Cada um acredita no que quer, não é? É essa a aposta feita pelo sistema democrático. O fato, porém, é que para o bem ou para o mal o dia de hoje é histórico. O Senado Federal aprovou o afastamento da presidente Dilma Rousseff. Esse processo pode resultar no impeachment definitivo da presidente ou, se não houver 54 votos na segunda votação da Câmara Alta, simplesmente em um sabático.
Esse cenário é um resultado de uma crise econômica que começou há algum tempo – composta por diversos fatores, entre os quais está a inadimplência. Não à toa, esse foi um dos principais temas discutidos por Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos.
Para apresentar o contexto a ser discutido, a especialista apresenta números que apontam o aumento da inadimplência do crédito livre para pessoa jurídica e dos pedidos de recuperação pelas empresas. “Em 2014, comecei a olhar para a inadimplência”, diz. “Precisamos entender por que chegamos a esse quadro e a essa crise, senão não poderemos olhar para a frente”, comenta.
Sofrimento geral
“Dados de Pessoa Jurídica mostram tendências de alta na inadimplência de crédito livre. São números preocupantes e, aparentemente, esse ciclo não se completou”, afirma. A partir de dados do Banco Central (BC), Zeina aponta ainda que a situação das Pequenas e Médias Empresas (PMEs) é muito mais grave. “As grandes empresas estão conseguindo encontrar soluções para suas dividas, ao contrário das PMEs”, explica.
Quando olhamos para os dados de pessoas físicas, o cenário também é difícil. Como explica a economista-chefe, o consumidor parece não ter problemas com as instituições bancárias, mas os gastos cresceram em desacordo com a renda. Ou seja, na prática, a vida está mais difícil.
O maior dos problemas
Mas, afinal, qual é a origem de todos os problemas? Para Zeina, “a mãe de todas as crises é a crise fiscal”. Nesse sentido, ela aponta que fazer política fiscal “não é para quem quer, é para quem pode” e, em uma situação limite, pode causar desestabilização.
“Poderíamos ter percebido problemas quando a inflação começou a subir. Mas a equipe econômica ignorou esse dado. Fazendo isso, agiu como um médico que ignora a febre persistente de um paciente”. Nesse sentido, ela argumenta que agenda hoje é, sem dúvidas, a questão fiscal. “Não há espaço para aumento de imposto, não há espaço para aumento de boca de caixa. Para realizar alguma mudança real, é preciso fazer reformas”, fiz.
Cortes fundamentais
Zeina toca em uma questão delicada, porém fundamental para o país. “É necessário reduzir a despesa obrigatória do orçamento – principalmente a previdência”, diz. “Errar na gestão da política econômica fez com que piorasse a situação. Ficamos com todo o ônus do ajuste iniciado no governo Dilma, porque ele foi incompleto. E perdemos o grau de investimento também por isso”.
De acordo com a especialista, o primeiro setor ao qual é necessário estar atento – pois é o primeiro a dar alertas de crises – é a indústria, que possui carga tributária elevada e depende de mão de obra qualificada. “A produção industrial do Brasil acompanhava o mundo, mas agora cai mais do que o dos outros países”, diz. E questiona, para a plateia: “Parece que a crise não é mundial, não é?”
Enfim, o Brasil
Seria impossível falar sobre tantos números e não citar os problemas do Brasil. Como comenta Zeina, “as empresas brasileiras já começaram a demitir até mesmo o funcionário que faz falta”. Prova disso é que o desemprego chegou à pior situação desde o início da série histórica do Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). O PIB, por sua vez, apresenta a pior queda desde 1930. “Para melhorar esse cenário, vamos ter que abrir mão de alguns benefícios, isenções, etc. Há políticas públicas demais protegendo alguns setores” conclui.