição de corrupção ou desvio de valor inadequado, apertarão o botão e a Secretaria da Transparência, que eu vou criar, vai receber a denúncia de vocês.

Ela vai avaliar, vai investigar, vai apurar e vai dar uma devolutiva sobre se aquele valor é correto ou não, dando detalhes do porquê é correto ou do porquê não é correto. Se não for correto, a tecnologia informará quais serão as providências a ser tomadas. A minha proposta, portanto, como candidato à prefeitura, é uma gestão realmente transparente.

E eu pergunto: Será que vocês votariam em mim?”.

Foi com esses dizeres que o economista Luís Artur Nogueira, também jornalista e palestrante, realizou a abertura magna da 29ª edição do Troféu Transparência, da Associação Nacional de Executivos (ANEFAC), que ocorreu em outubro de 2024, em São Paulo, destacando as empresas com as demonstrações financeiras mais transparentes.

Na análise do especialista, a transparência e a tecnologia são essenciais para uma gestão eficiente. Afinal, o uso de algoritmos e análises de dados possibilita a identificação de padrões de comportamento e gastos suspeitos.

Assim, uma hipotética Secretaria da Transparência agilizaria as investigações, e as denúncias da população poderiam ser tratadas com mais seriedade. Os cidadãos da cidade fictícia teriam um canal direto para reportar queixas, aumentando seu engajamento na fiscalização do governo.
E, graças ao atendimento disponível 24/7, a população teria a oportunidade de interagir em tempo real, o que aumentaria a percepção de segurança.

Esse modelo, similar ao Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC), promoveria um ciclo de confiança e responsabilidade, e a interação contínua não só melhoraria o governo, mas também impulsionaria mais soluções colaborativas, contribuindo para a evolução das políticas públicas e o avanço da IA.

Quem explica melhor esse cenário é Graziele Rossato, head de Tecnologia da ANEFAC: “Inovação e transparência, embora sejam disciplinas independentes, se complementam e favorecem estratégias organizacionais. A transparência gera confiança e encoraja a troca de ideias, promovendo uma cultura de colaboração. Já a inovação, impulsionada por tecnologias como Blockchain e IA, aumenta a confiabilidade das informações e proporciona insights valiosos.”

Dessa forma, juntas, essas práticas são diferenciais competitivos. E, quando aplicadas com metodologia e métricas adequadas, resultam em agilidade e eficiência. Da mesma forma que isso vale para as empresas, vale para os governos.

Entretanto, no Brasil, justamente nesse ponto, existe uma grande lacuna.

Excesso de burocracia

O nome dessa lacuna é burocracia.

A burocracia é um modelo de organização social baseado na racionalidade e na eficiência. Trata-se de um tipo de dominação estruturada por princípios e normas definidas. Max Weber (1864-1920), um dos principais teóricos da sociologia, afirmava que, quanto mais rígido for o sistema, mais prejudicial ele se torna, o que acaba gerando, em um efeito bumerangue, barreiras à dinâmica organizacional.

Se estivesse presente hoje, Max Weber notaria como as diversas exigências da burocracia brasileira complicam a tomada de decisões e a execução de políticas públicas. É como se aqui ela fosse, além de ferramenta de gestão, também um objetivo final.

Uma das provas cabais de toda essa morosidade está no Índice de Burocracia da América Latina de 2022, o qual revela que micro e pequenas empresas no Brasil gastam, em média, 180 horas por ano, equivalentes a 22,5 dias úteis, lidando com questões burocráticas. O gerenciamento de operações é a área que mais consome esse tempo, representando 57,7% do total.

Dinheiro e tempo perdidos

Além do tempo perdido, os custos indiretos incluem a perda de oportunidades de mercado e a dificuldade de competir globalmente, principalmente em setores como o de Tecnologia, no qual a burocracia pode restringir a inovação e a agilidade necessárias ao sucesso.

