Maio foi um divisor de águas na política brasileira. Dilma Rousseff foi afastada temporariamente da Presidência da República e Michel Temer assumiu interinamente, acenando para os ajustes amargos tão necessários e esperados pelo mercado. Foi evitada uma implosão definitiva da economia, nomes de excelência ocupam cargos essenciais para tirar o País do atoleiro, mas os reveses políticos sofridos pelo presidente interino mostram a fragilidade e a credibilidade duvidosa do atual governo. Foi um mal começo, existem sinais turvos de esperança, mas devagar com o andor que o santo é de barro.
Conforme apurado pelo IBGE, o PIB do primeiro trimestre deste ano recuou 5,4% em relação ao primeiro trimestre de 2015, mas mostrou que o fundo poço foi atingido, com queda menos intensa que a esperada pelos economistas, sobretudo para os dados da indústria. Este foi o primeiro setor a entrar em recessão e tem potencial para ser o primeiro a se recuperar, favorecido pelas exportações. É uma possível injeção de ânimo à atividade econômica, na UTI há meses.
O varejo, no entanto, ainda sofrerá os efeitos drásticos dos ajustes da economia: a taxa de desemprego atingiu 11,2% em abril segundo o IBGE, empresários seguem receosos para investir, a massa salarial segue encolhendo e o crédito continua caro e escasso.
Em recente divulgação, o IBGE mostrou que o volume de vendas do varejo de abril avançou 0,5% em relação a março, mas recuou 6,7% em relação a abril de 2015. Ou seja, notam-se repiques positivos no setor, mas a sua tendência ainda é de retração. Segmentos intensivos em crédito, como Móveis e eletrodomésticos, puxam o desempenho do varejo nacional para baixo, e mesmo o segmento de Tecidos, vestuário e calçados amarga taxas negativas consecutivas para volume de vendas, a despeito de campanhas promocionais.
Um dos maiores entraves ao varejo ainda é a taxa básica de juros, a taxa Selic. É claro que o cenário inflacionário (9,32% em maio no acumulado em 12 meses, segundo o IBGE, acima do dobro da meta) impõe a necessidade de uma Selic a 14,25%, mas entidades varejistas já clamam pela queda da taxa. Enquanto ela permanecer alta, maiores serão os juros cobrados pelos bancos em suas linhas de crédito. Em abril, por exemplo, a taxa de juros cobrada no rotativo do cartão de crédito à pessoa física ficou em 449%, número que faz as dívidas e a inadimplência aumentarem, faz a demanda por crédito esfriar ainda mais e, portanto, o consumo reduzir. Apenas para ilustrar, segundo a FecomercioSP, está em 51% o percentual de famílias endividadas no município de São Paulo. O cenário para a tomada de crédito pelas empresas não é diferente.
Segundo levantamento da Serasa Experian, em abril houve queda de 10,8% na demanda por crédito das empresas do setor de comércio, em comparação a março. Na mesma base de comparação e analisando por porte, o maior recuo da demanda veio das MPEs, de -12%. Além disso, a mesma instituição apontou que, ainda em abril, houve elevação do atraso no pagamento de dívidas de micro e pequenos empreendedores.
Esta conjuntura tão nebulosa deprime a expansão varejista. Segundo a FecomercioSP, o índice que calcula o interesse ou não na expansão dos negócios está em suas mínimas históricas. Independentemente de haver perspectivas de um futuro auspicioso na economia – e os índices de confiança do Comércio e do Consumidor de maio da FGV corroboram um cenário de expectativas melhores, a atual conjuntura segue varrendo empregos (só em 2016, já foram fechadas 200 mil vagas no comércio, segundo o Caged), fechando empresas e só aumenta a sangria do varejo.
Não é o momento, pois, para o varejo se endividar nem apostar em estratégias inovadoras que comprometam suas receitas e margens. Grandes players até podem ousar (e ainda assim se comprometer), mas a maioria dos varejistas não tem condições de se financiar junto ao mercado de capitais e dependem unicamente das receitas de vendas, deprimidas por razões já apontadas. Austeridade ainda é palavra de ordem.
A recuperação sustentável do varejo dependerá de reformas fundamentadas na boa vontade política. Inflação e juros cairão apenas se o endividamento público for controlado e reduzido – e a dívida pública é um campo de batalha política especialmente complexo. A depender de Brasília, o impeachment terá sido apenas um episódio da série de horrores da política brasileira. Há esperança de recuperação na economia, mas as barreiras a serem ultrapassadas são políticas e, por isso mesmo, desafiadoras.
Eduardo Bueno, economista do Centro de Inteligência Padrão – CIP