A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) divulgou uma nota técnica estabelecendo novos critérios de transparência para plataformas digitais. Agora, as plataformas terão um prazo de quatro meses para ajustar seus anúncios aos procedimentos estabelecidos. Ademais, foi dado o prazo de um ano para os dados em geral divulgados em seus domínios.
Em síntese, caso as plataformas não cumpram as exigências e prazos, a Senacon irá aplicar sanções.
Senacon X Big Techs
Em suma, a nota técnica comunica às plataformas digitais a necessidade de que as empresas no Brasil adotem os mesmos critérios de transparência em relação a dados e anúncios que são aplicados na Europa. Nesse ínterim, isso inclui uma norma sobre o uso de Inteligência Artificial.
O secretário nacional do consumidor, Wadih Damous, foi quem assinou o documento designado “Critérios de Acesso e Qualidade de Dados sobre Anúncios e Critérios de Acesso e Qualidade de Dados”.
Com efeito, a nota apresenta 95 requisitos que as plataformas digitais devem atender para operar regularmente no país.
Transparência
Entre as exigências estabelecidas pelo órgão em relação à transparência dos anúncios, a Secretaria determina o seguinte:
- Que as empresas assegurem que a interface do repositório de anúncios da plataforma ou rede de publicidade indique, “de maneira clara e inequívoca”, conteúdos gerados por Inteligência Artificial;
- A disponibilização da interface do repositório da plataforma ou rede de publicidade, sinalizando os anúncios em que a utilização de Inteligência Artificial foi crucial para a criação do conteúdo;
- A publicação de relatórios de transparência, sem a necessidade de requisição, com uma frequência mínima semestral. “Tais relatórios de transparência devem apresentar informações de interesse público sobre a atuação da empresa no Brasil, no que se refere à comercialização e veiculação de anúncios, incluindo dados sobre ações de moderação manual e/ou computacional proativa (sem necessidade de ordem judicial ou requisição extrajudicial) para coibir o impulsionamento de publicidade ilegal, irregular ou abusiva”, diz o texto da Senacon;
- O repositório de dados inclua informações sobre a idade e o gênero do público que recebeu os anúncios no último ano, bem como a localização geográfica das pessoas que interagiram com eles;
- Que as plataformas sejam transparentes em relação aos patrocinadores dos anúncios, informando quem financiou o impulsionamento e os dias em que os anúncios foram exibidos.
Na nota técnica, a Senacon ressalta que as plataformas digitais não são agentes “neutros e passivos” em relação aos conteúdos que circulam nelas. Dessa maneira, para a entidade de proteção dos consumidores, isso se dá porque as empresas realizam a mediação dos conteúdos apresentados aos usuários. Por esse motivo, não podem se eximir das obrigações que decorrem dessa atividade.
Interface
As novas diretrizes estabelecem que cada plataforma deve ter uma Interface de Programação de Aplicações (API).
Em outras palavras, a API servirá como um repositório digital acessível para a consulta de informações sobre o conteúdo exibido, incluindo detalhes sobre anúncios. Dessa forma, a plataforma deverá disponibilizar na internet a documentação necessária para utilização desse repositório, a qual não pode exigir cadastro ou login para acesso. Ou seja, a pesquisa deve ser realizada de maneira livre e transparente por qualquer usuário.
Sob o mesmo ponto de vista, por meio desta interface, as plataformas serão responsáveis por assegurar a recuperação de dados referentes a todos os anúncios veiculados, assim como os textos apresentados e links para mídias.
Outra coisa: a plataforma deve assegurar a recuperação de dados recém-publicados quase em tempo real. Desse modo, a ação tem por propósito permitir o acesso a esses dados em até uma hora após a publicação do conteúdo na plataforma digital.
Vulnerabilidade
A nota técnica da Senacon está baseada na base principiológica de proteção aos consumidores. Em suma, a vulnerabilidade do consumidor é reconhecida como um princípio fundamental nas relações de consumo, fundamentada no dever de proteção estatal conforme o artigo 5º, XXXII da Constituição. A ideia de harmonia busca equilibrar a proteção dos consumidores com o desenvolvimento econômico e tecnológico, levando a boa-fé a ser um princípio orientador.
A melhoria do mercado de consumo implica a educação dos participantes através da (in)formação, promovendo a prevenção de violações normativas e incentivando a qualidade, segurança e composição dos interesses dos consumidores. Além disso, é essencial coibir práticas abusivas e realizar um estudo contínuo das mudanças no mercado para atualizar as normas e sua aplicação. “Na mesma ordem, as práticas abusivas devem ser coibidas, o que de modo geral atribui encaminhamentos para a melhoria dos serviços públicos; e, de forma especial, o estudo constante das modificações e variações do mercado de consumo promovem a atualização da norma ou, no mínimo, a forma de aplicá-la”.
