“Nada Sobre Nós, Sem Nós!” é o conhecido e poderoso lema do movimento global das pessoas com deficiência. Ele surgiu como um grito de resistência e empoderamento, exigindo que as pessoas com deficiência participem ativamente das decisões que as afetam diretamente.
Embora sua origem exata seja debatida, os primeiros registros escritos da frase datam do início da década de 80, no contexto do Ano Internacional das Pessoas Deficientes (sic), provavelmente a partir de artigo escrito pelo “duplo” ativista sul-africano (em relação ao apartheid e à deficiência) William Rowland.
Já, no começo dos anos 90, o norte-americano James Charlton lançou o livro homônimo, divulgando definitivamente um conceito que já vinha sendo utilizado há anos, mas ainda não fazia parte do letramento das pessoas com deficiência.
De lá para cá, a frase emblemática foi conquistando corações e mentes, artigos e livros foram escritos sobre o tema e, cada vez mais, ao longo dos anos, o que era um statement virou o mote do movimento político das pessoas com deficiência em todo o mundo, ilustrando suas demandas por participação plena nas questões relativas aos seus direitos.
Sua adoção ganhou ainda mais força a partir de 2006, pela visibilidade mundial que obteve ao ser elevado a lema da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Nesse contexto, a mensagem se consolidou como símbolo de luta e inclusão.
Como tudo é passível de críticas e novas ideias, em algum lugar do passado não muito distante, nossa frase inclusiva recebeu questionamentos quanto à sua semântica! Por que não algo mais afirmativo, como “Tudo Sobre Nós, Conosco”, ou algo nessa linha? A proposta até que faz certo sentido, mas não obteve a atenção e o respaldo necessários para uma mudança da frase original.
Contudo, recentemente, em conversas com a amiga e militante Eliane Lemos e com o empático brother Rodrigo Credidio, ao refletirmos sobre seu significado, percebemos que, embora poderosa, a frase já não traduz completamente o cenário atual. Contemporaneamente, o mundo vem discutindo e valorizando cada vez mais a diversidade em todos os seus aspectos, não apenas no que diz respeito às pessoas com deficiência.
A diversidade humana é ampla, incluindo grupos historicamente marginalizados, como mulheres, pessoas negras, indígenas, LGBTQIA+, entre outros. Ou seja, para construirmos uma sociedade inclusiva de fato, precisamos ampliar a participação social e garantir que todas as vozes sejam ouvidas.
Nesse contexto, a frase “Nada Sobre Nós, Sem Todos Nós” surge como uma evolução do lema original. Ela não só reafirma a importância da participação das pessoas com deficiência, como, também, estende essa demanda de inclusão para todos os grupos da sociedade. A inclusão verdadeira só acontece quando todas as partes interessadas estão envolvidas na construção de soluções e políticas públicas. As lutas por igualdade, seja de pessoas com deficiência, de minorias raciais ou de outras populações minorizadas, estão intrinsecamente interligadas.
Ampliar o lema para “Nada Sobre Nós, Sem Todos Nós” reconhece a interseccionalidade dos movimentos e a necessidade de ações coletivas para enfrentar o capacitismo e preconceitos estruturais que existem há séculos.
Portanto, hoje, mais do que nunca, reforçando o lema histórico, acrescentar “Todos” representa esse desafiador ideal contemporâneo, onde a diversidade é respeitada e todos os grupos são parte da construção de uma sociedade mais justa, plural e inclusiva.
Nada Sobre Nós, Sem Todos Nós!
Cid Torquato é advogado e CEO do ICOM. Foi Secretário Municipal da Pessoa com Deficiência de São Paulo entre 2017 e 2021 e Secretário Adjunto de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência entre 2008 e 2016. É autor do livro “Empreendedorismo sem Fronteiras – Um Excelente Caminho para Pessoas com Deficiência”.