Será que a Inteligência Artificial (IA) tem potencial para reduzir a pobreza? Antes de responder essa pergunta, importante destacar os Objetivos de Desenvolvimento Social (ODS) da Agenda 2030, da Organização das Nações Unidas (ONU). Em suma, ele é um plano universal que visa promover o desenvolvimento sustentável em diversas áreas. Isso inclui a erradicação da pobreza, a luta contra a desigualdade e a mudança climática. Composto por 17 ODS, o programa busca engajar todos os países em esforços colaborativos para alcançar essas metas até 2030.
Esses 17 objetivos abrangem questões como saúde, educação, igualdade de gênero, água potável e saneamento, entre outros, refletindo a complexidade dos desafios globais. A implementação dos ODS requer a participação ativa de governos, setor privado, sociedade civil e cidadãos, cada um desempenhando um papel crucial para garantir que os avanços sejam sustentáveis e inclusivos.
IA e pobreza: quais os desafios?
Voltando agora a pergunta “será que a IA tem potencial para reduzir a pobreza?”. E a resposta é sim. Prova disso, inclusive, está no novo estudo da Humanities and Social Sciences Communications, especializada em pesquisas de todas as áreas das ciências sociais, humanas e comportamentais. Entretanto, segundo o material publicado pela editora acadêmica alemã-britânica Springer Nature, a IA possui o potencial de transformar setores como saúde, educação, energia e governança.
Entretanto, a adoção da IA não é homogênea mundialmente, com os países de baixa renda (PBRs) enfrentando desafios significativos para acessar seus benefícios. Diferentemente das economias desenvolvidas, onde a IA já é amplamente utilizada, os PBRs precisam superar barreiras como infraestrutura deficiente, escassez de profissionais qualificados e a falta de políticas que apoiem a IA.
IA na saúde: luz no fim do túnel
A área da saúde é uma das que mais pode se beneficiar com a IA em PBRs. Sistemas de telemedicina, por exemplo, têm o potencial de aumentar o acesso a serviços médicos em regiões remotas e com infraestrutura hospitalar deficiente. Em alguns países da África, já se utilizam drones autônomos para transportar medicamentos e amostras de sangue para locais de difícil acesso. Essa inovação reduz consideravelmente o tempo de resposta, assegurando que medicamentos e suprimentos cheguem de forma mais rápida e eficiente onde são necessários.
Ademais, segundo o estudo, a IA pode contribuir na triagem e diagnóstico de doenças. Isso devido à possibilidade de empregar algoritmos sofisticados para a análise de exames, como radiografias e tomografias. Ferramentas de apoio à decisão clínica baseadas em IA podem ajudar os médicos a fazerem escolhas mais precisas, especialmente em regiões onde há falta de profissionais qualificados.
IA e precisão no diagnóstico
Essas ferramentas não apenas aumentam a eficiência do processo diagnóstico, mas também oferecem uma segunda opinião, minimizando a margem de erro humano. A integração da IA em sistemas de informação hospitalar pode facilitar o gerenciamento de prontuários eletrônicos, permitindo que as equipes de saúde acessem rapidamente o histórico do paciente, resultados de exames e tratamentos anteriores.
Além disso, a personalização do tratamento é uma área que se beneficia da análise preditiva. A IA pode analisar grandes volumes de dados para identificar padrões e prever quais tratamentos podem ser mais eficazes para um paciente específico, considerando variáveis como idade, genética e condições pré-existentes. Isso abre caminho para a medicina de precisão, onde os cuidados são adaptados às necessidades individuais de cada paciente.
IA no ensino
Hoje, nos PBRs, a educação enfrenta graves desafios. Entre eles, a escassez de professores e a qualidade insatisfatória das instalações escolares. Contudo, com a IA, é possível implementar soluções educacionais personalizadas para apoiar os alunos, mesmo em áreas sem acesso direto a escolas. Só para exemplificar, estão as ferramentas de tutoria online, que podem ajudar a suprir a lacuna de aprendizado, oferecendo apoio em disciplinas como leitura e matemática.
