Será que existem apenas boas intenções nas relações de consumo? Será que, em algum momento, empresas ou pessoas agem para prejudicar o outro ou para se beneficiar, propositalmente? Oficialmente, quem age dessa forma age “de má-fé”. O termo é bastante difundido. Mas, e a prática?
A questão das atitudes de má-fé foi abordada na manhã do segundo dia do Simpósio Brasileiro de Defesa do Consumidor. E, logo no início, foi citado justamente que o consumidor pode, sim, obter diversos ganhos a partir da Justiça, em uma relação com alguma empresa. Contudo, isso não é um padrão: pessoas querem soluções e, diante da dificuldade em obtê-las, podem recorrer à justiça – e isso pode, sim, resultar em perdas para as empresas.
Flávio Citro Vieira de Mello, juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), porém, afirma que existem alternativas que podem ajudar as relações de consumo, impedindo que elas cheguem a esse ponto. “Acreditamos que consumidor.gov.br pode mudar a historia do consumo porque, quando ele se coloca a disposição de trocar e dialogar com o fornecedor, tem a possibilidade de resolver o problema”, afirma. Diante disso, ele argumenta que, evitando problemas longos e complexos, todos ganham. “Porém, se em uma ação judicial ele mostra que nenhuma das instâncias anteriores não funcionou, há um dano moral pela angustia sentida”, diz.
Claudia Pires Wharton, diretora de Ouvidoria do Grupo BB e Mapfre, concorda que existe sempre o desejo de resolver problemas. Porém, argumenta que não é justo que a empresa faça mais do que foi contratado pelo cliente. “Mas, as empresas têm, sim, o desejo de resolver, principalmente porque entende que o cliente é essencial – sem cliente não há empresa”, diz.
Porém, quando um caso vai para a Justiça, a empresa tenta entender por onde ele passou, dentro da empresa, e por que chegou a esse ponto. “Eu tenho a missão de não fazer o cliente ir para a esfera judicial”, afirma. “Usamos como lição de casa essas questões para minimizar a judicialização”, conta. E empresa, então, questiona onde está a falha, onde pode melhorar, o que precisa fazer para, em uma próxima ocasião, evitar problemas.
Sophia Martini Vial, diretora-executiva do Procon Municipal de Porto Alegre, nesse sentido, destaca a questão da confiança nas relações. Esse aspecto é essencial e não pode deixar de existir. “O consumidor não é mais aquele que era dez anos atrás”, diz. “Hoje ele não quer ligar para o Call Center, quer fazer uma reclamação em qualquer lugar”, aponta. E, para ela, essa condição é bastante justa, uma vez que, diante de um problema de consumo, o cliente está em uma situação de quebra de confiança. “A confiança é o que lubrifica as relações. E não é possível agir sem ela”, defende Jacques Meir, diretor-executivo de Conhecimento do Grupo Padrão.
Celso Tonet, diretor de Atendimento e Operações de Call Center da Claro Brasil, porém, fala sobre a falta de amadurecimento do mercado, uma vez que o setor de telecomunicações evoluiu muito em termos de demanda e de concorrência, precisando se adaptar a um contexto cada vez mais complexo, ao mesmo tempo em que o consumidor mudava e o poder de consumo também. Apesar disso, como argumenta Cesar Noll, gerente-geral de SAC do Banco do Brasil, existe a percepção de que há apenas um pequeno grupo de clientes que tentam aproveitar oportunidades para tirar proveito de alguma coisa, ou de alguma empresa. “O cliente de maneira geral não opta por esses golpes”, afirma.
Existe confiança?
Questionados por Meir, os painelistas confirmaram que existe, sim, confiança nas relações – senão, elas não existiriam. “Uma empresa que cativa o cliente sempre terá o carinho dele”, afirma Sophia. Mello, por sua vez, comenta que a conversa entre o órgão e as empresas é real e constante, o que demonstra uma parceria.
“Nós tentamos ajudar as empresas na instância do Procon e, quando as companhias se mostram disponíveis, resgatam a confiança do consumidor”, afirma Sophia. “Por isso, nós ajudamos – e confiamos, especialmente quando isso acontece”, diz.