Recentemente, em grandes shows e festivais, uma discussão tem vindo à tona em relação ao direito dos consumidores: a devolução da taxa de conveniência na hora do cancelamento. A polêmica acontece porque, quando ocorre uma mudança de programação repentina ou um artista cancela a participação em cima da hora, muitas vezes perdem o interesse no evento – mesmo depois de terem comprado o ingresso. O consumidor, então, faz o cancelamento e solicita o reembolso. Na maioria dos casos, os organizadores devolvem o valor pago no ingresso. Mas, e a taxa de conveniência?
O Procon de São Paulo (Procon-SP) defende que pedidos de ressarcimento feitos pelos consumidores sejam atendidos de forma integral. Ou seja, o órgão de defesa do consumidor orienta às empresas que promovem shows e festivais a reembolsarem, dentro das previsões legais vigentes, todo o valor investido pelos clientes (taxas + ingresso). Segundo o Procon-SP, a quantidade de reclamações registradas por consumidores sobre a não devolução das taxas tem sido muito grande.
Na avaliação da entidade, a venda de ingressos é um acessório necessário ao show – que é o serviço principal. Se o principal não ocorre ou se o consumidor desiste da compra, dentro dos prazos legais, ele tem o direito à restituição integral dos valores gastos, incluídas todas as taxas, inclusive a de conveniência.
De acordo com a autarquia, mesmo que haja, por parte das fornecedoras, alegações de contratos de compra aceitos no momento da aquisição dos ingressos e que não se responsabilizam pelos cancelamentos, tal prática fere o expresso no artigo 51, inciso I do CDC. Como os episódios estão sendo recorrentes em São Paulo, o Procon-SP reforça a recomendação para que os consumidores formalizem as queixas no site www.procon.sp.gov.br.
O registro é fundamental para que o órgão de defesa possa auxiliar o consumidor com orientações sobre seus direitos e caminhos possíveis para o ressarcimento.
Taxa de conveniência: Uma polêmica recente
A Consumidor Moderno abordou recentemente alguns casos envolvendo essa polêmica. Um dos exemplos foi o Lollapalooza 2023. Bem perto da data do evento, os fãs do Blink-182 “tomaram” um verdadeiro balde de água fria, com o cancelamento da presença do grupo no festival. Seria o primeiro show do Blink no Brasil, mas a banda suspendeu todas as apresentações agendadas na América Latina por causa de uma cirurgia no dedo do baterista Travis Barker.
Diante do imprevisto, o Festival Lollapalooza Brasil 2023 informou que aqueles que compraram o ingresso para o dia em que o Blink se apresentaria, poderiam solicitar o reembolso do valor do ingresso. Mas, a organização deixou claro que o valor a ser ressarcido seria apenas referente ao ingresso. A taxa de conveniência não seria devolvida e a taxa de entrega só poderia ser revertida caso a entrega ainda não tivesse sido realizada.
Essas taxas variavam de R$ 117 a R$ 260 reais e, segundo as diretrizes divulgadas pelo festival, não seriam estornadas nos casos de cancelamento. Na ocasião, o Procon-SP se manifestou dizendo que a organizadora deveria sim realizar a devolução de todos os valores pagos pelos consumidores.
Há controvérsias
A discussão sobre a devolução do valor pago em taxas não é tão simples quanto parece e não há uma unanimidade no entendimento de que ele deva ser reembolsado em casos de cancelamento. O professor de direito do consumidor, Vitor Morais de Andrade, defende que é preciso que haja razoabilidade em uma situação com essa.
Segundo o especialista, quando falamos de eventos de entretenimento e shows, é importante que os consumidores saibam que imprevistos alheios à vontade das empresas organizadoras podem acontecer. A devolução do valor dos ingressos deve ter uma política clara e o reembolso é recomendado nesses casos. Sobre as taxas, consideradas como “custos acessórios”, não existe uma regra.
“É preciso analisar. Se a taxa de conveniência ou custo de entrega realmente foi algo à parte e se, percentualmente, não constitui um valor relevante em relação ao preço do ingresso, eu acho que é possível o raciocínio da devolução somente do valor do ingresso. O que podemos considerar como “não relevante” nesse caso? Um percentual de 10%, 15%, 20%. Ou seja, algo que realmente caracteriza uma taxa e não um valor substancial”, explica Vitor.
O professor afirma que como a taxa se refere à conveniência, ela traz vantagens, benefícios, para os clientes. E, segundo ele, se ficou claro na oferta dessa conveniência que é possível que alguma banda cancele a participação e que em casos como esses seria devolvido apenas o valor referente ao ingresso, não há qualquer irregularidade nisso.
“De qualquer forma, é importante a gente analisar o contexto. Para saber se essa expectativa, essas informações foram apresentadas para o consumidor no momento da venda do serviço. Essa é a minha posição. Não concordo com o caminho de obrigar a devolver tudo, ou de não ter de devolver nada”, defende o especialista.
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