Adicionalmente, a burocracia gera desconfiança nos cidadãos, que a veem como um obstáculo, levando a uma percepção negativa da eficiência dos serviços. Esse ciclo vicioso se perpetua, e a desconfiança resulta em mais controle e formalidades.

Dessa forma, a cultura brasileira abraça a burocracia como uma realidade inevitável, o que gera um conformismo que desestimula a busca por alternativas. Essa situação compromete a produtividade de empresas e instituições, limitando a inovação, já que muitos empreendedores se sentem desmotivados em um ambiente de regras confusas e inconsistentes.

No Brasil, a maior parte dos investimentos em IA vem do setor privado. O apoio governamental ainda é tímido

De acordo com Gustavo Araujo, CIO e cofundador do Distrito, especialista em gestão da inovação, o problema está centrado em um fato: o Brasil tem-se preocupado mais em regular do que em incentivar. Embora seja necessário ter diretrizes que garantam o uso responsável de IA e de outras tecnologias, fato é que o excesso de regulamentação resulta no bloqueio à inovação, afastando investimentos.

O ideal, portanto, para Gustavo, seria o equilíbrio: de um lado, uma regulamentação que protegesse a sociedade, do outro, um regulador que também incentivasse as empresas a desenvolver e a aplicar a IA de forma competitiva. “Hoje, a maior parte dos investimentos em IA vem do setor privado, enquanto o apoio governamental ainda é tímido”, esclarece o CIO.

Graziele Rossato destaca a importância de equilibrar regulação, governança, segurança, ética e transparência, sugerindo que colaboração, boas parcerias e diversidade podem ajudar a minimizar riscos sem inibir a inovação.

Esse equilíbrio, segundo ela, é crucial para o posicionamento do Brasil no cenário global, atraindo investimentos em tecnologia e competitividade. “As diretrizes devem ser claras, flexíveis e adaptáveis, permitindo ajustes sem obstruir o desenvolvimento de novas soluções.”

Ganha mais quem investe mais

Enquanto os países que se destacam na corrida pela hegemonia tecnológica não perdem tempo e investem cada vez mais, o Brasil enfrenta a realidade com avanços em pesquisas e empresas adaptando-se ao novo cenário. No entanto, ainda são muitos os desafios para ganhar destaque. Um deles, como dito, a burocracia excessiva.

“Nos EUA e na China, um robusto ecossistema de inovação é fomentado por incentivos do governo, investimento em capital de risco e um ambiente regulatório propício ao avanço tecnológico”, enfatiza Gustavo Araujo, indicando que a liderança em IA transcende o mero acesso à tecnologia, englobando criação, domínio e implementação estratégica. “No Brasil, as empresas privadas estão à frente dessa iniciativa.”

No entanto, ao direcionar o olhar para o governo, as instituições brasileiras são percebidas como “incoerentes” e com níveis de competência e ética inferiores aos das empresas, conforme revela a 24ª edição do estudo Edelman Trust Barometer de 2024 sobre confiança global.

Conforme o relatório, 72% da população brasileira acredita que as autoridades estão tentando enganar os cidadãos. Entre os 1.150 entrevistados, 80% preferem receber informações sobre inovações e tecnologias de maneira acessível, enquanto 75% confiam nos cientistas como fonte de novidades. Por outro lado, jornalistas e instituições governamentais são considerados os menos confiáveis, com 49% e 44% de aprovação, respectivamente.

Essa desconfiança em relação às instituições governamentais reflete uma preocupação com a transparência e a credibilidade das informações, além de indicar uma mudança nas dinâmicas de acesso e consumo de informações pela população.

Os medos

Não é possível discutir a burocracia sem mencionar o medo, que é uma reação do organismo diante de uma ameaça ou perigo. Esse sentimento, muitas vezes, baseia-se em experiências anteriores. Outras vezes, está associado a inseguranças pessoais. Há também aqueles que temem as incertezas do futuro. Entretanto, no Brasil, o temor coletivo das pessoas está relacionado à economia.

