Esta é a terceira de uma série de cinco reportagens sobre Millennials. Clique aqui para ver todos os capítulos publicados
Professor da Harvard Business School, Thales Teixeira criou a teoria do “efeito de desacoplar”. Segundo ele, as empresas de tecnologia estão mudando a forma de consumo, pois elas quebram as conexões anteriormente vistas no mercado. O automóvel é um grande exemplo. Se antes era necessário comprar um carro para poder utilizá-lo, agora há aplicativos que servem para cada tipo de consumo.
Caso a pessoa precise do carro por algumas horas, existem programas como o Zipcar. Já se ela prefere que alguém a leve de um ponto para o outro, pode baixar o Uber. De repente, se necessitar de uma carona mais longa, como uma viagem intermunicipal, há a opção do BlaBlaCar. Ou seja, as montadoras deixaram de ser o único local possível para se conseguir um carro.
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Não à toa, as empresas que estão mudando o mercado não estão criando produtos novos, mas novas maneiras de consumir. Das cinco empresas novatas mais valiosas do mundo, atualmente, apenas a chinesa Xiaomi, voltada para aparelhos como smartphones, produz ativos físicos.
As restantes (WeWork, de espaços de trabalho compartilhados, Airbnb, de apartamentos compartilhados, Uber e Didi Chuxing, ambas de transporte privado) são todas voltadas para serviços.
O segredo é a simplicidade
A facilidade de acesso a esses serviços está entre os fatores de sucesso dessas companhias, especialmente entre os Millennials. Tudo o que precisamos está, literalmente, na palma da nossa mão. Para Felipe Mendes, CEO da GfK, empresa de estudos de mercado, no entanto, o preço é um dos componentes fundamentais para haver uma quebra de paradigma.
“Os Millennials não usam essas ferramentas apenas porque são modernas”, diz ele. “Essa economia colaborativa existe porque é econômica.”
Da mesma forma que o preço final é um fator preponderante para a escolha, os Millennials também são socialmente responsáveis na hora de consumir determinado produto ou serviço.
De acordo com o estudo do Instituto Ipsos, 75% dos jovens brasileiros dão preferência a marcas ou grifes que impactam positivamente a sociedade, o que coloca o País na oitava posição do ranking – Indonésia e Peru lideram, com 86% e 85%, respectivamente.
Mais do que nunca, essa posição evidencia a importância de um compromisso social das corporações. Quem não o fizer, ficará para trás.
Quem se lembra das Vovloggers?
O comportamento dos Millennials também vem influenciando marcas e campanhas. O Itaú Unibanco, por exemplo, uniu as “Vovloggers” Lília e Neuza, duas senhoras interessadas no digital e a YouTuber Kéfera para falar sobre os aplicativos do banco. Para desenvolver a campanha, a agência Africa fez diversas pesquisas com usuários.
E percebeu que, em vez de focar as funcionalidades do aplicativo, valeria mais a pena investir na autoconfiança da pessoas para utilizá-lo.
“O digital está na pauta do banco há bastante tempo e precisávamos reforçar a liderança do Itaú nesse assunto”, diz Marina Pires, diretora-geral de planejamento da Africa.
Marina defende que a representação do público sênior na publicidade não seja mais feita de maneira caricata.
“É importante dar destaque para essa população e enxergá-la como cultural, social e economicamente ativa. Promover o encontro e a troca entre gerações é uma maneira de diluir uma das polarizações tão frequentes hoje em dia”, diz ela.
Diante de pessoas que querem ser olhadas nos olhos e reconhecidas em seus lugares no mundo, as agências sabem que não dá mais para usar mensagens genéricas. O que vale é a verdade.
“Hoje, a tecnologia nos ajuda muito no trabalho de segmentação de mensagem e canais. Mas acredito que a discussão seja muito mais profunda. Os principais desafios têm a ver com realmente pensar no outro como alguém diferente de mim e ver (muito) valor nisso”, diz Marina.
