Nesta quinta-feira (29), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) publicou uma medida provisória que alterou a vigência da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Antes prevista para 14 de agosto, a MP alterou o prazo será para o dia 3 de maio de 2021. Para especialistas no assunto, a MP pode causar insegurança jurídica, podendo ainda ser agravado já nas próximas semanas. Isso porque a Câmara dos Deputados poderá votar um projeto de lei que também altera a vigência da norma para 1 de fevereiro do ano que vem.
A OPINIÃO DOS SETORES DA ECONOMIA SOBRE A MP
O QUE DIZEM ALGUNS DEPUTADOS QUE VÃO DISCUTIR A MP?
A medida provisória, de número 959, foi publicada em uma edição extraordinária do Diário Oficial da União. À primeira vista, o texto parecia indicar apenas criação de uma norma sobre outro tema, que é estabelecer a operacionalização do pagamento do benefício emergencial de preservação do emprego e renda e do benefício emergencial mensal.
No entanto, foi em um único e isolado artigo que aparece a mudança da LGPD. O Consumerista e a Consumidor Moderno ouviu os maiores juristas no assunto.
Prazo: um ponto de atenção
Danilo Doneda, advogado, representante da Câmara dos Deputados na Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e coautor do texto que deu origem a Lei Geral de Proteção de Dados, fez duras críticas à mudança e afirmou que a MP criou um cenário de incertezas jurídicas. É o caso do início da vigência da lei.
Doneda explica que a MP tem validade de 60 dias e, em tese, poderá ser prorrogada por mais 60 dias. Passado esse prazo, ela perde a sua validade – e esse é o ponto de atenção.
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) precisa da chancela do legislativo para mudar o caráter provisório da medida. A MP perderá a sua validade em agosto, justamente o mês previsto para a LGPD entrar em vigor. Então, caso a medida não seja validada, o prazo anterior, dia 14 de agosto, entra em vigor automaticamente.
“Ocorre que se a MP não for convalidada, não for convertida em lei, dentro e até 120 dias, a MP perdeu seus efeitos e fica valendo o prazo anterior, o dia 14 de agosto”, explica Doneda.
Fabrício da Mota Alves, advogado e representante do Senado Federal na ANPD, destacou outro ponto de atenção para o governo com a MP. Agora, mais do que nunca, o governo depende do Congresso para manter sua intenção de postergar a vigência da LGPD para além de agosto deste ano. Se isso não ocorrer, o governo não poderá editar uma nova medida provisória sobre o mesmo tema por um ano.
“Caso a MP seja rejeitada (pelo Congresso), ele (Bolsonaro) não poderá reeditar outra MP com o mesmo tema este ano. A Constituição Federal veda. Então, é um risco que deve ser calculado, o que eu imagino, tenha sido calculado pelo governo. Nesse cenário, a única mudança seria aprovar o projeto de lei 1179/2020”, explica.
PL em regime de urgência
De fato, neste momento, o ponto de equilíbrio do debate está justamente no projeto de lei 1179/2020. O PL citado por Mota Alves é de autoria do senador Antônio Anastasia (PSDB-MG) e estabeleceu mudanças jurídicas excepcionais durante o combate ao novo coronavírus. Uma das medidas foi justamente a mudança da LGPD para 1 de janeiro de 2021.
Ocorre que o PL é a única proposta em um estágio avançado de discussão no Congresso – se não o único. Até por esse motivo, a Câmara já se movimenta para aprovar justamente o projeto em discussão de Anastasia.
Nesta quinta (30), deputados de diversos espectros políticos assinaram um documento onde pedem urgência justamente na aprovação do projeto de Lei 1.179/2020 seja votado no plenário da Casa. São eles:
Enrico Misasi (PV/SP) – Líder do partido
Arthur Lira (PP/AL) – Líder do bloco conhecido como “centrão”
Diego Andrade (PSD/MG)
Carlos Sampaio (PSDB/SP) – Líder do partido
André Figueiredo (PDT/CE) – Líder do partido
Perpétua Almeida (PCdoB/AC) – Líder do partido
Leo Morais (Pode/RO) – Líder do partido
Joice Hasselman (PSL/SP) – Líder do partido
Desarmonia entre os poderes
Em tese, a medida pode ser votada a qualquer momento, aumentando ainda mais a instabilidade jurídica sobre o início da LGPD. Para Patrícia Peck, advogada especialista em Direito Digital, a Medida Provisória acrescenta à discussão da lei de proteção de dados, que já tem de lidar com a divisão entre os parlamentares, uma explícita desarmonia entre os poderes Executivo e Legislativo.
“Devido ao contexto político atual, há uma desarmonia de diálogo entre o Executivo e o Legislativo, o que tem provocado demoras na votação de pautas. Desse modo, o PL 1.179, que contou com o apoio inclusive do Supremo Tribunal Federal, passou o mês todo tramitando na Câmara sem que fosse aprovado”, afirmou Peck em nota ao Consumerista.
Com o requerimento de urgência protocolado por líderes dos partidos, ela acredita que a votação do PL na Câmara deve sair ainda no mês de maio. Caso seja aprovado, ele entra em vigor e a LGPD passa a valer em 1º de janeiro. Se forem determinadas emendas, o texto volta para o Senado.