Esse cenário gera um ciclo vicioso: a insegurança econômica leva à retenção de gastos e ao adiamento de investimentos. As famílias, temendo o desemprego ou a perda de poder aquisitivo, preferem economizar em vez de consumir. Isso, por sua vez, resulta em uma retração do mercado, afetando indústrias, comércios e serviços – e, consequentemente, o valor disponível para inovação e investimentos em novas tecnologias como a IA.

Burocracia que gera judicialização

O cenário resulta em uma judicialização excessiva, pois as pessoas, quando percebem que não conseguem resolver suas diferenças pacificamente, acabam recorrendo ao sistema judiciário como única solução disponível.

Porém, a judicialização excessiva sobrecarrega um sistema judiciário já saturado, gerando um ciclo vicioso em que a lentidão dos processos aumenta a insatisfação da população. As partes, em busca de agilidade, enfrentam prazos que se prolongam por anos, o que intensifica a frustração e contribui para uma percepção negativa do sistema judicial.

No contexto do consumo, destacam-se plataformas de órgãos de proteção ao consumidor, como o Procon-SP, que oferece recursos para otimizar a gestão de processos e a interação entre usuários e autoridades.

O Consumidor.gov, que completará 11 anos em 2025, é outro exemplo, permitindo que consumidores registrem reclamações sobre produtos e serviços, além de possibilitar o acompanhamento das respostas das empresas.

Democratizar a informação jurídica

Outro ponto importante é a plataforma Jusbrasil, que, desde 2008, tem investido em tecnologia para democratizar o acesso à informação jurídica, facilitando a consulta a dados jurídicos e a jurisprudências. Assim, tanto cidadãos quanto profissionais da área de Direito conseguem acessar informações relevantes, o que pode contribuir para a redução de disputas judiciais desnecessárias.

A utilização de Inteligência Artificial nesta plataforma permite a análise de casos similares, contribuindo para a previsão de resultados e a formulação de estratégias mais eficazes na resolução de conflitos.

“Embora o Direito seja uma ciência extremamente especializada, com seu próprio vocabulário técnico, também é uma área de interesse público que impacta a vida de todas as pessoas. Nossa missão, portanto, é encontrar um equilíbrio entre a tecnicidade do setor e uma linguagem acessível”, esclarece Catarina Wodzik, especialista em Direito Privado e Legal Expert do Jusbrasil.

Catarina Wodzik
especialista em Direito Privado e Legal Expert do Jusbrasil

Inovações na sociedade

Outro dado relevante do estudo Edelman Trust Barometer é que 63% dos brasileiros confiam mais nas empresas para a integração de inovações do que em ONGs (52%), na mídia (50%) e no governo (46%).

Quanto à aceitação das inovações, o Brasil enfrenta uma encruzilhada, com 31% e 29% da população aceitando a IA e a medicina genética, respectivamente, enquanto 32% não concordam com essas novidades.

Além disso, a maioria dos países, incluindo o Brasil, acredita que as inovações estão sendo mal administradas, ou seja, as pessoas consideram que são poucas as políticas públicas cujo objetivo seja de fomentar um ambiente propício à inovação genuína, garantindo que empresas e startups possam prosperar.

O fato é que, quando o governo não gerencia adequadamente as inovações, a equidade e o capitalismo ficam em xeque. Isso significa que os desvios de práticas éticas e transparentes pode resultar em uma desigualdade social ainda mais pronunciada, afetando especialmente aqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade.

O PBIA e a competitividade brasileira

Em busca de iniciar uma evolução, o Brasil lançou, em julho de 2024, o seu primeiro Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA) com o objetivo de recuperar o tempo perdido e fortalecer sua posição global em IA. A iniciativa, chamada “IA para o Bem de Todos”, prioriza a transformação digital e prevê investimentos de até R$ 23 bilhões em 54 iniciativas entre 2024 e 2028, visando aprimorar os serviços públicos, estimular a inovação empresarial, capacitar os profissionais e melhorar a infraestrutura tecnológica.