Novos produtos e serviços
Há tempos, a Mastercard vem se empenhando em facilitar a vida do usuário. No ano passado, começou a colocar em prática um projeto que permite o uso dos próprios cartões de crédito ou débito na hora de pagar uma passagem de ônibus ou metrô. O sistema poderia eliminar a necessidade de produtos como o Bilhete Único, em São Paulo, e o RioCard, no Rio de Janeiro.
“Os Millennials querem fazer essas atividades cotidianas de maneira cada vez mais rápida e segura”, diz Vanessa Gordilho, diretora de Varejo da Mastercard. “Um dos nossos próximos serviços será um sistema de autenticação de pagamentos por meio de selfies”.
Porém, segundo o CIP e a MindMiners, alguns desejos de consumo permanecem mesmo com a evolução tecnológica e dos tempos. Para 75,5% dos entrevistados, ter um carro na garagem ainda é muito importante ou importante.
Em outra pesquisa, realizada pela agência de publicidade Talent Marcel, 20% dos jovens da Classe C tem como o maior sonho ter uma casa própria.
Em segundo, empatado com a possibilidade de pagar uma faculdade, está a compra de um carro, com 14%. Os Millennials de famílias mais abastadas seguem uma tendência parecida. Os anseios de uma casa (17%) e um carro (13%) só estão atrás de realizar viagens (18%).
Uma questão cultural
Os Millennials também estão buscando empresas em que consigam levar uma vida leve e saudável. E o estilo de vida deles está transformando até mesmo a rotina de alguns executivos. Presidente do programa de fidelidade Multiplus, Roberto Medeiros sempre foi acostumado com o dia a dia de grandes multinacionais.
Antes de comandar a operação da Multiplus, o executivo de 59 anos passou por operadoras como a Telecom Italia, dona da TIM, Telefônica e Rede, especializada em cartões.
Desde dezembro de 2013, ele passou a dar expediente diário na Multiplus. Quer dizer, quase diário. A empresa adotou um modelo de trabalho muito solicitado pelos Millennials, baseado na flexibilidade.
Dois dias por semana, os funcionários estão liberados para realizar suas tarefas de casa, o famoso home office. Ele achou estranho no início, mas logo se adaptou.
A companhia também tem a prática de horários flexíveis para que os empregados não fiquem presos no caótico trânsito de São Paulo.
O próprio Medeiros costuma deixar a sua sala às 16h30 para finalizar as suas demandas de casa. Antes, porém, passa em uma quadra de squash, onde joga por uma hora. Alguns jogos, inclusive, ele disputa contra o seu filho Guilherme, de 22 anos.
“Percebo que essa geração coloca qualidade de vida à frente da questão financeira”, afirma Medeiros. “Esse pensamento acabou beneficiando até a minha saúde”.
A maioria Millennial
Algo similar acontece nos corredores da seguradora BB e Mapfre. A força de trabalho da empresa é formada por 47% da Geração Y e outros 16% da Geração Z. Apesar de quase um terço da companhia ser formado por jovens, a BB e Mapfre estimula um troca de conhecimentos entre as diferentes idades. Prova disso é o programa chamado de “Mentoring Reverso”.
Segundo Luis Gutiérrez, presidente da empresa para as áreas de Auto, Seguros Gerais e Affinities, essa iniciativa fomenta que jovens talentos levem conhecimento e informações para profissionais mais velhos. Logo, quando há essa troca, novas soluções são criadas pelas mãos de diversas gerações.
“Considero os Millennials uma geração que busca ir além do que já foi alcançado”, afirma Gutiérrez. “É a geração do inconformismo, mas sempre baseada na busca de um propósito.”
Todos esses pensamentos são compartilhados pela americana Amelie Karam, consultora especializada em Millennials. Nos últimos anos, Karam, representante da Geração Y, vem se dedicando ao estudo e ao entendimento do que move os jovens.
A questão de ter uma vida além do trabalho é uma realidade, de acordo com ela. “Nós queremos fazer parte da comunidade em que vivemos e também ajudar a companhia em que trabalhamos a ter bons resultados”, diz a especialista americana. “Mesmo com esses objetivos, precisamos ter um equilíbrio entre a vida profissional e a pessoal”.