A Black Friday se consolidou como uma das datas comerciais mais relevantes do calendário brasileiro. A promessa de grandes descontos atrai milhões de consumidores e movimenta de forma intensa o setor varejista, especialmente o e-commerce. No entanto, o aumento expressivo nas vendas também traz desafios jurídicos relevantes, com destaque para o volume de reclamações registradas junto a órgãos como Procons e Conar.
Entre os motivos mais comuns dessas reclamações, estão atrasos na entrega, cancelamentos por suposta falta de estoque, divergências de preços (como a prática conhecida como “metade do dobro”), descumprimento de oferta e ausência de sinalização clara em publicidades feitas por influenciadores digitais. Muitas dessas queixas são consideradas procedentes, diante das normas do Código de Defesa do Consumidor, que exige o cumprimento da oferta e impõe responsabilidade objetiva ao fornecedor.
Nos ambientes digitais, a atuação de marketplaces e plataformas intermediadoras também traz complexidades adicionais. Mesmo quando a venda é realizada por um lojista terceiro, a jurisprudência tem admitido a responsabilização solidária da plataforma, especialmente se ela participa ativamente da operação, seja processando pagamentos, mediando comunicações ou impondo regras comerciais. A esse cenário soma-se o Marco Civil da Internet, que exige transparência e impõe deveres de guarda e cooperação com autoridades, reforçando a importância da conformidade legal nas intermediações digitais.
O uso de influenciadores também tem sido fonte constante de discussões regulatórias. A publicidade feita por criadores de conteúdo precisa estar claramente identificada, sob pena de ser considerada dissimulada. O Conar já aplicou sanções em campanhas de grandes marcas em que essa sinalização não foi respeitada, e os Procons têm seguido na mesma linha, adotando medidas administrativas diante de omissões semelhantes.
Diante disso, é fundamental que as empresas adotem uma postura preventiva. Revisar peças publicitárias com apoio jurídico, manter registro dos preços praticados antes da Black Friday, preparar canais de atendimento eficientes e estruturar bem os fluxos logísticos são medidas essenciais para reduzir riscos. Também é importante lembrar que práticas como aumentar preços artificialmente antes da data promocional para simular descontos podem ser enquadradas como vantagem manifestamente excessiva, conforme o artigo 39, inciso V, do CDC.
Além disso, o Código Civil prevê, no artigo 157, a possibilidade de revisão contratual por lesão, quando há aproveitamento da necessidade ou inexperiência de uma das partes para obtenção de vantagem desproporcional. Embora o contexto promocional não se encaixe automaticamente nessa hipótese, a interpretação judicial pode evoluir para considerar certos abusos, especialmente em cenários de alta sensibilidade como a Black Friday.
A data representa, portanto, uma grande oportunidade comercial, mas também um momento de exposição reputacional. O varejo que investe em governança, boas práticas de compliance e comunicação transparente tende não apenas a evitar litígios, mas também a fortalecer sua relação com o consumidor e se diferenciar em um mercado cada vez mais competitivo.
*Mariana Motta de Ferreira Lima é sócia do Serur Advogados.





