Os defensores da matéria acreditam que ela proporcionará maior proteção aos motoristas, evitando exploração e garantindo direitos trabalhistas
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou no dia 4 de março o projeto de lei complementar para regulamentar o trabalho dos motoristas de transporte por aplicativos. Com o projeto, o governo busca equilibrar a relação entre motoristas e empresas de aplicativos, garantindo direitos básicos e promovendo uma relação mais justa e transparente.
Na cerimônia de assinatura do projeto, Lula disse assim: “Vocês acabaram de criar uma nova modalidade no mundo de trabalho. No mundo do trabalho, uma criança foi parida. As pessoas querem autonomia. Vão ter autonomia, mas, em síntese, precisam de um mínimo de garantia”.
Agora, certamente, o próximo passo, na visão do presidente, é a categoria trabalhar para convencer os parlamentares a aprovar a proposta encaminhada ao Congresso Nacional.
Por sua vez, o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, afirmou que houve uma discussão sobre a possibilidade de enquadrar os motoristas de aplicativos nas regras da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Ainda assim, consoante Marinho, a maioria da categoria decidiu pela autonomia, mas com garantia de direitos.
Desse modo, Marinho destacou, em sua fala, “a criação de uma organização diferenciada”. Nela, os motoristas poderão atuar de forma autônoma, escolhendo suas plataformas e horários, e por consequência terão direitos garantidos.
Benefícios para motoristas
A proposta, elaborada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, inclui a sugestão de um valor mínimo por hora trabalhada.
Em outras palavras, os trabalhadores terão um piso salarial por hora no valor de R$ 32,09, sendo R$ 8,02 referentes ao serviço prestado e R$ 24,07 correspondentes aos custos do trabalhador. Nenhum motorista poderá receber menos do que R$ 10 por viagem, R$ 2 por quilômetro e R$ 0,21 por minuto, no caso da categoria “X” ou equivalente, por exemplo. Para a categoria “Black”, o valor mínimo por viagem será de R$ 15.
O salário mínimo (atualmente R$ 1.412) será a base para a remuneração. O cálculo será feito com base no tempo que o motorista trabalhar efetivamente, desde a aceitação da viagem até a chegada do passageiro ao destino.
Contribuição previdenciária
Será criada uma contribuição previdenciária para a categoria. O tributo será descontado na fonte e recolhido pelas empresas.
A alíquota da contribuição ao INSS será de 27,5%, sendo 20% recolhidos pelas plataformas e 7,5% pelos trabalhadores. Com essa contribuição, os motoristas terão direito a benefícios como aposentadoria por idade, pensão por morte e auxílio-doença, entre outros.
O projeto de lei, inicialmente, se aplica apenas aos serviços de transporte de passageiros (como 99, Cabify e Uber).
Em contrapartida, não houve acordo relacionado aos entregadores de mercadorias (como Rappi e iFood, por exemplo). O motivo foi a falta de consenso com as empresas. Para resolver a questão desses profissionais, o Ministério do Trabalho pretende retomar as negociações em um segundo momento.
A jornada diária será de oito horas, podendo estender-se para até 12 horas mediante acordo com os sindicatos da categoria.
Projeto de lei
O governo, os trabalhadores e as empresas negociaram durante 10 meses para criar o PL que será encaminhado ao Congresso Nacional.
Aliás, se o projeto for aprovado pela Câmara dos Deputados, os motoristas de aplicativo serão reconhecidos como “trabalhadores autônomos por plataforma”. Outra novidade é que não haverá qualquer “relação exclusiva entre trabalhadores e empresas”. Em conclusão, empresas e trabalhadores realizarão negociações coletivas por meio de sindicatos.
Jornada diária para motoristas
A jornada diária será de oito horas, podendo ser estendida para até 12 horas mediante acordo com os sindicatos da categoria., primordialmente. Ademais, a empresa fornecerá aos motoristas cadastrados vale-refeição diário, conforme estabelecido no acordo, a partir da sexta hora trabalhada por dia.
Analogamente, o projeto também estabelece que a empresa deve se comprometer a oferecer serviços médicos e odontológicos, tanto para os motoristas cadastrados quanto para seus dependentes.
As empresas de corrida por aplicativo devem garantir aos motoristas pontos de apoio localizados em locais a serem acordados com o sindicato. Esses lugares têm que dispor de instalações de primeiros socorros, água potável, refeitório, sanitários em perfeitas condições.
Em relação ao banimento do motorista do aplicativo: caso haja infrações consideradas leves, ele poderá retornar à plataforma após passar por um processo de reciclagem, comprovado junto ao sindicato. Já em casos de infrações graves ou gravíssimas, o motorista poderá apresentar sua defesa ao sindicato, sendo analisada por uma junta paritária composta por membros do sindicato e da empresa.
Categoria autônoma
Inicialmente, o governo planejava incluir os motoristas de aplicativos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Durante as negociações, as partes não concordaram com a viabilidade de um pagamento mínimo de R$ 17 por hora. O debate também abordou o fundamento de pagamento por hora trabalhada. Sob o mesmo ponto de vista, os trabalhadores defendem a remuneração a partir do momento em que ficam disponíveis no aplicativo.
Na Câmara dos Deputados, os líderes têm a prerrogativa de votar projetos em regime de urgência, o que permite acelerar a tramitação e a votação das matérias legislativas sem a necessidade de passarem pelas comissões. Esse mecanismo agiliza a análise e aprovação de propostas consideradas prioritárias, permitindo que os participantes debatam e votem mais rapidamente. Dessa forma, o regime de urgência é uma ferramenta importante para garantir celeridade na tomada de decisões no âmbito do Legislativo.
O Supremo Tribunal Federal (STF) está examinando a questão do vínculo empregatício entre as empresas de corrida de aplicativos e os motoristas.
O projeto de lei, se aprovado, entrará em vigor em 90 dias após a sanção. A regulamentação do trabalho de motoristas de aplicativo era uma promessa da campanha de Lula.
Mudanças para o consumidor
A medida, assim que entrar em vigor, impactará, com aumento de valores, o bolso dos passageiros. Quem garante é Silvia Monteiro, sócia do Urbano Vitalino Advogados. “As plataformas terão aumento com o pagamento do INSS. Logo, elas terão que repassar esses dispêndios”.
Contudo, na visão da especialista em Direito do Trabalho, a medida é benéfica, principalmente no que tange aos benefícios previdenciários.
“Afinal, a lei garante amparo em situações de doença, invalidez ou aposentadoria, evitando que esses trabalhadores fiquem desamparados. Em segundo lugar, o projeto auxilia para que as empresas que pretendem investir nessa atividade tenham clareza e segurança, até mesmo para precificar a prestação de serviços, quanto aos custos envolvidos na cadeia produtiva”.
Na visão de Silvia Monteira, alguns pontos estão “a desejar”. “A lei deveria considerar a hora trabalhada como designada para o pagamento do valor por hora, e não a milha rodada, por exemplo. Seria mais apropriado estabelecer uma fórmula que levasse em consideração a corrida, distância e duração.
A Uber disse, em nota, considerar o projeto apresentado pelo governo como um marco importante para regular o trabalho intermediado por plataformas. Para a empresa, a matéria ampliará as proteções para os trabalhadores sem prejudicar a flexibilidade e autonomia proporcionadas pelos aplicativos. Ademais, a Uber destacou o valor do diálogo e negociação entre os representantes dos trabalhadores, setor privado e governo, que resultou na elaboração da proposta.