Qual é a perspectiva da economia brasileira para 2017? O fato é que pautar o crescimento pelo lado do consumo está fora de questão. E a eleição de Donald Trump à presidência dos EUA trouxe mais incerteza para um cenário por si só já bastante inquietante.
Questões decisivas para orientar estratégias e que foram recorrentes no 11° Seminário Internacional Acrefi, SIAC, promovido pela Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento – Acrefi no Teatro Cetip em São Paulo. Entre as diversas apresentações e debates, o evento trouxe uma visão bastante sólida sobre o que podemos esperar da presidência de Donald Trump. Otaviano Canuto, Diretor-Executivo do World Bank Group, destacou que o bilionário americano talvez estabeleça uma política com aspectos mais liberais. Há quem projete uma espécie de “Reagonomics 2.0”. Segundo Otaviano, Trump poderá tomar medidas cosméticas que o ajudem a cumprir promessas de campanha como o aumento de segurança nas fronteiras, mas não deverá realmente construir muralhas econômicas. Otaviano observa que restrições e aumento de tributação sobre artigos chineses, por exemplo, teriam imediato efeito inflacionário, afetando justamente a parcela da classe média que votou em Trump.
Soft Trump x Hard Trump
O economista acredita que haverá uma diferença entre a retórica do candidato e a prática do bilionário, que conhece as regras elementares dos negócios. Um conflito talvez permanente entre um “Soft Trump e um Hard Trump”. A pergunta que inquieta a todos é: qual irá prevalecer?
Canuto também fez comentários acerca das perspectivas para mercados emergentes. Todas elas convergem para um ponto: o retorno do crescimento vertiginoso dos mercados emergentes está comprometido. Apenas a Índia manterá taxas de crescimento mais altas, superando este ano e, provavelmente em 2017, o crescimento chinês. As expectativas de outros países emergentes estão em suspensão, até que seja delineada a visão e o impacto do “Trumpnomics”. Estaremos todos nós avaliando o novo presidente literalmente pelo que ele fala sem compreendê-lo?
Um ano de Cisnes Negros
Nassim Taleb é um dos mais talentosos filósofos da atualidade. Ex-operador do mercado financeiro, mestre na arte de identificar as bruscas quedas e debacles financeiras, Taleb elaborou uma elegante linha mestra de interpretação do mundo, baseada na ocorrência de Cisnes Negros, eventos imprevisíveis, de consequências imensuráveis e que após ocorrerem, acredita-se que poderiam ter sido evitados. Pois bem, 2016 foi um ano de Cisnes Negros, conforme apontou Marcos Troyjo, Diretor do Briclab da Universidade Colúmbia nos EUA. O especialista afirmou que eventos como o Brexit, a eleição de Trump e a escolha de Bob Dylan como Prêmio Nobel de Literatura fazem parte dessa lista de acontecimentos inusitados.
Mais seriamente, Troyjo destacou que os pilares da cultura ocidental – democracia representativa e livre mercado estão em cheque. Olhando 25 anos para o passado, o mundo se confrontava com o desmantelamento da União Soviética, a força da economia japonesa que comprava símbolos do capitalismo americano como o Rockfeller Center e a globalização irreversível. Hoje, a globalização é contestada e temida, quando não refutada, a democracia prega surpresas e flagra o mal-estar da classe média baixa e dos cidadãos comuns e o livre-mercado dá lugar a um individualismo local. Ou seja, a questão de fundo – a insegurança diante do futuro representada pela quebra e supressão do emprego industrial e a ascensão de países que atuam como fábricas do mundo em paralelo ao intenso movimento migratório e culturas e pessoas – muda o eixo da história.
A democracia está ruindo?
Marcos Troyjo provocou uma reflexão amarga: estaria o sistema democrático ruindo? A tese de Thomas Friedman de que o mundo é plano foi interrompida por um mundo cheio de vales, obstáculos e muros em construção, principalmente os mentais. Um mundo em que o Uber com seus poucos anos vale mais que a centenária General Motors e mais que a maior empresa brasileira, a Petrobras, certamente causa inquietação em grandes contingentes populacionais. Mas ainda assim há motivos para otimismo. Esse momento de refluxo das democracias dará início à uma era de “re-globalização”, onde os efeitos dessa guinada ao “individualismo local” serão absorvidos pela China, ela ganhando de mão beijada a chave do processo de globalização.
O consumidor mais confiante
James Conrad, CEO da Kantar TNS, um dos grandes institutos mundiais de pesquisa apresentou uma série histórica de levantamento dos sentimentos dos brasileiros em relação a diversos aspectos da crise e do cenário econômico. A boa notícia: pela primeira vez, desde a reeleição da ex-presidente Dilma Rousseff, a confiança dos brasileiros elevou-se significativamente: de 16% para 31% no trimestre recente. A situação pessoal é hoje a prioritária. Ou seja, cada pessoa busca formas de sobreviver diante da situação atual, talvez refletindo um certo fastio diante de mais de uma década de políticas que privilegiavam recortes menores da população. O outro dado relevante do estudo da Kantar TNS aponta para o crescimento da impressão de que o Brasil caminha na direção certa: crescimento de 16 para 30%.
Tomara que essas impressões sejam convertidas em uma realidade menos árida e tempestuosa nos trimestres seguintes, mesmo diante de tantos Cisnes Negros surgindo mundo afora.
Jacques Meir é diretor de conhecimento e plataformas de conteúdo do Grupo Padrão