Novas tecnologias causam inquietação e desconfiança nos trabalhadores há décadas. Foi assim desde a intenção da máquina a vapor, que deu início à revolução industrial no século XVIII. A robótica, as ferramentas de automação e a adoção da Inteligência Artificial aumentaram a aflição de trabalhadores até mesmo em atividades que se julgavam imunes aos efeitos da evolução tecnológica. E, nesse caso, falamos de advogados, jornalistas, publicitários, contadores, corretores, operários, estoquistas, caixas e muitas outras ocupações.
Nada disso é segredo ou pode causar alguma surpresa. No entanto, a relação dos trabalhadores com a tecnologia está longe de ser tão previsível e determinada. Um estudo do MIT, em parceria com a Amazon, apresentado no evento “Delivering the Future”, realizado pela empresa de e-Commerce, tecnologia e serviços digitais em Nashville, no Tennessee, mostrou que há nuances e atenuantes na visão e percepção dos colaboradores quando conhecem melhor as aplicações e benefícios das novas tecnologias em sua rotina.
O estudo foi realizado este ano, com mais de 9 mil trabalhadores e empregados de 9 mercados distintos, e mostrou que os trabalhadores reportam benefícios tangíveis das tecnologias de automação, robótica e IA, tais como: segurança e conforto em atividades mais laborais, maior autonomia e condições de resolução de problemas complexos em atividades mais intelectuais.
Ben Armstrong, do Centro de Performance Industrial do MIT apresentou os resultados e insights do estudo, ao lado de Tye Brady, Chief Technologist of Robotics da Amazon. Entre as dimensões pesquisadas estavam segurança, salários, autonomia, possibilidade de promoção, e estabilidade. O estudo também avaliou o quanto incentivos financeiros podem motivar trabalhadores a assimilarem novas tecnologias com menor índice de reatividade. Ao mesmo tempo, evidenciou o potencial de criação de novas atividades para a força laboral.
Existe correlação entre mais tecnologia e trabalho com qualidade?
O recrutamento e a retenção de trabalhadores com habilidades para enquadrar problemas e receptivos às novas tecnologias são essenciais para empresas de múltiplos segmentos. A disputa por pessoal com facilidade e desprendimento para usar e extrair rendimento de novas tecnologias é, por si, um imperativo para organizações que precisam manter e elevar níveis de competitividade na transição para um novo formato de mercado e sociedade direcionado pela vida digital.
Não são poucos os defensores da ideia de que empresas com maior habilidade na adoção de automação e IA têm mais chances de impulsionar a criatividade dos times para gerar inovação, produtividade e flexibilidade para lidar com imprevistos e circunstâncias.
Uma visita ao CD da Amazon, em Juliet, cidade 30 minutos distante de Nashville (onde a empresa recebeu os participantes do evento “Delivering the Future”), evidenciou de modo preciso essa visão. As soluções de robótica e automação trouxeram significativos ganhos de inovação, criatividade e produtividade, com extrema redução do esforço dos colaboradores na unidade. Por exemplo, uma das máquinas de empacotamento de pequenos volumes, originalmente criada para uso do plástico como matéria-prima das embalagens, foi adaptada para uso de um tipo de papel elaborado exclusivamente pela Amazon, com características únicas de resistência, elasticidade e impermeabilidade. A máquina readequada permite adaptar a embalagem para formatos distintos, o que reduziu sensivelmente o tempo de empacotamento, com ganhos visíveis de produtividade e redução de esforço.
Logo, quando o colaborador vê, de forma palpável, o ganho proporcionado pela tecnologia adotada para facilitar sua atividade, ele rapidamente a usa de forma intensa. Curiosamente, Amazon à parte, boa parte dos demais trabalhadores americanos que participaram do estudo se mostraram mais pessimistas com o uso da tecnologia.
Funcionários no CD da Amazon em Cajamar, São Paulo. Foto: Luiza Ferraz
“O que eu posso aprender de bom para mim?”
As empresas devem mostrar o quanto novas tecnologias são capazes de desenvolver o trabalhador pessoal e profissionalmente. O foco apenas na produtividade e no ganho de escala cria ruído e inquietação, francamente, desnecessárias. Nas dimensões avaliadas, o estudo revelou que mais de 85% dos trabalhadores enxergam a adoção de tecnologias como oportunidade de mobilidade profissional, 37,8% como oportunidade de maior autonomia (42% têm uma percepção neutra para esse atributo), e 44,9% têm na tecnologia um fator a mais de segurança (apenas 12,5% discordam).
Assim, automação, IA e robótica são percebidas como força positiva para o trabalho, dentro de uma perspectiva na qual o colaborador faça parte de um projeto de aprendizado, que leva à evolução e ao ganho de maturidade inovadora da empresa como um todo.
Conquistar o engajamento dos colaboradores na transformação digital, então, requer uma adaptação cultural. É fundamental que as empresas se conscientizem de que novas tecnologias não são implementadas sem dor e sem o apoio dos times. Nesse estágio, mostrar os ganhos que os profissionais irão obter na incorporação de IA e automação nas atividades mais estratégicas, desde que bem-alinhadas à otimização de tarefas bem-definidas, trará resultados positivos e consistentes.
Nesse sentido, observar como Amazon consegue expandir negócios a partir do conceito “Build, Test, Scale” (Monte, Teste e Escale, em tradução livre), é um aprendizado valioso. Poucas empresas atualmente conseguem replicar e estender competências para negócios tão diversificados – do marketplace à farmácia, do streaming aos serviços de tecnologia, de concierge digital à logística – quanto a Amazon. E poucas conseguem fazer isso de modo estratégico sem fissuras na cultura e com tamanha desenvoltura no uso de tecnologias para elevar tanto o rendimento dos times quanto a experiência do cliente.
* Jacques Meir viajou a convite da Amazon