Megatrends: do Web Summit para o futuro
- Por Cecília Delgado
- 9 min leitura
Enorme. Este é um adjetivo que define muitos dos aspectos do Web Summit – desde a dimensão física até a relevância para diferentes mercados. Para se ter uma ideia, em 2022, o evento ocupou 21 mil metros quadrados, recebeu mais de 71 mil participantes de 160 países diferentes e contou com 1.050 palestrantes, que se dividiram entre 17 palcos. O Brasil foi a terceira maior delegação do evento – para a surpresa de absolutamente ninguém, já que o País costuma levar grandes grupos para os maiores eventos do mundo.
Diante de tamanha grandeza, surgem as questões: Como determinar quais conteúdos são mais relevantes? De que maneira é possível realmente absorver o que há de fundamental no evento? Ciente desse desafio, o OasisLab, através de curadores especialistas, assumiu a missão de traduzir, para a realidade brasileira, os principais insights do Web Summit 2022. Jacques Meir, diretor-executivo de Conhecimento do Grupo Padrão, esteve entre os curadores de conteúdo e identificou cinco megatendências – tendências de amplo alcance e escala que vão, continuamente, se estabelecer entre os próximos 10, 15 anos.
1. VIDA DIGITAL
A vida digital é hoje um conceito inescapável, no qual o ser humano se insere por meio de multitelas. São elas que vão levar a humanidade a uma existência simultânea ou híbrida, aponta Jacques Meir. “Ficaremos cercados de interfaces e, por meio delas, transitaremos por ambientes digitais e físicos, exercendo uma vida fluida e muito conectiva”, detalha.
A própria vivência do Web Summit permitiu viver essa tendência – não só entre pavilhões e na interação com as pessoas, mas pelas conexões. A percepção, no Web Summit, foi de que a vida digital multitelas pode migrar para um conceito de “multividas”, segundo o OasisLab. Cada vez mais simultaneamente digitais e físicas, híbridas, fluidas e interconectadas, as experiências digitais e físicas serão vistas como experiências de vida. “A posse ou o uso temporário de bens fará tanto sentido na vida ‘real’ quanto dentro de um jogo”, destaca Guga Schifino, head da DX.CO.
O efeito colateral, para o diretor-executivo de Conhecimento do Grupo Padrão, é a formação de coalizões de pessoas e empresas para criar alternativas ao modelo dominante de plataformas que caracterizou a Web2. “A tendência é que, com a consolidação da Web3 e do metaverso, possamos desafiar as big techs. É possível que vejamos muitas unitechs, por causa da existência mais híbrida e da internet baseada em protocolos”, destaca.
2. GERAÇÃO Z
Donos da narrativa contemporânea, capazes de controlar com muita habilidade as formas de linguagem de mídias sociais, a Geração Z já domina um movimento que leva à vida digital – e não é por acaso, afinal, esse público cresceu já com o Google.
O domínio das tecnologias mudou a relação com as pessoas, as marcas, os produtos e os serviços, em um processo muito mais individual e personalizado que na arena coletiva do mundo off-line mas, ao mesmo tempo, com uma necessidade de colaboração e integração – intermediada pelos devices, desde as mídias sociais até os jogos.
Contudo, a enorme pressão psicológica a que todos estão submetidos devido a fatores em simultaneidade – pandemia, inflação, guerra, home office, recessão – tem acelerado a mudança de paradigmas que nasceram e cresceram com a Geração Z. Diante desse cenário, Meir alerta: esta jovem geração está exausta. “É a que mais consome antidepressivos, porque precisa de ajuda química para lidar com a forma como a vida se apresenta pra ela”, explica.
3. A IA CADA VEZ MAIS PRESENTE NA NOSSA VIDA
Todos nós já terceirizamos pequenas decisões para a Inteligência Artificial (IA). A playlist que toca no Spotify e os caminhos seguidos a partir da orientação de aplicativos de deslocamento são alguns reflexos de como a IA pode otimizar e orientar nossas decisões, deixando mais tempo para buscar formas de gerenciar nossa própria vida.
Um questionamento levantado no Web Summit e apontado por Jacques Meir é o limite dessa utilização para a autonomia das pessoas. “Será que as IAs influenciarão o afeto, a alimentação e outras decisões íntimas?”, questiona, enquanto aposta no “eugoritmo”, uma evolução que seja reflexo das identidades pessoais e que procure retratá-las. “É uma das formas de se sentir mais confortável em uma vida que se torna cada vez mais paradoxal”, defende.
