As marcas que dizem ouvir os consumidores e colocar as necessidades deles no centro dos negócios não são tão incomuns atualmente. No entanto, há até bem pouco tempo o mercado não era assim. Bem pouco tempo, mesmo. Os cases que André Luiz Almeida Toretta, sócio-fundador da consultoria A Ponte Estratégia, apresentou no Conarec 2016 chegam a parecer bizarros para quem tem menos de 20 anos.
Com a presença dos convidados Odilon Pires Machado, CEO da Átomo Comunicação, Renata Bokel, da Havas WorldWide e Stella Kochen Susskind, CEO da Shopper Experience, ele apresentou o estudo Marcas Mais Democráticas do Brasil, desenvolvido com exclusividade para a Consumidor Moderno e eles debateram o que exatamente torna uma marca democrática.
“Uma marca democrática vende para todo mundo”, resume Toretta. Sua consultoria é, como ele mesmo define, especializada em Brasil e brasileiros. E isso é importante para vender por aqui. Apesar de parecer óbvio, isso é bem recente. Nos anos 80, o marketing começa a se desenvolver, mas fora do Brasil. Por aqui, ainda éramos um país em desenvlvimento, com baixíssimos índices de escolaridade.
Assim, as propagandas com inteligência de marketing baseada em outros países não funcionavam muito por aqui. Além disso, havia algumas disparidades. As marcas que fora do país eram para todos, chegavam aqui e eram para ricos. Até o Mc Donald’s foi assim. A Coca-Cola e o Walmart, hoje tão populares e focados em consumidores.
“Nos anos 90, começamos a criar uma inteligência de marketing brasileira. Então, as empresas do mundo descobriram os brasileiros. Estamos neste grande momento de transformação, com decisões de marketing acontecendo aqui. A propaganda da Coca de 12 anos atrás só tinha loiros, era um filme americano para americano ver. Hoje, temos vídeos com pessoas com mais cara do brasileiro”, afirma Toretta.
E continua: “o marketing precisa ser para todos, mulheres, negros, pessoas de cada região do Brasil, de todos os gêneros. Estamos diante de um empoderamento do consumidor”. Ele mostra que o país vive uma ressignificação do que é ser rico, o fenômeno da ostentação. Nesse mercado, existe possibilidade de uma marca vender para todo mundo. “Uma marca democrática fala com 200 milhões de pessoas”, fala.
O estudo teve duas etapas, uma qualitativa e uma quantitativa onde foram entrevistadas 1200 pessoas, de diversas classes sociais. Assim, a marca democrática deve ter, entre outros atributos:
– Ser acessível;
– Parecer com o consumidor;
– Ter ação social;
– Ter boa comunicação;
– Ter muitos produtos em muitas lojas
– Falar como todo mundo fala
– Entender que momento de vida consumidor está passando
– Apoiar cultura popular
– Contribuir para o crescimento do país
– Ser verdadeira
– Respeitar o consumidor
– Ser amiga
Por fim, os entrevistados foram solicitados a dizer as marcas que consideravam mais democráticas. São elas:
• Avon
• Bombril
• C&A
• Casas Bahia
• Cerveja Antárctica
• Coca-Cola
• Fiat
• Havaianas
• Hering
• McDonald’s
• Natura
• Nestlé
• Nike
• O Boticário
• Omo
• P&G
• Renner
• Riachuelo
• Samsung
• Skol
Debate
“Este é o primeiro ano do estudo, ainda estamos aprendendo o que significa ser uma marca democrática em um país emergente”, afirma Toretta.
Stella Susskind trabalha muito com clientes ocultos para os estudos da Shopper. E garante que o atendimento atualmente tem se aproximado das pessoas. “As marcas podem ter uma visão democrática. Mas e no ponto de venda? Isso também está relacionado a um fator humano. Nos últimos anos vejo uma preocupação em atender melhor e de forma customizada à realidade brasileira”, diz, lembrando que antes os manuais de atendimento eram traduzidos do inglês, com práticas que não eram comuns por aqui.
Para Renata Bokel, o que contribuiu para isso também foi uma sofisticação do brasileiro que, antes, “tinha uma atitude passiva, achava que não merecia o melhor. As pessoas foram vendo que queriam sim ser bem atendidas, ter produtos de qualidade”. Segundo ela, a tecnologia trouxe essa vontade e essa ostentação. Os famosos hoje em dia realmente ostentam na TV, nas redes sociais.
“Essa democratização vem fazendo as marcas mudarem porque estão sofrendo no bolso. Democracia é contribuir para esse consumo, criar possibilidades para esse consumidor, para que ele se realize. É o caminho da democratização”, afirma Odilon Pires Machado. Ele cita como exemplo a indústria automotiva, onde algumas marcas não oferecem seu melhor para carros populares e, por isso, estão perdendo público, enquanto outras cresceram porque ofereceram o pacote completo.
“Também é preciso fazer um exercício de ‘como você convida as pessoas a fazerem parte da sua marca?’”, completa Renata. Para ela, o segmento de beleza, por exemplo, já descobriu o brasileiro e já usa figuras brasileiras, ao invés das estrangeiras, para serem embaixadoras das marcas.
“Eu sinto nos clientes preocupação com canal mais verdadeiro. Existe entender que a população da Bahia tem um valor e a de Minas tem outro”, comenta Machado. Ele deu o exemplo de um cliente, a Petronas, de lubrificantes que, antes de trazer o Lewis Hamilton, piloto de Fórmula 1, para suas propagandas, passou a realizar campanhas regionais no PDV.
“E não significa que a marca não é premium por isso, por vender para todos os consumidores. É uma questão de inteligência, se todos usam aquele produto é porque ele é muitro bom. A gente transforma discurso em coisa boa. Não consigo entender a empresa que não quer abraçar as pessoas”, conclui Renata.
Por fim, Stella finaliza afirmando que o estudo Marcas Mais Democráticas é um sucesso, é inovador. “Não se falava de marcas democráticas antes. Agora, temos grandes exemplos brasileiros. Espero que isso dure e se expanda”.