A nota técnica da Senacon pode ser acessada nesse link.
Suspensão
A norma da Senacon representa mais um capítulo das ações que vêm sendo implementadas pelo Ministério da Justiça em relação às plataformas digitais. Importante destacar que em julho, a Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD) suspendeu a eficácia da nova política de privacidade da Meta – a grande empresa responsável pelas redes Facebook, Instagram e WhatsApp. Modificada no final de junho, essa nova política permite que a empresa utilize as informações dos usuários para treinar e aprimorar seus sistemas de Inteligência Artificial generativa.
Além disso, a suspensão levanta questões sobre a transparência e o consentimento relacionado ao uso de dados pessoais. A nova política da Meta foi criticada por não proporcionar clareza suficiente sobre como os dados dos usuários seriam utilizados. Em outras palavras, a ação deixou uma lacuna importante na proteção dos direitos individuais. A ANPD enfatiza a necessidade de que empresas adotem práticas que garantam a privacidade, respeitando as normas previstas na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Plano de Inteligência Artificial
No dia 30 de julho, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esteve presente na 5ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, onde fez o lançamento do primeiro Plano Brasileiro de Inteligência Artificial.
Esse plano, solicitado por Lula no início do ano, trará políticas para investimento e utilização da Inteligência Artificial no Brasil. O presidente destacou a necessidade de regulamentações que garantam a proteção dos dados dos cidadãos. A ideia é promover um ambiente mais justo para que empresas atuem de forma ética. Ele enfatizou que o governo está comprometido em criar um ecossistema saudável para a inovação e o desenvolvimento da Inteligência Artificial no Brasil. Em conclusão, a ideia é permitir que essa tecnologia beneficie a sociedade como um todo.
O plano proposto inclui diretrizes para fomentar a pesquisa e o desenvolvimento em Inteligência Artificial. Ademais, incentiva parcerias entre instituições acadêmicas, setor privado e governo. Iniciativas para capacitação e treinamento de profissionais na área também mencionaram o objetivo de aumentar a competitividade do Brasil no cenário global.
Marco regulatório
O objetivo, primordialmente, é garantir maior segurança aos usuários. O governo também busca criar mecanismos de fiscalização que assegurem que as grandes empresas atuem de acordo com as normas estipuladas.
Lula ressaltou que a Inteligência Artificial, se bem regulamentada, pode servir como uma poderosa aliada para resolver problemas sociais e econômicos. Por consequência, ela tem o potencial para melhorar a qualidade de vida da população e impulsionar setores estratégicos como saúde, educação e segurança pública. O presidente afirmou ainda que o Plano Brasileiro de Inteligência Artificial é um passo fundamental para posicionar o país de forma proativa na revolução tecnológica.
Pesquisa
Recentemente, o Laboratório de Estudos de Internet e Redes Sociais (NetLab) identificou e classificou 1.565 anúncios publicitários direcionados às mulheres como problemáticos, irregulares ou ilegais/fraudulentos. Pesquisadores coletaram os dados de redes sociais e plataformas como Facebook, Instagram, Messenger e Audience Network durante 28 dias, entre janeiro e fevereiro deste ano.
Os pesquisadores intitularam a pesquisa inédita de “Observatório da indústria da desinformação e violência de gênero nas plataformas digitais”. Ela contou com o apoio e financiamento do Ministério das Mulheres, no âmbito da iniciativa Brasil Sem Misoginia.
O estudo revelou a existência de 550 páginas e perfis que publicaram anúncios vistos como tóxicos pelo NetLab. O laboratório é vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
A consideração é devida ao tipo de ameaça que representam às mulheres, seu principal público-alvo. Uma análise das mensagens divulgadas e das normas jurídicas pertinentes aos tipos de anúncios em questão permitiu classificá-los como problemáticos, irregulares ou ilegais/fraudulentos.
Ameaças
Na fase seguinte, buscou-se uma categorização mais detalhada dos tipos de ameaça representados nos anúncios. A mais comum foi a de “risco à saúde pública ou individual”, identificada em 78,6% dos anúncios analisados. Em segundo lugar, apareceu “desinformação ou publicidade abusiva ou enganosa”, presente em 66% dos conteúdos. Depois, vieram “reforço de estereótipos de gênero, machismo e objetificação da mulher” (44,3%); “fraude ou golpe” (35%); e “uso de identidade falsa” (34%).
Em suma, a maioria dos anúncios apresenta mais de um tipo de ameaça, resultando em sobreposição de categorias.
Do total de anúncios analisados, 1.253 abordam temas relacionados ao corpo feminino, inseridos no lucrativo mercado da estética. Esses anúncios podem enganar, por exemplo, ao mencionar a suposta aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para conferir legitimidade aos produtos. Muitos utilizam recursos como logotipos, fotos da fachada da agência e deep fakes para criar narrativas falsas e aplicar golpes.