O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sancionou a lei de combate ao superendividamento dos consumidores nesta sexta-feira (2). O texto, resultado de um projeto de lei aprovado por deputados e senadores, recebeu alguns vetos e foi publicado na edição de hoje do Diário Oficial da União. A norma altera o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Idoso. O texto dá mais transparência aos contratos de empréstimos e tenta impedir condutas consideradas abusivas.
Regras
De acordo com a lei, o superendividamento é a impossibilidade de o consumidor pagar a totalidade de suas dívidas de consumo sem comprometer seu mínimo existencial.
Entre as causas do superendividamento estão operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada. Dívidas contraídas por fraude, má-fé, celebradas propositalmente com a intenção de não pagamento ou relativas a bens e serviços de luxo não são contempladas na lei.
Pelo texto, os contratos de crédito e de venda a prazo devem informar os dados envolvidos na negociação como taxa efetiva de juros, total de encargos e montante das prestações.
Com o novo regramento, empresas ou instituições que oferecerem crédito também ficam proibidas de assediar ou pressionar o consumidor para contratá-la, inclusive por telefone, e principalmente se o consumidor for idoso, analfabeto ou vulnerável ou se a contratação envolver prêmio. Elas também não podem ocultar ou dificultar a compreensão sobre os riscos da contratação do crédito ou da venda a prazo.
Outra proibição diz respeito à indicação de que a operação de crédito pode ser concluída sem consulta a serviços de proteção ao crédito ou sem avaliação da situação financeira do consumidor.
Vetos
No entanto, a lei não foi aprovada em sua totalidade. Bolsonaro vetou alguns pontos, dentre eles o que estabelece que, nos contratos de crédito consignado, a soma das parcelas reservadas para o pagamento das dívidas não poderia ultrapassar 30% da remuneração mensal do consumidor. O mesmo dispositivo estabelecia ainda que esse valor poderia ainda ser acrescido em 5%, destinado exclusivamente à amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito ou a saque por meio de cartão de crédito.
“A propositura contrariaria interesse público ao restringir de forma geral a 30% o limite da margem de crédito já anteriormente definida pela Lei nº 14.131, de 30 de março de 2021, que estabeleceu o percentual máximo de consignação em 45%, dos quais 5% seriam destinados exclusivamente para amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito ou de utilização com finalidade de saque por meio do cartão de crédito”, argumenta a justificativa do veto.
O texto aprovado pelo Congresso proibia ainda o uso de expressões como “crédito sem juros”, “gratuito”, “sem acréscimos”, “com taxa zero” e semelhantes nas ofertas de crédito. No entanto o trecho foi vetado pelo presidente.
Também foi vetado o dispositivo que tornava nulas as cláusulas de contratos sobre fornecimento de produtos ou serviços baseados em leis estrangeiras que limitassem o poder do Código de Defesa do Consumidor (CDC) brasileiro.
Repercussão
De uma maneira geral, as entidades viram pontos positivos na sanção presidencial da lei do superendividamento. No entanto, entidades como o Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC) fizeram críticas aos vetos.
“A aprovação é uma vitória, sem dúvida. Com os vetos, há pontos que ficam muito superficiais na defesa do consumidor, em especial, para os idosos. Mas, existe a possibilidade de derrubada dos vetos ou lutarmos por uma legislação específica do crédito consignado. De toda forma, nosso trabalho continua, na busca por mais proteção contra os abusos na oferta de consignado, e pela concretização do CDC (Código de Defesa do Consumidor) na proteção dos superendividados”, afirma Ione Amorim, economista e coordenadora do programa financeiro do Idec.
Os vetos apresentados nesta quinta ainda podem ser derrubados pelo Congresso. O veto presidencial deve ser apreciado dentro do prazo de 30 dias por uma sessão conjunta de deputados e senadores, que podem manter ou derrubar.
A entidade que representa as empresas que administram os cadastros negativo e positivo também celebraram a medida. Em nota, a Associação Nacional dos Bureaus de Crédito (ANBC) afirmou que a lei é um marco para tratar o superendividamento, que, hoje conta com 63 milhões de inadimplentes no país – ou consumidores com pelo menos uma conta ou dívida em aberto.
A mesma entidade ainda citou os dados do Banco Central sobre o endividamento das famílias, que passou de 49,4%, em março de 2020, para 57,7% em fevereiro de 2021 – aumento de 8,3 pontos percentuais.
“O crédito é um importante instrumento econômico pelo qual as famílias antecipam o consumo, as empresas investem na produção futura e a economia se expande. Mas há um limite acima do qual esse instrumento deixa de ser saudável e pode desencadear, além de consequências individuais, até mesmo crises econômicas”, observa Elias Sfeir, presidente da ANBC.
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