Não é de hoje que o Brasil tem a reputação de apresentar um histórico de altos índices de inadimplência. Em abril deste ano, por exemplo, havia mais de 73 milhões de brasileiros nesta situação, um aumento de 0,72% em relação ao mês anterior. Esses são dados do Mapa da Inadimplência e Negociação de Dívidas no Brasil, divulgado mensalmente pelo Serasa.
Diversos fatores contribuem para essa situação, de econômicos a sociais, que passam por flutuações na economia, formas de acesso ao crédito no país, desigualdade de renda e até ocorrência de eventos externos, como crises globais. Um problema que não é fácil de explicar, tampouco de resolver.
Neste cenário complexo, é papel, portanto, das políticas públicas atuarem. De maneira abrangente, elas podem promover não só uma maior estabilidade, redes de proteção social eficazes e regulação justa do crédito, mas também trazer ações que ajudem diretamente na diminuição da inadimplência. Nesse sentido, programas governamentais fazem parte desta estratégia.
O Desenrola Brasil é o caso mais recente de programa governamental que busca atuar para reduzir o número de brasileiros inadimplentes. No entanto, não é o único. A seguir, você conhece detalhes desta “joia da coroa” e outras iniciativas.
Desenrola Brasil: renegociação de dívidas de milhões de brasileiros
Lançado em julho de 2023 para combater a crise de inadimplência pós-pandemia de covid-19, o Desenrola Brasil foi um dos maiores programas de renegociação de dívidas recentes do Governo Federal.
Executado em fases, o programa começou com os principais bancos retirando, automaticamente, 10 milhões de registros de dívidas de até R$ 100 dos cadastros de inadimplentes.
Já as negociações foram feitas em duas faixas: a faixa 1 contemplava pessoas com renda de até dois salários mínimos ou inscritas no CadÚnico com as dívidas negativadas entre janeiro de 2019 e dezembro de 2022, que não podiam ultrapassar o valor atualizado de R$ 20 mil cada dívida; por sua vez, a faixa 2 envolveu negociações das dívidas bancárias feitas diretamente pelos bancos credores com pessoas com renda mensal de até R$ 20 mil.
Segundo informações do Ministério da Fazenda, o programa encerrou em maio de 2024 com a redução de 8,7% da inadimplência entre a população mais vulnerável do país, que era seu público prioritário, e tendo beneficiado mais de 15 milhões de pessoas com a negociação de R$ 53,07 bilhões em dívidas.
Além disso, o Desenrola Brasil proporcionou um efeito cascata, uma vez que o volume de negociações de dívidas no período de vigência do programa também aumentou. No Serasa Limpa Nome, por exemplo, houve um aumento de 12,7% do valor negociado em dívidas de julho de 2023 a maio deste ano.
Desenrola Pequenos Negócios
Semelhante ao Desenrola Brasil, o Desenrola Pequenos Negócios é um programa de renegociação de dívidas do Governo Federal, parte do Acredita Brasil, voltado para microempreendedores individuais (MEIs), microempresas e empresas de pequeno porte.
Diferentemente do primeiro, que já encerrou, o prazo para a realização das negociações dentro deste programa é até 31 de dezembro de 2024. Elas devem ser feitas diretamente com os canais de atendimento das instituições financeiras.
O programa oferece condições especiais de renegociação, com descontos que podem chegar a 90%, prazos e juros diferenciados. Não há limite para o valor da dívida ou tempo máximo de atraso.
Os resultados são importantes no combate à inadimplência, afinal, as empresas e microempreendedores que regularizarem sua situação financeira voltam a ter acesso a novas linhas de créditos e outros benefícios necessários para o bom andamento do negócio.
Além do Desenrola: programas e políticas que buscam reduzir a inadimplência
Programas de Regularização Tributária
Uma maneira bastante clássica de incentivar que as pessoas paguem suas dívidas é fornecer a possibilidade de regularizá-las sem a incidência de altos juros. É o caso do Programa de Autorregulação Incentivada de Tributos, da Receita Federal.
A medida oferece condições especiais para regularização de tributos administrados pela Receita Federal através da confissão da dívida. Com o programa, é possível pagar a dívida confessada com redução de até 80% do valor e em diversas parcelas. Alguns débitos que podem ser incluídos na autorregularização são o Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), entre outros.
Instituído no final de 2023 e regulamentado em abril deste ano, o Programa de Autorregulação Incentivada de Tributos tem prazos curtos: os contribuintes podem pedir adesão até 31 de maio para os períodos de apuração ocorridos até 31 de dezembro de 2022 e até 31 de julho para os períodos de apuração do ano de 2023.
No entanto, é válido ressaltar que este tipo de iniciativa acaba sendo replicada em outras esferas, das estaduais a municipais. Um exemplo é o Programa de Regularização Tributária da Prefeitura de São Bernardo do Campo (SP), que ajuda os moradores a quitar suas dívidas com o município por meio de parcelamentos e descontos totais de multa e juros moratórios.
Educação financeira e capacitação
Desde 2010, o Brasil conta com a Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF), que tem como objetivos promover a educação financeira e previdenciária, aumentar a capacidade do cidadão de realizar escolhas conscientes sobre a administração de seus recursos, e contribuir para a eficiência e a solidez do mercado brasileiro.
Com a ENEF, a educação financeira passa a ser, portanto, uma política de Estado. Abrangente, ela envolve instituições públicas e privadas, como escolas, bancos, empresas, etc. Ela instituiu inclusive um Comitê Nacional de Educação Financeira (Conef), responsável por definir planos e coordenar a execução da estratégia.
Além disso, agora já voltado para empreendedores, o Governo Federal trabalha com iniciativas de capacitação financeira e gestão de negócios, o que é uma carta na manga para reduzir a ineficiência e a inadimplência ocasionadas por falta de conhecimento ou planejamento econômico.
O Portal do Empreendedor do Governo Federal, por exemplo, traz diversas funcionalidades e tem uma aba para a Plataforma Capacita, que visa ofertar soluções de assistência técnica e gerencial em parceria com o sistema S, SEBRAE, instituições de educação profissional e tecnológica, universidades e demais ofertantes de soluções de apoio à gestão e ao desenvolvimento técnico empresarial.
Cadastro Positivo
Enquanto o mau pagador teme a negativação do seu nome “na praça”, o Cadastro Positivo chegou para que os bons hábitos de pagamento também valham como pontos positivos ao consumidor. Com a política, o currículo financeiro da pessoa passa a subsidiar decisões de concessão de crédito, realização de venda a prazo e outras transações comerciais que impliquem risco.
O objetivo é incentivar o bom comportamento financeiro e a pontualidade nos pagamentos, uma vez que eles passam a influenciar a concessão de crédito tanto quanto a negativação. Além disso, aumenta as chances de obter ofertas mais personalizadas, com menos juros, e com isso, menos endividamento.