As habilidades demandadas de um piloto de avião passaram por grandes mudanças ao longo da história da aviação civil. Na Segunda Guerra Mundial, a competência mais valorizada desse profissional era a habilidade psicomotora, uma vez que sua missão era derrubar aeronaves inimigas. Depois do desastre no aeroporto de Tenerife, em 1977 nas Ilhas Canárias, o maior da história com 583 fatalidades, essa percepção mudou.
Na tragédia, duas aeronaves – uma da companhia aérea KLM e outra da Pan Am – colidiram depois de uma intensa neblina e falhas de comunicação entre os pilotos e a torre de controle. Uma vez que os dois aviões estavam próximos um ao outro, utilizavam a mesma frequência de rádio, o que gerou interferências na instrução da torre de controle para decolagem a aeronave da KLM.
Com um fila de aviões esperando a decolagem ocupando a pista de manobra, a nave da KLM resolveu autorização para utilizar a pista de decolagem para fazer a manobra e, assim, voar na direção oposta. No entanto, o comandante não ouviu o comandante da Pan Am alertando que ainda estava na pista. O piloto da KLM tentou decolar, mas ainda não tinha a velocidade necessária e se chocou contra a outra aeronave.
Como aponta Rodrigo Bertacini, consultor da Ventus Solutions e diretor da Humana Seguros, além de piloto de avião, durante o último evento do ano do Ibmec Hubs, foi a partir de então que a indústria a aviação civil começou a estudar os motivos e atitudes que levaram à tragédia. “Hoje, para um piloto se tornar comandante, passa por um treinamento no qual as horas contabilizadas de voo é um critério técnico mínimo”, explica. “Há uma série de provas de soft skills utilizadas para entender a reação do piloto utilizando suas competências”.
O exemplo da aviação civil demonstra de maneira bastante prática como os conhecimentos teóricos e da experiência da vida real são complementares e, mais do que isso, necessários para a realidade do mercado atual. São diferentes indústrias e áreas de atuação que demandam conhecimentos que vão além da sala de aula e dos livros, mas também da vivência prática. Da mesma forma, é a experiência do dia a dia demanda o embasamento teórico que, em muitos casos, faltam aos profissionais.
O Fórum Econômico Mundial divulgou um conjunto de soft skills, ou seja, habilidades comportamentais e emocionais, necessárias para 2020 e que seguem atuais. São competências como pensamento crítico, solução de problemas, comunicação, trabalho em equipe, liderança e curiosidade que formam profissionais e líderes preparados para os desafios de um mundo em constante transformação.
“Hoje temos exemplos de grandes empresas que criar universidades corporativas que estão preocupadas em trazer o conhecimento teórico”, aponta Anizio Paiva, sócio da plataforma fiscal 360. “Mas a maioria das empresas não consegue absorver toda a teoria oferecida pelas academias, e o inverso também é real”.
Prática e teoria
Para Roberta Chammas Salum, Cofundadora e Co-CEO da LiveIn Shop, as organizações ainda estou passando pela transformação de entender as habilidades necessárias de seus profissionais. Tudo aponta para uma mudança na maneira de contratar. “Empresas possuem grande volume de hard skills, mas péssimos soft skills”, afirma. “Ter um grande currículo talvez não seja tão importante quanto horas de experiência”.
Por isso, uma integração entre o mundo acadêmico com o universo corporativo exerce um importante papel em trazer a vida real do trabalho e das empresas para as salas de aula – que não necessariamente ocupam aquele mesmo espaço físico tradicionalmente conhecido. O Ibmec, por exemplo, precisou fechar as portas e transferir as aulas para o modelo remoto a partir do dia 13 de março de 2020 por conta da pandemia da Covid-19, como tantas outras universidades, faculdades e escolas no mundo inteiro.
A partir de então, a instituição de ensino precisou colocar ferramentas tecnológicas de ensino aprendizagem – uma discussão antiga dentro das paredes do Ibmec – em prática. “Acredito hoje que a pandemia foi nosso catalisador”, explica Carla Gonçalves, diretora do Ibmec São Paulo. “Não aposto todas as minhas fichas, mas se não fosse a pandemia, ainda estaríamos relutando em utilizar novos métodos com os nossos alunos – que têm outro paradigma de processo de ensino aprendizagem, que não aprendem como nós aprendemos”.
Fora do ensino superior, a realidade é a mesma. Enquanto empresas precisaram desenvolver suas ferramentas de trabalho e comunicação de forma urgente durante o isolamento social, hoje essa tendência se mantém. Mais do que isso, novos formatos continuam surgindo e exigindo a adaptação das equipes.
A LiveIn Shop é uma dessas empresas que captou as transformações de inovação, tecnologia e formas de aprendizado para criar uma solução de compras por vídeo. Por meio da ferramenta, a marca consegue não só criar conteúdo como ofertar produtos e incluir meios de pagamento para criar um novo canal de venda. “Trata-se de uma forma de comunicação”, aponta Ana Medici, jornalista, apresentadora, cofundadora e co-CEO da LiveIn Shop. “As pessoas não querem só ter o produto, mas também o conteúdo. Por isso o papel importante dos creators: todo mundo consome conteúdo”.
Engajamento é chave
O formato proposto pela LiveIn Shop, além de ser uma tendência guiada pelas redes sociais como TikTok e Instagram, também atende a um desejo dos consumidores de hoje: a interação humana. “Cada vez mais o ser humano precisa do contato com o outro”, explica Ana Medici. “Quando a empresa tem uma ferramenta com interação, ganha uma grande exponencialização. Quem conseguir se conectar com seu cliente de forma fácil e transparente, ganha no mercado”.
No caso do Digital Manager Guru essa também é uma realidade presente. A plataforma de soluções de vendas online opera em quatro países – Brasil, Portugal, França e Espanha – de forma totalmente remota. Somente em novembro, movimentou mais de R$ 250 milhões por meio das vendas realizadas nela.
“Está mudando a forma como fazemos negócios – não só no Brasil, mas no mundo”, explica André Cruz, CEO e confundador do Digital Manager Guru. “Hoje não vemos novas empresas gigantes nascendo, o que é excelente para o mercado como um todo. Temos pequenas empresas com poder de escala enorme. O Guru, por exemplo, é uma empresa 100% remota, com 42 pessoas, e as empresas vão nascer descentralizadas assim. Esse é o futuro”.
No ambiente da educação, a tecnologia pode ser uma ferramenta para gerar não só mais conteúdo, mas formas mais engajantes e funcionais de ensino aprendizagem para os alunos de hoje. Uma vez que o conteúdo pode ser acessado de qualquer lugar, a qualquer momento, o papel das instituições de ensino se transformam. Para Carla Gonçalves, a responsabilidade do Ibmec agora é outra. “Nossa função é a construção de um profissional que consiga desenvolver habilidades criativas dentro da faculdade, com as quais ele exercite e coloque em prática aquilo que pesquisou”, explica. “A partir do momento em que envolvemos os alunos dessas formas, conseguimos proporcionar o exercício do uso de tecnologias diferentes e o sentimento da realização do aprendizado. Isso gera engajamento”.