Henrique Fabretti
CEO do Opice Blum

O plano inclui a atualização do supercomputador Santos Dumont e a criação de um ambiente de nuvem sob gestão governamental.

“A questão do investimento é muito relevante para a realidade brasileira. Contudo, precisamos saber o que é palpável nesses R$ 23 bilhões versus o que é necessário para as pretensões brasileiras. A eficácia desses investimentos será crucial para determinar se o Brasil pode melhorar sua posição no ranking de IA e tornar-se competitivo no cenário internacional”, pontua Michelle.

Por sua vez, Henrique Fabretti, CEO do Opice Blum, argumenta que, embora o plano inclua elementos para incentivar o desenvolvimento de IA no Brasil, a falta de uma estratégia de longo prazo é uma preocupação.

“Seria ideal que essa estratégia fosse apartidária, permitindo que governo, empresas e academia trabalhem com fundamentos sólidos. Além disso, é fundamental que essa abordagem não se altere com a troca de governo. Para sermos competitivos, precisamos de planos bem-estruturados e que sejam implementados em horizontes de longo prazo: 10, 20, 30 anos.”

Para sermos competitivos, precisamos de planos bem-estruturados e que sejam implementados em horizontes de longo prazo: 10, 20, 30 anos

Marco Regulatório da IA

Em dezembro de 2023, houve a aprovação do Marco Regulatório para a Inteligência Artificial (Projeto de Lei nº 2.338). O projeto estabelece diretrizes claras para o desenvolvimento e a implementação de tecnologias de IA, visando proteger os direitos dos cidadãos e garantir a transparência nas operações automatizadas. Além disso, busca promover a inovação responsável, incentivando empresas a adotar boas práticas no uso de dados e algoritmos.

Uma das principais inovações trazidas pelo Marco Regulatório é a necessidade de avaliação de riscos associados a sistemas de IA, especialmente aqueles que impactam a vida e os direitos dos indivíduos. Com isso, as organizações serão obrigadas a realizar auditorias periódicas de seus sistemas, a fim de identificar e mitigar potenciais danos que possam surgir em decorrência de um uso inadequado da tecnologia.

O documento também propõe a criação de um conselho consultivo que ficará encarregado de monitorar e revisar continuamente as práticas de mercado, garantindo que as novas soluções em IA sejam desenvolvidas de maneira ética e segura.

Este conselho poderá recomendar mudanças na legislação, conforme a evolução da tecnologia e das práticas de mercado, assegurando que o Brasil permaneça na vanguarda das inovações em IA.

De acordo com Juliana Abrusio, sócia do escritório de advocacia Machado Meyer e membro do Comitê Nacional de Cibersegurança (CNCiber), o PL 2.338 tem grande inspiração no modelo europeu. A respeito da efetiva regulamentação, ela acredita que ainda há muito a acontecer. Isso porque o Senado acabou de aprovar o PL de IA e a Câmara dos Deputados ainda irá tramitar o projeto. “Pode levar meses e a redação ainda não está definida”, conta.

O que esperar?

Juliana Abrusio é enfática ao afirmar que, pelas discussões de parlamentares e especialistas, não parece que o Brasil seguirá o caminho norte-americano. Ao contrário, deve aproveitar essa janela de oportunidade para viabilizar condições de investimento de tecnologia estrangeira.

Para a especialista, as iniciativas relacionadas à IA no Brasil visam estabelecer o País como um ambiente propício ao desenvolvimento dessa tecnologia.

Em relação ao PBIA, ela ressalta que um dos objetivos é realçar e fortalecer a atratividade do Brasil para investimentos no ecossistema que suporta a IA, como os Data Centers, devido à sua capacidade de gerar energia limpa.

