O que te faria preferir subir os degraus de uma escada normal, ao invés de se deixar levar por uma escala rolante? O que te faria economizar todo mês, pensando na sua aposentadoria amanhã? Talvez seja difícil pensar em motivações suficientes que direcionem as nossas escolhas para opções que exijam certo esforço.
No entanto, existem profissionais que, não apenas entendem o motivo pelo qual resistimos em mudar as escolhas que normalmente fazemos sem pensar, como desenvolvem medidas para estimular mudanças que favoreçam toda a sociedade. São os Arquitetos de Escolha, profissionais dedicados a entenderem como escolhemos para, então, criar novos estímulos que nos leve a melhores decisões. Richard Thaler1, atual Prêmio Nobel em economia é o criador do termo Arquitetura de Escolha (ou nudging), conceito definido como: “proposta para organizar o ambiente que os seres humanos interagem para melhorar suas decisões.” 2
Thaler vem desenvolvendo importantes pesquisas científicas na área da economia comportamental para sua aplicação em Políticas Públicas mais eficientes, com mais benefícios para as pessoas, ao orientarem suas escolhas. Como a decisão por praticar mais exercício (ao estimular o uso da escada, ao invés do elevador ou da escada rolante), ou por poupar mais (ao estimular o aporte mensal, abrindo mão de parte do capital a curto prazo), ou por doar seus órgãos (ao mudar a política de adesão ao programa). Estes são apenas alguns exemplos de medidas bem sucedidas já colocadas em prática, ao intervir de forma positiva no contexto em que as opções são apresentadas e expostas para a escolha.
Voltando à primeira pergunta, exponho agora a mudança de contexto proposta para estimular o uso dos degraus da escada, em detrimento da escolha rolante, em uma estação de metrô na Alemanha. Diante de duas opções – escada normal ou escada rolante, a maioria opta pela segunda, sem muito esforço mental. Para estimular a mudança de comportamento foi alterada a maneira em como a escada era apresentada (contexto). Ao transformar os degraus da escada em teclas de piano, tocadas a cada pisada, 66% das pessoas passaram a adotá-la.
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Esse é um exemplo que demonstra a força dos Nudges na mudança de comportamento das pessoas, ao alterar a forma como as opções são apresentadas. Força essa certamente maior do que sinalizar os benefícios da prática diária de exercício através de um cartaz. A diferença é o foco no contexto, no caso do Nudge, ao invés do foco na cognição, no caso do cartaz. “No século XX, grande parte das iniciativas para influenciar o comportamento das pessoas foram dirigidas à cognição. No entanto, as pesquisas das últimas décadas sobre julgamento e tomada de decisão mostram que o ambiente tem um efeito desproporcional e subestimado sobre nosso comportamento.” 2
Em outro exemplo, Dan Ariely, outro ilustre economista comportamental, aponta a importância dos Nudges no Programa de Doação de Órgãos. No gráfico, vemos o percentual de motoristas doadores de órgãos de cada país.
Estranhamente, países como Dinamarca e Alemanha, normalmente com performances positivas nas mais diferentes análises, aparecem com baixos percentuais de motoristas doadores. Em contrapartida, países como Hungria e Polônia, menos acostumados ao brilho, detém total domínio nesse quesito.
A explicação consiste em algo realmente muito simples, e reside na política de adesão ao programa. Ou seja, está na maneira em como as opções são expostas. Os países com menores taxas de doadores utilizam a política opt-in, que isenta a todos da obrigação de doar, a não ser que o interessado mude essa condição pré-definida. Esse modelo exige um esforço que, normalmente, supera a vontade.
Por isso, o índice reduzido de doadores, porque naturalmente as pessoas não questionam as opções pré-definidas. Simplesmente as aceitamos, mesmo que o nosso argumento defenda o contrário (enquanto escrevo essas linhas me dou conta que faço parte dessa estatística: quero que meus órgãos úteis sejam doados, mas não fiz nada para deixar isso claro). E o inverso acontece em países com percentuais altos de motoristas doadores, ao entenderam a força do viés do status quo (tendência em manter as escolhas já estabelecidas) sobre nós. Estes países mudaram o sistema de escolha para opt-out, no qual a opção default estabelece que todos sejam doadores, a não ser que se faça algum esforço para mudar (e marcar que não quer ser doador). Como somos previsíveis e não mudamos o que nos é pré-estabelecido, a maioria passa a ser doador, portanto.
Mas, os Nudges não existem somente para resolver questões de Políticas Públicas. Eles podem estar presentes em nosso dia a dia, favorecendo a nossa memória (os alarmes que programamos como lembretes), nossa conta bancária (ao definir um valor limite no cartão de crédito), nossa saúde (usar mais a escada ao invés do elevador), ou nossa aposentadoria (mecanismo de débito automático da folha de pagamento para outra conta, estimulando a poupança de longo prazo), e assim por diante.
Ao observar como fazemos nossas escolhas, e entender que nem sempre decidimos aquilo que nos favorece, abre-se uma grande oportunidade para que estímulos, ou Nudges, sejam pensados para nós mesmos. Ao entender como sucumbimos em escolhas previsíveis (pelos limites cognitivos, vieses, rotinas e hábitos na tomada de decisão individual ou social), podemos criar os nossos próprios Nudges, que nos previna daquelas decisões que não trazem os melhores resultados para as nossas vidas, ou que nos estimule a escolhas que realmente nos favoreçam.
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Graziela Di Giorgi é sócia da Wake Insights, diretora Brasil da SCOPEN, autora do livro O Efeito Iguana, professora do IED e da ESPM e mentora do Programa InovAtiva Brasil
1 Professor emérito de Ciência Comportamental e Economia, e diretor do Centro para Pesquisas sobre Decisões da Escola de Pós-Graduação em Negócios da Universidade de Chicago. Co-autor do livro Nudge: o empurrão para a escolha certa
2 Trecho do livro Happiness by Design: Finding Pleasure and Purpose in Everyday Life, de Paul Dolan