Desde o início da pandemia, as cenas de shows e festas passaram a carregar tons negativos. Não sem sua parcela de razão. Muitos organizadores optaram por simplesmente ignorar as medidas de prevenção. A despeito do perigo, realizaram eventos clandestinos mesmo nos picos de transmissão, hospitalizações e mortes devido à covid-19.
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O problema é que esta foi praticamente a única forma com que o setor foi retratado ao longo dos últimos 18 meses na imprensa. Foi assim também nas redes sociais. Firmou-se a noção de que shows, festas e festivais são essencialmente uma forma de entretenimento supérfluo.
Não me cabe aqui julgar, seja para condenar ou absolver, quem fez ou deixou de fazer eventos durante a pandemia. Há pessoas e contextos mais apropriados para isso. Meu propósito é mostrar a importância da música ao vivo, fazendo isso pela lente dos festivais.
Descoberta
É nos festivais que muitas pessoas descobrem novas músicas e artistas. Eles cumprem papel importantíssimo na revelação e impulsionamento de artistas e cenas culturais inteiras.
A experiência proporcionada pelos vários palcos com curadoria diversa faz com que surpresas aconteçam com frequência – e uma grande apresentação em um festival pode fazer toda a diferença na carreira de um jovem talento.
Muito além da música
Os festivais movimentam uma cadeia de valor que vai muito além da música. Transporte de passageiros e de carga, hospitalidade, comércio, serviços. Estes são apenas alguns dos setores econômicos que se beneficiam com a realização de um festival. Isso sem falar do aumento na arrecadação de impostos e da criação de postos de trabalho, tanto diretos quanto indiretos.
São plataformas para marcas patrocinadoras interagirem com seu público de forma direta, autêntica e descontraída. A tendência hoje é que essa participação se dê de forma cada vez menos ostensiva e intrusiva, buscando a completa integração com a narrativa, a linguagem visual e o posicionamento destes eventos – agregando, assim, mais valor para o público final.
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Festivais também têm uma característica agregadora, reunindo pessoas diferentes em torno de uma paixão compartilhada. Eles desarmam e sensibilizam o público, criando uma atmosfera de união difícil de ser igualada. Isso inspira um senso de comunidade cuja importância se torna ainda maior neste momento, seja pelo período que passamos isolados, seja pela onda de polarização e fratura social que alcança diversos países, inclusive o Brasil.
Alguns festivais também cumprem papel importante na conscientização e engajamento do público em torno de causas socioambientais importantes e promovem ações que beneficiam diretamente as comunidades nas quais estão inseridos.
O backstage invisível
Existe um grande grupo de profissionais do backstage – produtores, carregadores, roadies, técnicos, seguranças, profissionais de limpeza, etc – que precisam ser quase invisíveis em seu trabalho. Cabe a eles, nos bastidores, longe do glamour e dos holofotes, criar o contexto e dar as condições para que os artistas brilhem, para que a mágica dos festivais aconteça. São dezenas de milhares de empregos gerados pelo setor.
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Sem shows, essa invisibilidade torna-se sua maior desvantagem e, num segmento com significativa presença de freelancers e alta informalidade, o impacto da pandemia foi ainda mais devastador. Foi neste cenário que surgiram projetos como a ONG batizada de Backstage Invisível, uma rede de apoio dedicada aos profissionais do audiovisual – muitos dos quais, da noite para o dia, ficaram impossibilitados de exercer seu ofício. Hoje é evidente que relações de trabalho e estruturas organizacionais precisam ser revistas e aperfeiçoadas, assim como a legislação que rege o setor.
O lado positivo deste período de crise foi o fortalecimento da representatividade do setor de eventos a partir da união em torno de associações como Abrafesta, ABRAPE e Apresenta, cujo papel ganha relevância na interlocução entre os players do mercado e o poder público. Com uma voz mais unificada, alinhamento em torno de pautas comuns e o apoio necessário, não tenho dúvidas de que os festivais marcarão uma nova era na retomada.
*Mauricio Soares é sócio-fundador da ARCA.
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