A IA também permite um ensino adaptado, ajustando-se ao ritmo e ao estilo de aprendizado de cada estudante. Em alguns PBRs, plataformas educacionais já utilizam chatbots de IA para responder a perguntas e fornecer orientação acadêmica. Por consequência, o estudo aponta que houve uma melhora na experiência de aprendizado.
IA para gerar energia
Outro campo que a IA pode beneficiar os países menos desenvolvidos é a energia. A energia elétrica é um direito fundamental, mas em muitos países pobres, o acesso é uma luta diária. Entre os obstáculos, está a infraestrutura, geralmente antiga e mal mantida. Isso resulta em quedas frequentes de energia e longos períodos sem eletricidade.
Outro problema é o custo da energia. Famílias gastam uma parte significativa de sua renda para conseguir eletricidade, deixando pouco para outras necessidades. Por outro lado, a adoção de redes inteligentes baseadas em IA pode aprimorar a utilização da energia, minimizando perdas e aumentando a eficiência. Tecnologias de IA também têm a capacidade de antecipar falhas na infraestrutura, ajudando a prevenir apagões e garantindo um fornecimento de energia constante.
No nível do consumidor, o estudo destaca os “medidores inteligentes gerenciados por IA”. Em suma, eles possibilitam que lares e empresas acompanhem seu consumo, promovendo um uso mais responsável dos recursos energéticos. Esses avanços podem facilitar o acesso à energia e promover a sustentabilidade, além de reduzir a dependência de combustíveis fósseis, uma realidade comum em vários PBRs.
IA para transparência nos serviços públicos
Os governos de PBRs enfrentam desafios estruturais, como burocracia e corrupção, que impedem o avanço econômico e social. A automação de processos administrativos IA, por sua vez, pode aumentar a eficiência e a transparência nos serviços públicos.
Só para exemplificar, em algumas regiões, inclusive, a adoção de sistemas eletrônicos de registro de terras tem contribuído para menos corrupção e acesso facilitado aos serviços. Ademais, a análise de dados por IA possibilita decisões mais informadas, auxiliando na alocação de recursos adequados. A previsão de eventos críticos, como desastres naturais, por meio da IA, também melhora as respostas de emergência, protegendo vidas e reduzindo danos econômicos.
Portanto, os desafios enfrentados por governos de PBRs podem ser mitigados com a integração de soluções baseadas em IA. Com a colaboração entre governos, sociedade civil e setor privado, é possível não apenas superar esses desafios, mas também construir um futuro mais resiliente e sustentável onde todos possam prosperar.
Obstáculos para a IA
O estudo aponta que a adoção de IA em nível global está crescendo, refletindo seu potencial transformador. Contudo, essa adoção não é uniforme, com os países de baixa renda enfrentando um atraso considerável. Embora necessitem de IA para seu desenvolvimento, os PBRs se deparam com diversos obstáculos para usufruir de seus benefícios, o que agrava as desigualdades já existentes na adoção tecnológica.
Apesar do importante papel que a IA pode assumir no progresso dos PBR, a literatura a respeito muitas vezes desconsidera esses países, concentrando-se principalmente em economias mais desenvolvidas. “Essa exclusão vai contra os princípios de justiça distributiva e equidade global, levando-nos a investigar a relevância da IA para os PBR, estabelecer uma base teórica para sua recuperação, identificar áreas onde a IA pode ser eficaz e sugerir estratégias para superar a lacuna tecnológica”, pontua o levantamento.
Neste sentido, o documento discute a viabilidade da recuperação da IA em PBRs. Uma conclusão importante é que não há uma solução única para alcançar a recuperação da IA nessas localidades.
“Apesar dos desafios enfrentados pelos PBR, como infraestrutura digital, capital humano, robustez institucional e formulação de políticas eficazes, acreditamos que economias avançadas em IA e organizações internacionais relevantes, como UNESCO, OCDE, USAID e Banco Mundial, podem auxiliar os PBR na recuperação da IA por meio de transferência de tecnologia, doações e assistência. Em resumo, nosso trabalho vislumbra um uso global da IA que possa realmente reduzir as disparidades em desenvolvimento e inovação”, finalizam os pesquisadores Muhammad Salar Khan, Hanza Umer, e Farhana Faruque.