Passei muitas das noites dos últimos quatro anos em uma faculdade de comunicação. Como meu RG indica (e minhas preferências musicais contestam), faço parte da geração Z. Porém, em muitos, muitos, muitos momentos eu me sinto diferente dos padrões indicados por matérias e pesquisas sobre a minha geração. Mas, é inegável que, principalmente durante a faculdade, descobri muito sobre os meus ?iguais?.
Na faculdade, também, convivi com alguns conceitos e valores que, para alguns, viraram quase religião. O feminismo é um exemplo disso. Depois de algum tempo de curso, alguns temas começaram a ser corriqueiros entre grande parte das moças: machismo, opressão etc.
Também depois de algum tempo, grande parte das feministas começaram a usar termos como ?amigues? ou ?amigxs? para evitar o uso do ?o?. Tenho certeza de que elas conseguiriam explicar esse uso com muito mais propriedade do que eu, mas entendo que essa é uma forma de lutar contra a opressão dos termos masculinos ? afinal, termos que indicam maioria terminam com ?o?, como ?amigos?, ?funcionários?, etc. A mulher, nesses casos, é vista como coadjuvante e, para muitos, essa é também uma forma de opressão.
Foi na faculdade de comunicação que ouvi, também, que a revista Veja não deve ser usada como exemplo de bom jornalismo. Ao contrário, a publicação sempre foi criticada na sala de aula.
Pois bem. Imaginem a minha surpresa quando vi, neste sábado, o título da matéria de capa de Veja: ?Amigues para sempre?. A revista traz uma matéria sobre a sexualidade da geração Z, a forma como os jovens enxergam a questão de gênero, etc. E a reportagem começa justamente comentando sobre o uso do ?x? e do ?e? em substituição ao ?o?.
Ou seja, não somos mais meninas e meninos, mas o que quisermos/pudermos ser. A questão de gênero é bastante complexa e vai muito além do interesse por pessoas de determinado sexo. Para ser compreendida de fato, demanda tempo, paciência e força de vontade. Quem está engajado, naturalmente, se dispõe a compreender o tema de forma plena.
Talvez, a Veja tenha exagerado no alcance do tema. Ainda imagino que a questão de gênero esteja restrita a grupos de humanas e às classes média e alta. Tomara que eu esteja errada, afinal, essa é uma discussão importante.
O Censo de 2010 mostrou que existem quase quatro milhões de mulheres a mais do que homens no Brasil. Porém, cito-as como minoria, pois são oprimidas justamente pelo machismo ? o ?o? no fim das palavras. Apesar disso, é muito bom saber (e a Veja mostra isso em sua reportagem) que a intolerância diminuiu. Apesar de muitas vezes parecer que não, tenho a impressão de que a humanidade está evoluindo.
O único ponto que me preocupa é justamente a transformação das questões das minorias em temas que só tais grupos compreendem. Se as discussões não saírem da caixa, se não forem colocadas em linguagem clara, dificilmente serão compreendidas pela maioria – ou pelos “opressores”, como muitos diriam.
A questão LGBT evoluiu nesse sentido. Um casal homossexual pode andar pelas ruas de São Paulo, por exemplo, com mais liberdade do que podia há poucos anos. A questão de gênero, porém, ainda é ?nova?. Os ?amigues? e os ?amigxs? são novidade para muita gente. E Veja, do meu ponto de vista, deu um passo de sucesso ao tirar esse tema dos nichos e levá-lo ao grande público leitor de uma das principais publicações do Brasil.