O PBIA traz uma mensagem significativa para os agentes nacionais e investidores estrangeiros, incentivando a inovação, o que é apoiado pelos marcos regulatórios em criação

“Dessa forma, o Plano traz uma mensagem significativa para os agentes nacionais e investidores estrangeiros, incentivando a inovação, o que é apoiado pelos marcos regulatórios em criação. Como exemplo, a proposta prevê a definição de regimes simplificados para fomentar o desenvolvimento tecnológico nacional, incluindo a flexibilização de obrigações regulatórias para estimular a inovação e a pesquisa científica e tecnológica.”

O grande desafio é elaborar uma regulação que proteja os direitos fundamentais, sem negligenciar o incentivo ao desenvolvimento tecnológico interno

Chiara Battaglia, também especializada em Direito Digital do Machado Meyer, comenta que, diferentemente dos Estados Unidos, o Brasil ainda é muito dependente de tecnologia estrangeira. Ademais, o País sofre com o fenômeno de “fugas de cérebros”. Em outras palavras, exímios alunos e pesquisadores brasileiros vão para o exterior, por mercados mais atrativos.

Esse panorama, em sua visão, não favorece em nada o horizonte social e econômico do País.

Ao serem questionadas sobre os desafios de conciliar regulação e inovação, Juliana Abrusio e Chiara Battaglia destacam: “O grande desafio é elaborar uma regulação que proteja os direitos fundamentais, sem negligenciar o incentivo ao desenvolvimento tecnológico interno. O Brasil destaca-se como um dos países mais preparados do mundo para a construção de Data Centers voltados ao treinamento de modelos avançados de IA. Isso se deve à ampla disponibilidade de áreas e à sua matriz energética limpa, além da capacidade de resfriamento dos servidores, já que possuímos a maior bacia hídrica do planeta.”

Leis defasadas

Como tudo é muito burocrático no Brasil, provavelmente você deve estar se perguntando: “Existe risco de a regulação em IA ficar defasada em relação ao rápido avanço da tecnologia?”

A resposta é sim. Para a palestrante internacional Michelle Schneider existe, inclusive, um risco significativo de que a regulação em IA se torne obsoleta antes mesmo de ser implementada de forma eficaz.

“A chave pode estar em desenvolver um modelo regulatório adaptável, que possa ser revisado e atualizado com frequência, acompanhando as inovações sem perder de vista a proteção dos direitos dos cidadãos. Dessa forma, o Brasil pode evitar a armadilha de ter regras que, embora bem-intencionadas, se tornem um obstáculo para o desenvolvimento tecnológico. Afinal, ninguém quer investir pesado em uma legislação que logo se torne um ‘dinossauro’ na era da IA, não é mesmo?”, ressalta Michellle.

Pesquisa e avanços

Maraísa Cezarino, advogada especializada em Proteção de Dados e Direito Digital da Daniel Advogados, afirma que a pesquisa em Inteligência Artificial, em consonância com um Marco Legal de IA prestes a ser aprovado, promoverá a criação de soluções mais sofisticadas e éticas.

“A pesquisa em IA é fundamental para ajudar na elaboração de bases comuns de conhecimento, tanto em áreas de Humanas quanto nas de Exatas. É por meio da pesquisa que se orienta e estimula a interpretação da legislação, capaz de impulsionar a inovação e o desenvolvimento responsável dessa tecnologia.”

É por meio da pesquisa que se orienta e estimula a interpretação da legislação, capaz de impulsionar a inovação e o desenvolvimento responsável da tecnologia

Novo Instituto em IA

O reitor da PUC-Rio, Padre Anderson Antonio Pedroso, compartilha dessa mesma visão, ressaltando que a IA, com a ética e a transparência, deve ser um tema central na sociedade. Por essa razão, a instituição inaugurou, em dezembro de 2024, o primeiro Instituto de Ensino e Pesquisa em Inteligência Artificial do Brasil, que iniciará um curso de bacharelado em IA ainda neste ano.

O espaço, que terá 3,3 mil metros quadrados, incluirá laboratórios modernos e um auditório. A expectativa é abrir cem vagas por ano, com um programa de bolsas de estudo e um centro de pesquisas avançadas na área.

