Em um momento de instabilidade econômica e sanitária desencadeado pela pandemia de Covid-19, o reajuste anual dos planos de saúde empresariais – cujo percentual não é regulado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) – tem colocado o poder público e empresas em lados opostos e tem o tirado o sono do maior interessado no assunto: o consumidor.
Beneficiários e entidades que defendem os consumidores relatam reajustes altíssimos, sendo que alguns poderiam chegar a quase 50%. Não à toa, há especialistas que alertam para o risco de uma judicialização nos planos de saúde para tratar exclusivamente desse reajuste e que desembarcaria nos Juizados Especiais Cíveis (JEC), também conhecidos pelo apelido de “Tribunais do Consumidor”.
Na tentativa de resolver o assunto, o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), órgão do Ministério da Justiça, tomou uma decisão mais firme: vai notificar às operadoras para que expliquem os reajustes dos preços. Empresas não engoliram muito bem o “ataque” do departamento.
Termo de Ajustamento de Conduta
De acordo com o DPDC, o objetivo da empreitada do órgão é que os planos de saúde assinem um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para encerrar as possíveis distorções que levaram consumidores mais vulneráveis, sem capacidade de negociação, a enfrentarem aumentos superiores aos grandes contratos.
O alvo do departamento são, além dos reajustes aplicados em 2020, os cerca de 20 milhões de contratos cujo aumento foi suspenso no ano passado e que, agora, serão reajustados não só com o acréscimo do novo valor, mas também com a recomposição do que deixou de ser cobrado.
“Vamos entrar para contrabalançar essa assimetria. O ideal seria firmamos um TAC que impedisse aumentos excessivos aos mais vulneráveis. Os planos de saúde estão em débito com o consumidor, é horrível falar, mas lucraram com a pandemia”, afirmou Pedro Queiroz, diretor do DPDC.
A Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge), porém, vê a medida como um movimento de intervenção do governo.
“Há uma pressão por intervenção do Estado, e não só na saúde, veja o caso do combustível. Pode ser difícil, neste momento, vislumbrar o efeito da intervenção nos planos de saúde, mas interviram na energia e faltou luz; interviram no combustível e temos uma petroleira endividada. Os efeitos no futuro serão negativos, desestruturar uma rede de saúde, um setor que emprega seis milhões de pessoas”, disse Marcos Novais, superintendente executivo da Abramge, ao Globo.
O diretor do DPDC nega. Segundo ele, o intuito é negociar os valores “por quem não tem essa possibilidade”.
Defensoria Pública da União (DPU) também busca acordo
Paralelamente ao embate entre DPDC e planos de saúde, há um movimento da Defensoria Pública da União (DPU) que já solicitou à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) a suspensão do reajuste de 2020, do pagamento da recomposição do valor suspenso no passado e do aumento de 2021 até que seja analisado qual o percentual necessário para manter a sustentabilidade do setor. A ANS ainda não respondeu à solicitação.
Segundo a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), há dois milhões de ações sobre reajustes de plano de saúde tramitando no Judiciário. Entre as que questionam o aumento estão o senador Randolfo Rodrigues (Rede/PE) e Procon Pernambuco. Ambos já ingressaram com ações civis públicas na Justiça.
Em nota, a Agência Nacional de Saúde disse que acompanha os impactos da pandemia e lembrou que em janeiro foi registrado o maior número de beneficiários para o mês desde 2017: 47,7 milhões.
A agência diz, ainda, que busca proteger o consumidor, além de preservar o equilíbrio e a sustentabilidade da saúde suplementar, e citou citou como medidas de alívio financeiro a suspensão dos reajustes, de setembro a dezembro de 2020, e o parcelamento dos valores devidos em 12 vezes.
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