Os Correios têm sofrido para conseguir manter os preços dos fretes estabilizados desde que a diretoria da estatal resolveu recuperar o caixa da empresa, que segundo ela, estava desfalcado por conta das políticas de subsídio de preços.
Em 2017, os Correios fecharam a operação do e-Sedex por conta dos aumentos sucessivos do custo de entrega. Em 2018, a estatal entrou em litígio judicial com empresas de comércio eletrônico para aumentar o preço do frete e foi impedida pela justiça.
Neste mês, os Correios anunciaram novo aumento. A partir do dia 6 de março, a estatal deve reajustar o valor dos fretes em 8,03%. Os players do e-commerce reclamam pelo fato de o aumento ser superior ao IPCA, que fechou o ano passado com 3,75% de aumento. Os Correios, porém, afirmam que a base de cálculo é o IGP-M, que fechou 2018 com 8,74%, o que colocaria o aumento abaixo da inflação.
Frederico Flores, head da Becommerce, plataforma de e-commerce que pertence ao Mercado Livre, contesta a forma como a estatal compara os aumentos. O executivo da Becommerce afirma que, fretes entre São Paulo e Campinas, por exemplo, que concentram um dos maiores fluxos de mercadoria do País, ficaram 50% mais caros. “Houve uma revisão dos subsídios dos preços dos fretes e algumas cidades foram mais punidas que outras. Teve aumento de fretes em determinadas regiões que chegou a 50%. Então, pode ser que, na média, o valor dos fretes dos Correios tenha aumentado 8%, mas certos fretes aumentaram muito mais do que isso”, avalia.
O executivo destaca a política de subsídio de preços dos Correios como forma de democratizar as entregas por todo o País. Mas afirma que, depois da mudança de política da empresa para restabelecimento de caixa, alguns estados estão absorvendo o custo de frete de outros. “Os Correios sempre tiveram uma política de subsidiar fretes para regiões mais afastados dos centros do País. Com essa nova gestão da estatal, voltada para o lucro e geração de caixa, o que aconteceu é que esse subsídio continuou, mas passou a ser pago pelos outros estados”, destaca Flores.
Flores coloca o frete com um dos dois fatores que mais contribuem para a falta de lucratividade dos e-commerces no Brasil. O primeiro fator é o marketing, ou seja, quanto o e-commerce gasta para trazer o cliente para dentro da plataforma. “Chega a ser 30% do valor do produto. Esse é o grande sangrador, o custo de aquisição”, detalha.
Em seguida, vem o custo do frete e os varejistas on-line têm sofrido para encontrar um equilíbrio entre rentabilidade e número de conversões. “Se você coloca preço de frete mais alto para cobrir gastos, você reduz muito na conversão. E cada visita tem um preço”, ressalta.
Daniel Domeneghetti, CEO da consultoria DOM Strategy Partners, afirma que os Correios têm dificuldade de fazer a transição de seu modelo de negócios para a nova era do comércio eletrônico. Segundo o especialista, a estatal ainda mantém sua operação voltada para a entrega de cartas e não consegue formatar o seu negócio para entrega eficiente de produtos. “O mercado delivery para e-commerce está se ancorando em experiências como do Uber Eats e Rappi. Os Correios estão sendo pressionados, mas não têm velocidade necessária para consertar o modelo de negócios”, afirma.
O consultor reconhece, porém, duas vantagens competitivas essenciais dos Correios sobre as concorrentes privadas, capilaridade para entregar em território nacional e confiabilidade. “Para as privadas, é muito difícil competir com os Correios no um para um. Vemos várias empresas competindo com os Correios em diferentes locais e serviços”, avalia.
Adriano Caetano, vice-presidente de Estratégias da Nuvem Shop, plataforma de e-commerce, lembra que o custo do frete é um problema crônico para o Brasil e que está relacionado a questões variadas, desde risco de assalto a veículos de entrega até infraestrutura viária incompatível com o aumento da demanda.
Caetano afirma que, na média, o frete corresponde a 25% ou 30% do preço do produto para o consumidor final, o que o deixa bem perto do principal custo operacional dos e-commerces, que é o marketing. O executivo não vê solução em curto ou médio prazo para o problema da pressão sobre o preço do frete, mas crê que iniciativas tocadas por startups podem aplacar o problema, com entregas mais rápidas para localidades mais próximas.
Outra solução, essa mais delicada, tem sido apresentada pelos próprios varejistas e marketplaces. “A gente observa algumas estratégias nos marketplaces com os lojistas dividindo custo do frete para aumentar a base de clientes. Eles estão subsidiando. Nos casos de produtos que não são de nicho, a concorrência é muito grande pelo mesmo produto e a redução do preço do frete pode ser uma forma de vencer a concorrência”, avalia.
Peso sobre os pequenos
Os grandes varejistas com operações on-line, de uma forma geral, já conseguem se livrar dos Correios. Quem afirma isso é o presidente da ABComm (Associação Brasileira de Comércio Eletrônico), Maurício Salvador. Segundo ele, alguns dos grandes têm 80% das suas entregas feitas por transportadoras privadas.
O peso do aumento dos fretes dos Correios, segundo o presidente da associação, incide principalmente sobre micro, pequenos e médios e-commerces. “Atualmente, 70% dos produtos vendidos pela internet são entregues pelos Correios, mas quando a gente olha para os micro e pequenos essa dependência é ainda maior, sendo que, em alguns casos, 90% ou mais das entregas são feitas pelos Correios”, diz.
A ABComm está em conflito judicial com os Correios por conta dos aumentos, considerados abusivos pela Associação. Em 2018, a ABComm conseguiu uma liminar que suspendia o ajuste. “Acreditamos que existe a possibilidade de os Correios terem que voltar atrás nesse reajuste abusivo”, avalia o presidente da entidade.