Com o custo de vida em alta, o endividamento no Brasil se estabelece como um problema de grande complexidade, exigindo que os bancos ofereçam soluções mais adaptadas e próximas das realidades vividas por seus clientes. Dados do Serasa mostram que, em outubro, o número de inadimplentes alcançou 73,10 milhões de pessoas, evidenciando as dificuldades econômicas enfrentadas por muitas famílias. Esse número abrange todas as faixas etárias, com destaque para pessoas entre 41 e 60 anos (35,1%) e de 26 a 40 anos (34,0%). Até mesmo os jovens de 18 a 25 anos representam uma parcela significativa, com 11,8%.
Os números ressaltam como o endividamento afeta diferentes perfis, impactando não apenas sua saúde financeira, mas também seu bem-estar. Outro estudo conduzido pelo Serasa mostra que 83% dos entrevistados relataram insônia devido ao endividamento, 74% tiveram problemas de concentração, e 61% experimentaram crises de ansiedade.
Essa realidade exige um papel mais ativo dos bancos, que podem se tornar aliados para quem busca alternativas, como o acesso ao crédito, além da possibilidade de renegociar dívidas para reorganizar as finanças sem perder de vista seus compromissos financeiros. Quando essas opções são oferecidas de forma integrada, com atenção à situação de cada cliente, a gestão e a saúde financeira podem ser reestabelecidas. Nesse contexto, a Inteligência Artificial (IA) tem se mostrado um recurso indispensável.
Um estudo da McKinsey revelou que 72% das empresas globais já adotaram IA, um aumento significativo em relação aos 55% de 2023. No setor bancário, a tecnologia permite que os bancos compreendam melhor o perfil de cada cliente, respeitando sua situação financeira com atendimento personalizado e alinhado às suas necessidades.
No processo de renegociação, a tecnologia permite maior acessibilidade e eficiência em um momento em que o cliente precisa de mais atenção. No Itaú, por exemplo, a evolução da ciência de dados na análise dos modelos comportamentais dos clientes, integrando as informações internas, do mercado e padrões de consumo, permitiu que 55% das renegociações fossem feitas de forma digital e, atualmente, mais de 5 milhões de clientes visitam os canais digitais para renegociar suas dívidas. A digitalização desses serviços democratiza o acesso à renegociação, ampliando as oportunidades para que as pessoas encontrem alternativas de pagamento viáveis e compatíveis com sua situação financeira atual, o que facilita o reequilíbrio das finanças e reduz o risco de novas insolvências.
Recuperar em vez de só cobrar
A inadimplência no Brasil demanda uma abordagem renovada, que vai além de soluções tradicionais e integra tecnologia e educação financeira de forma estratégica. A prioridade deixou de ser a simples “cobrança de crédito”; agora, os bancos estão focados na “recuperação do cliente”, oferecendo suporte educativo que capacita os indivíduos a tomarem decisões financeiras mais informadas e sustentáveis. Por meio de conteúdos instrutivos, alertas de despesas, simuladores e ferramentas de planejamento, as instituições financeiras não apenas incentivam práticas mais conscientes, mas também fornecem aos clientes ferramentas para lidar melhor com imprevistos e equilibrar suas finanças de forma autônoma.
Essa abordagem integrada — que une tecnologia, personalização e orientação financeira — redefine o papel dos bancos, que se tornam parceiros genuínos, oferecendo não apenas um caminho para a regularização de dívidas, mas uma base sólida para que os clientes construam uma saúde financeira duradoura. No entanto, para que essa transformação seja eficaz, não podemos deixar de citar a importância de cultivar uma cultura interna orientada por dados.
Quando os colaboradores têm as ferramentas e o conhecimento para interpretar e aplicar insights de dados, conseguimos elevar o atendimento e a produção de soluções a outro patamar. Assim, em um cenário econômico desafiador, o setor financeiro tem a oportunidade de liderar essa transformação, ajudando os clientes a de fato retomarem o controle de sua vida financeira, com impactos positivos para sua saúde, sua família e para a sociedade como um todo.
*Luciano André Ribeiro é superintendente de Recuperação do Varejo do Itaú Unibanco.