Nos últimos cinco anos, a Anatel vem atuando no combate ao telemarketing abusivo, com o objetivo de proteger o consumidor e evitar que ele seja incomodado em seu espaço privado com ofertas e ligações indesejadas. Esse enfrentamento foi intensificado este ano, com a obrigatoriedade do prefixo 0303, que permite que o consumidor identifique as ligações de telemarketing e decida se quer ou não atender a chamada. A Anatel entende que, desde junho, quando o código se tornou obrigatório, a medida está cumprindo seu propósito e que teve impacto imediato no empoderamento do consumidor.
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Apesar do grande destaque em cima da discussão do prefixo, muito questionado pelo setor de telecomunicações, essa medida é apenas uma de um pacote de normas que a Anatel vem publicando na intenção de fechar o cerco em relação aos abusos praticados historicamente no telemarketing. Este ano, a Agência implementou medidas de bloqueio às chamadas feitas por robôs e também determinou a cobrança das chamadas de zero a três segundos, que antes eram gratuitas.
Nesse mesmo caminho, na última quarta-feira (19/10), a Agência Nacional de Telecomunicações publicou em Diário Oficial novas medidas. Por determinação da Anatel, fica mantido, até pelo menos abril de 2023, o entendimento de que o uso de soluções tecnológicas para o disparo massivo de chamadas que não chegam a ser completadas ou que são encerradas em até 3 segundos é considerado abusivo.
Com esse entendimento, a Anatel resolveu bloquear as linhas telefônicas das empresas que gerem 100 mil chamadas curtas por código de acesso em um dia e também aquelas em que a quantidade de chamadas deste tipo representem 85% ou mais do total de ligações efetuadas. Essas empresas deverão ser identificadas e bloqueadas pelas prestadoras de serviço de comunicação por 15 dias, a partir do dia 3 de novembro.
As operadoras também ficarão responsáveis por comunicar à Anatel o ocorrido, notificar a empresa infratora do bloqueio e impedir que novos recursos de numeração sejam disponibilizados para esses usuários. O desbloqueio só será realizado com a assinatura de um termo de compromisso. A multa pelo descumprimento pode chegar a R$ 50 milhões de reais e ser aplicada também às operadoras.
No Despacho publicado esta semana foi anunciado ainda que a Anatel irá divulgar mensalmente o nome das empresas que mais “perturbam” os consumidores com a prática do telemarketing abusivo. Além disso, as operadoras terão de criar, nos próximos 60 dias, um portal público unificado para que o consumidor consulte a empresa titular do número que está fazendo as ligações inoportunas. A ideia é dar mais transparência para o setor.
Resultados até agora
Desde junho, quando as medidas mais rigorosas em relação ao telemarketing abusivo começaram a ser aplicadas, até o dia 8 de outubro, a Anatel identificou uma forte redução na realização de chamadas curtas. Segundo a Agência, o registro de chamadas de até 3 segundos caiu de 3,8 bilhões para 2,8 bilhões por semana. Isso quer dizer que 16,3 bilhões de chamadas curtas deixaram de ser realizadas. A Anatel também informou que, durante o período, 282 usuários foram bloqueados.
Para Luã Cruz, pesquisador do Programa de Telecomunicações do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), o conjunto de mudanças que vem sendo estabelecido pela Anatel é importante principalmente pelo seu simbolismo. De acordo com o pesquisador, as medidas anunciadas este ano são um divisor de águas em relação à postura da Anatel no combate ao telemarketing abusivo.
“Ficou claro que a lista do não perturbe não foi suficiente. Além de não funcionar, a iniciativa jogou o ônus no colo dos consumidores. Já os limites colocados esse ano em relação ao excesso de chamadas curtas, o fim da gratuidade dessas chamadas e implementação do prefixo, mostram que a Anatel está fechando o cerco e está atuando para redução dessa prática”, analisou o especialista.
Luã disse ainda, em entrevista à Consumidor Moderno, que nem o Idec e nem os demais órgãos de defesa do consumidor acreditam que as normas publicadas recentemente vão acabar com o telemarketing abusivo, o que, segundo ele, seria o ideal. Para o Idec, a grande “bala de prata” nesse sentido é que esse tipo de ligação aconteça com consentimento prévio e específico do consumidor.
“O telemarketing abusivo viola o sossego e a intimidade das pessoas, sem contar que deixa dados pessoais vulneráveis. Existe um mercado paralelo que se aproveita dessa prática para a oferta de serviços e propaganda publicitária. Também tem muito interesse comercial e a resistência vem daí. Mas nós estamos lutando para que tenhamos uma regulamentação própria do setor e contribuindo para tornar esse combate cada vez mais eficaz. Precisamos mexer no modelo de negócio que existe hoje”, afirmou Luã Cruz.
Medidas cautelares podem se tornar definitivas
O pesquisador do Idec explicou que uma das preocupações dos órgãos de defesa do consumidor é o caráter cautelar das medidas publicadas recentemente pela Anatel. Isso faz delas medidas temporárias, muito vinculadas a uma questão do Conselho Diretor. A validade da maioria das normas que vem avançando no combate ao telemarketing abusivo é abril de 2023. Como será a partir de então?
Luã Cruz afirmou que o Idec vem trabalhando para que essas medidas se tornem definitivas, ou seja, passem a fazer parte da regulamentação do setor. Segundo o pesquisador, um novo Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (RGC) está sendo debatido na Anatel, já em fase de finalização, e deve ser publicado em breve. A expectativa é que as medidas cautelares implementadas até agora possam ser incluídas no RGC e se tornem medidas perenes.
“A gente participou das consultas públicas e o documento já está em fase final, em vias de ser publicado. Temos ainda a esperança que a Anatel vá além e inclua a questão do consentimento específico e obrigatório para acabar de vez com o telemarketing abusivo. Seria uma espécie de não perturbe ao contrário. O consumidor vai avisar quando quiser receber tais ligações”, contou o pesquisador do Programa de Telecomunicações do Idec.
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