Esta é a primeira de uma série de cinco reportagens sobre Millennials. Veja todos os capítulos publicados
Com 30 anos de idade recém-completados, o mineiro Tallis Gomes, fundador da Easy Taxi, ostenta uma situação que causaria inveja em muitas pessoas, sejam elas jovens, sejam mais experientes. Caso quisesse, Gomes poderia deixar o trabalho de lado e viver apenas de renda.
“Demoraria três vidas no mercado corporativo para conseguir juntar o dinheiro que tenho hoje”, afirma Gomes, eleito pelo MIT Technology Review uns dos jovens mais inovadores do mundo. Desde que começou na jornada de empresário, ele conseguiu captar mais de US$ 90 milhões em investimentos nas suas startups.
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Isso, no entanto, está longe de ser o objetivo de vida do empresário. Em vez de ficar no sofá assistindo à Netflix e vendo o dinheiro se multiplicar, ele decidiu criar a Singu, uma espécie de “Uber da beleza”. E não pense que parou por aí. A próxima aposta é o lançamento do seu primeiro livro, no qual trará dicas de empreendedorismo.
“Somos uma geração extremamente hedonista e em busca de resolver os problemas da sociedade”, diz o Millennial. “E também queremos ser reconhecidos. Somos a ‘geração tapinha nas costas’”.
Exemplos como o de Gomes evidenciam como os Millennials, jovens nascidos entre 1985 e 1999, estão mudando toda a sistemática do mercado. Mais do que nunca, os profissionais experientes precisam entrar no ritmo da Geração Y, conhecida por sua agilidade e avessa a burocracias. Ao mesmo tempo, estamos falando de jovens rotulados como mimados e difíceis de lidar com críticas.
Mas, convenhamos, estereótipos precisam ser quebrados e os verdadeiros desejos e aspirações dessa geração entendidos. É o que propõe a segunda edição do estudo “Jovens Digitais: Geração Transformadora”, realizado pela especialista em pesquisa digital MindMiners em parceria com o Centro de Inteligência Padrão – CIP.
Os jovens ouvidos
Com mil respondentes, o estudo levantou dados a respeito das expectativas dos Millennials em diferentes vertentes. Quais são as visões deles a respeito do trabalho? Como eles estão se comportando diante da primeira crise econômica de sua vida? Como eles consomem? Ser desprendidos do sentimento de posse ou ativos, como carros, ainda faz parte do desejo deles?
Head de marketing da MindMiners, Danielle Almeida destaca o compromisso dos Millennials quanto aos valores e à vontade de fazer a diferença no ambiente em que vivem.
“Eles têm níveis educacionais altos em relação a outras gerações e buscam empresas com valores para deixar uma marca no mundo”, diz Danielle. “Em vez de estabilidade, eles buscam experiências que os tornem melhores cidadãos”.
Porém, na mesma medida em que os Millennials têm um nível de educação superior em comparação aos seus pais e avós, a desigualdade no Brasil ainda mostra que o acesso às universidades ainda é um privilégio. “O nível de escolaridade ainda não é uma variável homogênea quando analisado por meio dos diferentes níveis sociais”, diz Aline Tobal, gerente-executiva de inteligência estratégica do CIP.
Na Classe A, por exemplo, 32% dos jovens terminaram a faculdade e 16,5% ultrapassaram a barreira da pós-graduação. Na C-2, o índice é o oposto. Apenas 5% conseguiu o diploma universitário e mínimos 0,6% possuem o certificado de uma pós ou MBA.
Pior: o índice de desistência daqueles que estão estagnados no ensino médio completo é muito alto. Dos jovens entrevistados nessa situação, 44,1% disseram que não estavam estudando atualmente.
A crise atrapalha planejamento
Caso você seja um Millennial, com certeza não se lembrará de outra crise econômica tão grave como a atual. Por conta de problemas como hiperinflação e gastos desenfreados durante os governos militares, o Brasil chegou a ter cinco moedas diferentes durante o período entre 1986 e 1994, até finalmente chegar ao Real.
Todo esse tempo para colocar a economia de volta aos trilhos. Tais problemas calejaram, e muito, as gerações anteriores, como a X e a Baby Boomer.
Após 1994, um período de crescimento e estabilidade (com diversas crises menores durante o caminho, como é de praxe no Brasil) se instalou. Em maior ou menor grau, esse movimento de subida ocorreu até o fim de 2014. A partir daí rombo fiscal, inflação de dois dígitos, desemprego e PIB em queda passaram a fazer parte da rotina da Geração Y.
Como mostra o estudo da MindMiners com o CIP, o percentual de jovens desempregados ou que nunca trabalharam chega a 39% dos entrevistados. Os empregados de carteira assinada somam apenas 30%, mostrando que o trabalho informal e o empreendedorismo também têm sido uma saída para não ficar sem fonte de renda.
Dependência dos pais
Mesmo buscando outras alternativas de ganhos, a dependência dos pais continua em alta entre os Millennials. Segundo a pesquisa, 43,5% deles ainda vivem com os pais, dependendo do financiamento deles para os gastos básicos.
Quando analisados os jovens que vivem sozinhos ou com os cônjuges, o percentual de dependência também é alto: 50% e 18,6%, respectivamente. “Conseguimos ver que as pessoas não conseguem assumir todas as contas”, diz Danielle, da MindMiners.
É o caso da publicitária Luana Carvalho, de 26 anos. Apesar de sempre ter trabalhado, a principal provedora da casa continua sendo a sua mãe, que paga todas as contas da casa, incluindo as de supermercado. As despesas pessoais, no entanto, são bancadas pela própria Luana (como você vê na página ao lado).
Essa falta de independência pode ser um traço de uma geração estereotipada como mimada? Não é essa opinião que compartilha Renato Mendes, sócio da aceleradora Organica. Para ele, rótulos como esse não ajudam na compreensão dos Millennials.
Pelo contrário. Mendes ainda completa que, com o passar do tempo, toda vez que há uma quebra de geração ocorre uma defesa nostálgica por parte dos mais velhos. “Ser Millennial não é simplesmente ter nascido em determinado ano”, afirma ele. “Podemos considerar um estado de espírito e o dom de mudar comportamentos.”
Conectada em todos os momentos
A publicitária Luana Carvalho, de 26 anos, se considera uma pessoa conectada 25 horas por dia, sem exageros. Chegou a essa conclusão após realizar um teste no site Buzzfeed e ficou preocupada. O resultado mostrou que ela, de fato, é dependente das redes sociais e do smartphone. Mas, para ela, tem uma explicação.
O fato de trabalhar diretamente com redes sociais há quatro anos e também de tentar a sorte como influenciadora digital faz com que ela tenha uma necessidade de olhar o celular e o computador em todos os momentos. “A primeira coisa que faço quando acordo é pegar o celular”, diz Luana.
A crise econômica, no entanto, mudou um pouco o seu pensamento. Se antes ela prezava quase que exclusivamente por trabalhos que a fizessem feliz, hoje ela quer segurança.
“Fica difícil trabalhar em um lugar e não saber se ele vai durar seis meses ou mais”, diz ela, que foi empregada em uma agência de publicidade que faliu. Apesar de trabalhar atualmente em uma companhia terceirizada que presta serviços ao Facebook, ela não desistiu da meta de ser uma blogueira de sucesso. Mesmo que, para isso, tenha de tirar dinheiro do próprio bolso.