Entrar em uma loja e encontrar o produto que se quer, com o preço certo e na hora certa. Parece simples, mas a lógica por trás da experiência envolve uma cadeia de complicadores que pode transformar qualquer jornada de compra um imbróglio para o consumidor. O que redes de varejo consolidadas têm feito, então, para construir um mapa de experiência efetivo e que entregue algo de valor ao cliente? Foi este o tema do primeiro debate do BR Week 2017, o maior congresso de varejo do País, que acontece nesta semana, em São Paulo.
Ao lado de Joe Jackman, o maior reinvencionista de negócios do mundo, Belmiro Gomes, presidente do Assaí Atacadista; e Iuri Miranda, CEO do Burger King no Brasil, falaram sobre o que fazem para conseguirem uma performance acima da média. “As duas redes estão mostrando um crescimento impressionante, em lojas comparáveis, de mais de 10%, no caso do Burger King, e de mais de 40% no ano passado, no caso do Assaí”, comentou Tracy Francis, sócia-sênior da McKinsey, que mediou a conversa.
“Nosso modelo permite redução de custos e com a mudança rápida do perfil de consumo do brasileiro, vimos uma forte migração para o canal. A gente conseguiu captar essa tendência e estamos preparados para crescer a taxas elevadas”, afirmou Gomes a respeito do modelo de atacarejo com o qual o Assaí atua. Esse canal, explica, traz uma alta complexidade quando o assunto é oferecer experiência. “Temos pelo menos quatro perfis de consumidor. Claro que não conseguimos atender a todos os anseios, mas tentamos ser eficazes para darmos o nosso máximo”, afirmou.
O Burger King, por sua vez, aposta na escuta ativa para que a experiência da marca seja condizente às expectativas do consumidor. “Temos de colocar as pessoas certas no mesmo barco. Não temos funcionários, temos colaboradores”, diz. A política de “dono” ajuda. Ele afirma que a remuneração dos gerentes dos restaurantes é um exemplo dessa visão: 70% do valor é variável, baseado no resultado do restaurante. “A gente quer alguém que acredita e que vai ganhar dinheiro quando a gente ganhar dinheiro”, diz.
Além disso, a companhia não abre mão dos dados para entender o consumidor. “Somos uma empresa data driven”, diz. “Sempre pensamos o seguinte: abrimos os restaurantes com zero clientes e temos de nos reinventar todos os dias para atrair esses clientes. Buscamos entender porque um dia uma promoção funciona, por exemplo, e não funciona mais na próxima semana”, diz. A rede saiu de 47 lojas em 2010 para 600 lojas agora. E a expansão não ficou parada com a recessão. “Enxergamos oportunidade com a proposta de valor da marca que vai em direção ao que o consumidor queria. O sol brilha para todo mundo e tem espaço para todo mundo que consiga entender o seu cliente. Veja: nosso mercado é de 200 milhões de pessoas e temos em um negócio em que as pessoas comem três vezes por dia”, explica.
Tendências globais, necessidades locais
Como lidar, então, com as tendências de experiência globais e com as necessidades locais de negócios e consumidores, questiona Tracy. “Como as empresas conseguem lidar com dados disponíveis para renovar, diante de tendências globais e necessidades locais?”. A resposta vem de Joe Jackman, o especialista por trás da reinvenção de redes como Walgreens. “Elas estão conectadas ao consumidor. Cada vez mais, estamos nos tornando especialistas em dados e quanto mais a gente sabe, mais a gente usa a informação para nos dirigir ao consumidor e para criar personalização. Por isso a lealdade é tão importante. A ideia não é vender coisas, mas vender aquilo que é relevante”, afirma o especialista.
“Na McKinsey, costumamos brincar que o canal é o rei e os dados são a rainha”, diz Tracy. Canal é um eterno debate no varejo, ainda mais em tempos de omnichannel. O setor já acordou, contudo, para um importante ponto: o consumidor só enxerga a marca e não o canal. “Só existe uma maneira de se relacionar com o cliente, que é como ele quer”, afirma Gomes. “Fazer tudo e oferecer tudo pode parecer desespero”, completa.
Miranda, do Burger King, afirma que, mais do que canal, é preciso entregar consistência para o consumidor. “É por isso que ainda não atuamos com delivery, porque ainda não encontramos um jeito de entregar com o delivery a mesma experiência que entregamos em uma loja”, afirma o executivo. “Seja qual for o ponto de contato, ele tem de ser bom. Não podemos simplesmente aderir a uma onda. Ofereça, mas mantenha a mesma experiência”, diz.
Nesse sentido, afirma Jackman, ganha quem entregar transparência. “O desejo por transparência é real e vem não apenas dos consumidores, como dentro das empresas. Elas estão cada vez mais abertas”, diz. A cultura interna, da empresa, é base para a entrega de uma experiência efetiva ao cliente, afirmam os executivos. “Nosso sangue é de ketchup”, brinca Miranda. “Nossa cultura não é melhor do que a de ninguém. O pior é quando a empresa não tem cultura alguma”, afirma.
Para Gomes, essa cultura organizacional só chega até o consumidor se ela transcender. “Isso é o mais importante. A cultura transcende as pessoas. O propósito tem de ser claro e se lidera pelo exemplo”, afirma. No fim do dia, afirmam os executivos, o que o varejo precisa para criar uma jornada de experiência para o consumidor é de energia. “A diferença entre o impossível e o possível é o tamanho do seu sonho e a energia que você coloca nele”, disse Miranda.
Confira a cobertura completa do BR Week 2017.