O Reino Unido deu início aos primeiros testes de uma tecnologia (ainda sem nome) controversa e que permitirá, entre outras coisas, que a polícia e os serviços de inteligência do país rastreiem e armazenem todos os dados de navegação na internet de todos os cidadãos do país para os mais variados fins – inclusive sem um motivo plausível. Para alguns, a iniciativa seria a mais poderosa ferramenta de vigilância entre as democracias ocidentais e, por conta disso, poderia afrontar desde as liberdades civis até a privacidade de dados.
A iniciativa do governo de Downing Street tem como base uma lei aprovada em 2016. Os testes estão sendo conduzidos sob sigilo em dois servidores de internet: The Home Ofice e The National Crime Agency. Se bem sucedido, a coleta dessas informações poderá ser implantada em todo o país.
O que ele faz
Em linhas gerais, o governo britânico poderia rastrear, capturar e armazenar todo o tipo de navegação na web – o que incluiria até mesmo os aplicativos. Embora não tenha uma manifestação oficial do governo britânico, o objetivo seria aumentar a eficiência na captura de criminosos e terroristas. Por outro lado, segundo a imprensa britânica, o sistema permitiria vigiar todos os cidadão, mesmo aqueles não investigados pelas autoridades públicas.
Os testes foram iniciados sem qualquer anúncio público. Por ora, o que se sabe sobre o assunto foi revelado pela imprensa do país a partir de processos judiciais que questionam os testes desse sistema. Nas ações, a Agência Nacional do Crime, que lidera o projeto, alega que não há previsão para a implementação da tecnologia.
Lei dos fofoqueiros
A tecnologia, como já mencionado, tem como uma base uma lei de 2016. Por lá, a norma até já ganhou um apelido: Snooper’s Charter (ou o que os britânicos chamam de lei dos fofoqueiros).
Segundo essa lei, o poder público pode exigir que empresas de internet e telefonia armazenem históricos de navegação por 12 meses. O governo também poderia pedir esses dados.
O pedido somente pode ser feito por meio de uma ordem judicial assinada por um juiz sênior. O primeiro pedido à justiça aconteceu em julho de 2019, quando o sistema de monitoramento começou a ser testado no mundo real, de acordo com informações presentes em um relatório recente do Investigatory Powers Commissioner.
Um segundo pedido, feito a outro provedor de Internet como parte do mesmo teste, ocorreu em outubro de 2019. Esses dois processos tem alimentado o noticiário nacional sobre o assunto.
Segundo um porta-voz do Investigatory Powers Commissioner’s Office, o julgamento está em andamento e, caso seja validado pelo tribunal, será tomada uma decisão para que seja expandido nacionalmente.
Críticas
Tanto a lei quanto o sistema de vigilância tem sido alvo de críticas de ativistas e até celebridades do mundo da web.
Um deles é Edward Snowden, o ex-funcionário da Agência de Segurança Nacional (NSA) e uma das mais conhecidas fontes de vazamento de dados do site Wikileaks. Segundo ele, são poderes “que superam os de muitas autocracias”. “A Grã-Bretanha legaliza o sistema de vigilância mais extremo da história da democracia ocidental”, afirma.
Além disso, organizações de liberdades civis pedem maior transparência sobre os testes. “Levar vários anos para chegar a um teste básico, sugere que o sistema não era a melhor opção na época, e certamente não é agora”, diz Heather Burns, gerente de políticas do Open Rights Group, uma organização de privacidade e liberdade na Internet sediada no Reino Unido.