Para essa causa, a Fundação Behring realizará a maior doação individual à universidade, somando R$ 35 milhões e marcando um avanço significativo na formação de profissionais qualificados em IA, capazes de promover soluções inovadoras e otimizar processos em diversos setores da economia.

Para o Padre Anderson Antonio Pedroso, o novo Instituto trará benefícios para toda a sociedade. No que diz respeito às relações de consumo, ele espera que essa iniciativa proporcione experiências mais personalizadas aos consumidores. Isso poderá resultar em recomendações mais precisas e relevantes, além de melhorias na interação com as plataformas digitais.

O reitor destaca que profissionais capacitados em IA, aliados a uma perspectiva humanística, poderão criar soluções inovadoras que atendam às particularidades dos consumidores. “Isso, consequentemente, fomentará um maior engajamento e satisfação.”

Digitalização universal

Diante de tantas inovações, é imprescindível adaptar-se continuamente às novas exigências do mercado. Na perspectiva do governo, Henrique Fabretti, do Opice Blum, observa que muita coisa poderia ser diferente se as administrações nas três esferas adotassem a digitalização.

“Pesquisas mostram que haveria um aumento na eficiência, além de maior transparência, maior engajamento da sociedade com as iniciativas governamentais e melhorias nas políticas públicas, pois as decisões seriam tomadas com dados mais confiáveis e conectados à realidade.”

Nesse contexto, e considerando a vastidão do Brasil, ele defende que a única alternativa é a digitalização abrangente de todos, inclusive do governo.

Moral da história: o aprimoramento da infraestrutura digital é essencial diante das mudanças trazidas pela IA em nossas interações e nos negócios. Essa evolução é irreversível e demanda atenção à ética e à transparência no uso da IA e no manejo de dados.

Estabelecer diretrizes claras é fundamental para garantir um uso responsável da tecnologia, focando a privacidade e a proteção dos cidadãos. Assim, é possível construir um futuro no qual a tecnologia e a humanização progridam juntas.

Para que o Brasil se torne competitivo na corrida global por tecnologia, é fundamental adotar uma estratégia integrada que inclua o fortalecimento da infraestrutura tecnológica, como a expansão da Internet de alta velocidade e modernização de Data Centers.

Além disso, é necessário intensificar o apoio ao empreendedorismo e à inovação, com incentivos fiscais e redução de burocracia para facilitar startups. “A formação em tecnologias emergentes deve ser priorizada em todos os níveis de educação, preparando a força de trabalho para as demandas futuras”, diz Michelle Schneider.

“Por fim, é importante estabelecer uma legislação adaptável que proteja a privacidade e a segurança dos dados, equilibrando regulamentação e liberdade empresarial.”

O que é necessário para o Brasil se tornar competitivo em IA?

  • Adotar uma estratégia integrada de fortalecimento da infraestrutura
    tecnológica.
  • Intensificar o apoio ao empreendedorismo e à inovação.
  • Incentivar pesquisa e desenvolvimento em IA.
  • Formar novos talentos em tecnologia e mantê-los no País.Equilibrar regulamentação e liberdade empresarial.
  • Desburocratizar.
  • Tornar as leis adaptáveis.Capitalizar a matriz energética limpa disponível.
SUMÁRIO – Edição 291

A evolução do consumidor traz uma série de desafios inéditos, inclusive para os modelos de gestão corporativa. A Consumidor Moderno tornou-se especialista em entender essas mutações e identificar tendências. Como um ecossistema de conteúdo multiplataforma, temos o inabalável compromisso de traduzir essa expertise para o mundo empresarial assimilar a importância da inserção do consumidor no centro de suas decisões e estratégias.

A busca incansável da excelência e a inovação como essência fomentam nosso espírito questionador, movido pela adrenalina de desafiar e superar limites – sempre com integridade.

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CAPA: Camila Nascimento
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