No painel, “O impacto da dosimetria: até que ponto o valor das multas funciona realmente como disciplinador de boas conduta para as empresas?”, o Simpósio Brasileiro de Defesa do Consumidor provocou seus participantes a questionarem a multa como um instrumento realmente efetivo de conciliação nas relações de consumo.
Mediado por Jacques Meir, diretor executivo de Conhecimento, Conteúdo e Comunicação do Grupo Padrão, o especialista se lançou de questões provocativas para elevar o nível do debate. Logo no início questiona: A multa disciplina?
Para José Antonio de Oliveira Júnior, diretor do Procon de Sorocaba, as organizações devem, primeiramente, olhar para a multa como mudança de conduta interna. Partindo dessa afirmação ele responde de maneira capciosa: “As multas mudam o comportamento das organizações?”. Para Oliveira mais importante que retóricas é o “valor educativo” desse instrumento. “Isso deve ser levado internamente para dentro de uma organização”, diz.
Como representante de um órgão de defesa do consumidor, o executivo ressalta que não pode se esquecer do valor fiscalizatório nessa questão. “Posso afirmar que temos duas responsabilidades: dialogar e assegurar direitos. E enquanto órgão não barganhamos responsabilidades na resolução de um problema”, frisa Oliveira. Além disso, ele ressaltou o diálogo como instrumento construtivo. “Estamos aqui, por exemplo, para um debate de amadurecimento dessas relações e fomento do diálogo. No aspecto evolutivo das relações de consumo isso é muito mais valioso para empresas e consumidores do que a multa”, pontuou.
Mas, de que maneira a multa é vista pelas empresas? Essa foi outra pergunta de Meir dando continuidade ao debate. Patricia Cansi, diretora de Serviço ao Cliente do Grupo Pão de Açúcar (GPA), diz que depende de cada organização . “Muitas vezes o valor da multa não vai mobilizar mudanças. Mas, sim, o ato fiscalizatório, que abre um espaço para o dialogo entre empresa e clientes”, avalia. Para Patrícia a “vitimização”, muitas vezes, impede o dialogo e a multa pode piorar ainda mais essa relação entre marca e consumidor.
Imagem arranhada
Analisando os efeitos da aplicação das multas nas organizações, a imagem de uma empresa pode ser severamente prejudicada, principalmente, nos dias atuais. Este ponto, levantado durante o debate, levou Kennedy Noronha, diretor de Relacionamento com Órgãos de Defesa do Consumidor da Oi, a afirmar que muitas vezes este é “o fim da linha para o diálogo”. “Por isso é importante o compromisso de parceria no entendimento de cada caso passível de multas. Lembramos que o valor de marca hoje pertence a empresas quem escutam seu consumidor e que tem um compromisso em dialogar com os órgãos de defesas do consumidor”, diz o executivo.
Kennedy complementa dizendo que ainda podem existir empresas que encaram a multa como parte do seu negócio, no entanto, isso já não se sustenta mais. “Hoje o mercado é muito competitivo e fiscaliza mais do que qualquer instituição. Se você não atender bem seu clientes, por exemplo, facilmente ele buscará outra marca”, diz.
A evolução do modelo punitivo
Buscando a construção de uma análise macro da problemática da multa, Jacques Meir, lança um questionamento final para as novas formas que poderiam conduzir uma evolução desse modelo punitivo nas relações de consumo.
Para Oliveira Júnior, um posicionamento estratégico são compromissos como o próprio Simpósio, que impulsiona a transferência, a lealdade e o debate desses desafios. “Todos os órgãos de defesa do consumidor estão abertos ao diálogo. Temos que lembrar que eventos como este são fundamentais para esse compromisso e o cultivo de práticas edificantes”, frisou. No entanto Oliveira, fez um alerta para a construção de uma agenda efetiva. “Não podemos nos esquecer que estamos discutindo a questão da multa aplicadas em assuntos que fazem parte das relações de consumo dos últimos 30 anos. Precisamos entregar algo concreto para a sociedade. Este é o valor que devemos buscar através do diálogo entre os atores dessa problemática, a evolução”, pontua.
Kennedy, complementa que, além de lealdade e transparência, para garantir essa evolução, converter em benefícios algo visto como doloso também é um novo caminho. “Trazer benefícios para o consumidor hoje é decisório no mundo dos negócios. Está na hora de pensarmos em novos caminhos”, provoca.
Patricia Cansi reforçou a criação de agendas positivas para a análise dessas demandas.“Neste momento, a conscientização dos problemas e antecipação de questões passiveis de multa são tão importantes quanto estratégias para criar novos mecanismos”.
Lealdade, compromisso, diálogo e transparência, pilares para o crescimento sustentável dos negócios, frente ao direito de punir e sua indústria. Aspectos que denotam a importância do Simpósio Brasileiro de Defesa do Consumidor como ferramenta moderna e construtiva para as relações de consumo. Como ressaltou Jacques Meir ao final do debate, “em muitos casos não é a multa que cria melhorias, mas, educação e informação”.