Como o consumidor lida com as empresas nos tempos conectados? Um público que tem na palma da mão a sua maior arma: o smartphone. “A informação é o maior poder do consumidor de hoje. As novas tecnologias e as redes sociais trouxeram o poder de opinar. Se antes era difícil acessar as empresas, hoje é possível não só acessá-las, mas puxar um coro elogioso ou de desagrado e até de difamação”, define Adriana Araujo, jornalista e âncora do Jornal da Record, mediadora do painel “Consumidores que influenciam, inspiram e motivam líderes – a voz das ruas”, do CONAREC 2016.
Atender ao público empoderado demanda agilidade e atenção das empresas – de verdade. Como consumidor, Jorge Pohlamann Nasser, diretor geral do Bradesco Vida e Previdência e do Bradesco Capitalização, fica extremamente irritado quando um atendimento não dá uma resposta verdadeira. “É irritante quando ofendem sua inteligência, quando a negligência surge de processos viciados em sua origem”, aponta.
Pedro Cruz, chief operating officer e chief culture officer da FCB Brasil, dá a solução para as empresas: “A verdade é a única coisa que vai resolver qualquer questão. Como a empresa conta a verdade é que muda a história, a forma como ela passa a informação e gera valor”.
Nesse sentido, Hércules Maimone, sócio da PwC, entende que a simplicidade precisa fazer parte da vida de todos para que boas relações sejam criadas – com as organizações, não é diferente. “Primeiro é preciso ouvir, depois se cria o processo para ter uma resposta reativa, tudo acompanhado de simplicidade”.
Para Fiamma Zarife, diretora de agência do Twitter, a transparência também faz toda a diferença. Quando a empresa não passa todas as informações de forma clara e o cliente acaba lidando com um empecilho por causa disso, todo o processo é contaminado. “Isso causa uma quebra de confiança, não mantém o vínculo com o consumidor”.
A visão das ruas
O painel se propôs a efetivamente trazer a percepção dos consumidores brasileiros para o debate. Assim, algumas entrevistas coletadas pela equipe da Consumidor Moderno deram o tom da conversa entre os executivos. Ao se deparar com um consumidor que pede que as empresas tenham mais tempo para ouvir efetivamente o que o cliente tem a dizer, Flávio Rocha, CEO da Riachuelo, dá o seu parecer: “As empresas muitas vezes ficam presas a sua realidade. É preciso olhar para a necessidade do cliente e focar na solução, não no problema. Ouvir o cliente é a maior fonte de inspiração e inovação para qualquer organização”.
Nasser aponta que se os próprios executivos não usarem os canais da empresa, nunca saberão como realmente está a operação. “Na autogestão existe muito uma cultura de apenas bons resultados, ninguém faz uma apresentação para falar de problemas, você acaba habitando um ambiente onde só chegam boas notícias”, explica. “Eu sempre digo que é preciso ter a humildade de ouvir e a generosidade de ensinar”.
“A capacidade de estabelecer uma relação empática entre as pessoas vai ser fundamental para que o capitalismo sobreviva nos próximos anos”, complementa Cruz. A empatia é um pilar importantíssimo para criar confiança entre as pessoas. É o momento de as empresas saírem do pedestal e ficarem no mesmo nível do cliente, realmente escutando o que ele tem para dizer.
Caito Maia, presidente da Chilli Beans, acredita que as empresas precisam voltar ao básico. “Será que nossas obrigações como empresas mudaram?”, questiona. “O relacionamento com o cliente é um exercício de humildade. A tecnologia nos dá mais ferramentas, mas o básico da relação é o mesmo há 100 anos: precisamos escutar e respeitar os clientes”.
Megafone
A executiva do Twitter lembra que as redes sociais tiraram o atendimento da esfera privada, colocando-o na esfera pública. “Enquanto você está resolvendo o problema de um cliente, pode resolver o problema de vários outros clientes, além de criar a reputação da sua marca enquanto várias pessoas assistem”, pontua.
Rocha conta que uma das primeiras coisas que faz no dia é pesquisar a Riachuelo no Twitter para sentir o termômetro da marca, entender o que os consumidores estão falando sobre a empresa. Um ato alinhado com a era digital: para 82% das pessoas, marcas que possuem CEOs nas redes sociais têm mais confiança dos clientes, lembra Zarife.
Convivência
Nos dias de hoje, a grande maioria dos consumidores faz pesquisas online antes de comprar os produtos na loja física – para a mediadora, a pergunta que fica é: como será a loja do futuro levando essa característica em consideração?
“É preciso entender que os canais são complementares, cada um com seu DNA, e é importante que a marca saiba posicionar cada DNA dos seus canais de forma clara, gerando sempre uma boa experiência”, destaca Maimone. É difícil que um cliente escolha apenas um dos canais. Portanto, eles precisam conviver em harmonia. “As empresas precisam identificar as personas com as quais vão trabalhar e desenvolver o discurso para cada uma delas”.
A presença da loja física gera, inclusive, confiabilidade para o e-commerce, lembra o CEO da Riachuelo. “É comprovado que, em as áreas que possuem lojas do Magazine Luiza, por exemplo, a loja virtual vende três vezes mais”, conta.
Ao mesmo tempo, uma empresa que não tem a capacidade de segmentar a entrega do seu produto não deve comunicar essa ideia. “Não existe mais alternativa de segmentação só no discurso, tem que existir na prática. A segmentação só no discurso não engana mais ninguém porque estamos em um mundo melhor informado, portanto, menos ingênuo e menos disposto a ser enganado. Tem que ser realista”, provoca o executivo da FCB Brasil.
O dilema do atendimento telefônico
A voz das ruas comprova: muitos consumidores “odeiam” e trocam o atendimento por telefone por canais digitais. Alguns até deixam de resolver problemas por não ter paciência para lidar com esse canal. “Existe um grande desafio quando se fala de qualquer área de atendimento. As empresas desde o treinamento precisam para a equipe o porquê de fazer aquilo e não como deve ser feito. Porque quando confunde o ‘o que’ com o ‘porquê’, a missão perde o sentido”, destaca Nasser.
Esse segmento sofre bastante com a questão do turn over, o que corrói, muitas vezes, a passagem da cultura da empresa para os colaboradores. “Muitos jovens vêem o SAC como um ambiente de transição, isso tira a autonomia da organização treinar as pessoas bem o bastante para entender o propósito”, lembra Fábio Cruz.
“O que a gente percebe é que muitas empresas entendem o atendimento do call center como custo quando ele deveria ser investimento. Olha que coisa magnífica que é ter o cliente ligando, querendo falar com você seja pela razão que for”, analisa Hércules Maimones, da PwC. “É um momento único, tem que ser aproveitado para tratar o cliente de maneira única. Enquanto a empresa olhar pra KPIs, ver que recebeu tantas ligações e se livrou em tanto tempo, o canal não vai funcionar”.
A mensagem final que fica no painel Voz das Ruas é que é preciso ouvir, entender o consumidor e, acima de tudo, tratá-lo com transparência e simplicidade. Por que dificultar o que é simples? “Os consumidores querem um tapete vermelho na entrada e na saída. Seja para comprar ou para cancelar o serviço, a empresa precisa dar toda a atenção possível. Isso faz com que o respeito que eu recebi seja retribuído”, finaliza Adriana Araújo.