4. CRIPTOVERSO
O mundo cripto não é uma moda passageira. Isso é o que apontaram os debates no Web Summit. A fusão do metaverso com a aplicação da lógica de uso dos criptoativos confronta o modelo de negócio contemporâneo e abre espaço para o surgimento de novos paradigmas de valor. Schifino, head da DX.CO, explica que, quando orientada para o consumo digital, essa combinação vai mudar inclusive a cadeia de valor.
O lançamento da Open Metaverse Alliance (OMA3) durante o Web Summit mostra a evolução do setor: as principais empresas desenvolvedoras de plataformas imersivas, como Decentraland e The Sandbox, uniram-se na criação de protocolos de interoperabilidade. A tendência é que, em breve, se torne possível transitar avatares e ativos digitais entre plataformas.
O metaverso é inclusivo, destaca Schifino. “Ele traz mobilidade de uma forma inédita: é sobre se mover, interagir, consumir em outra escala e em mais ambientes, e pode movimentar cerca de US$ 13 trilhões até 2030”, avalia. Thiago Pessoa de Mello, Chief Product Officer & Chief Marketing Officer da Linx | Stone Software, por sua vez, analisa que tecnologias que eram só “hype” passaram a fazer parte do dia a dia, mudando o jeito como as pessoas se comportam.
E, por mais que esta pareça ainda uma realidade um tanto distante, o head da DX.CO garante: o metaverso vai acontecer. Por isso, é elementar abrir mão do preconceito contra essa tecnologia.
Outra reação a isso é a mudança dos valores da empresa como conhecemos hoje, avalia Jacques Meir. “Ela será avaliada de uma maneira diferente nos ambientes digitais. No metaverso, será pelo impacto social e pelo design inclusivo – e bem-sucedido – mais do que pelo valor dos produtos”, diz.
Para que essa realidade se consolide, a internet também vai mudar. A Web3 não é um upgrade da internet atual: é uma nova forma de pensar as conexões em rede, destaca o relatório do OasisLab. A internet como conhecemos hoje é controlada e gerida por grandes players, que ditam as regras – mesmo as tácitas – de consumo e informação. Já a Web3 se baseia em protocolos.
“Uma evolução da internet na qual todos podemos executar ideias”, afirma Schifino. “Uma sociedade gerida mais por protocolos do que por empresas permite um ambiente descentralizado, tokenizado, em que há mais garantias e controle.”
WEB SUMMIT EM NÚMEROS
5. SUSTENTABILIDADE REINVENTADA
Nos dias atuais, é quase impossível falar de negócios, da sociedade e de grandes eventos sem falar em meio ambiente – tema que impacta toda a lógica de negócios. Não por acaso, esse foi um dos temas mais abordados no Web Summit. “Não adianta mais as pessoas cuidarem só delas mesmas: é preciso um planeta com qualidade para viver. É importante, para o desenvolvimento econômico, que o consumo sustentável seja o cerne dos negócios”, afirma Fabiana Estrela, diretora de Treinamento e Desenvolvimento do Grupo Salus.
Dentro dessa perspectiva, há várias diferentes abordagens complementares. O grande objetivo do desenvolvimento de tecnologia é tornar a vida melhor, mas é preciso ter propósito alinhado com as práticas de ESG. E entre elas foi debatido, no Web Summit, como as tecnologias podem contribuir para o monitoramento da pegada de carbono, a reciclagem, o fortalecimento da economia circular – item especialmente caro à Geração Z.
“A importância para a Geração Z está na qualidade de vida, na construção de colaborações e nos engajamentos verdadeiros. A circularidade na moda é um exemplo disso. Das pessoas das novas gerações, 70% preferem produtos de segunda mão. Até 2030, esse mercado vai ultrapassar o fast fashion”, relata Fabiana.
O conceito de sustentabilidade baseado na reciclagem não foi bem entendido ou praticado até agora, concorda Jacques Meir. “É difícil fazer as pessoas se engajarem quando elas não entendem o pensamento de reciclagem, mas entendem o conceito de reuso, mais fácil de ser entendido, replicado e ganhar escala”, defende.
É uma mudança que Guga Schifino define como a transformação no objetivo. “As pessoas compram o porquê das coisas – percebemos dentro do Web Summit como a obsessão pelo propósito é o viés que determina o consumo no mundo, especialmente sob o domínio da Geração Z.”
Por fim, Natalia Royo Sampaio, head de Inteligência de Mercado e do Consumidor da Galunion, comenta: “Vimos muito forte nas startups dentro do Web Summit a tendência automação em toda a cadeia de produção, começando pela agricultura em si para reduzir a pegada de carbono no ambiente, além de várias outras propostas de redução e até negativação de emissões, assim como os esforços para medir e checar impactos.”
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