Em todas as rodas de discussão sobre o desempenho das empresas, há uma palavra que está na boca de todos os empresários: competitividade. Buscar eficiência na operação, fazendo mais com menos recursos para, ao fim, estar à frente da concorrência ? não há uma empresa que não tenha esse objetivo, mas nem sempre foi assim. A palavra entrou no dicionário do varejo e foi ficando. Antes do Plano Real, o setor trabalhava com metas de curto prazo, diárias, por conta da hiperinflação. As mudanças na política econômica em 94 trouxeram maior estabilidade e também gente nova. A primeira invasão de marcas internacionais, o fortalecimento de grandes redes e o aumento das fusões e aquisições forçaram os empresários a reavaliar o negócio. Não dava mais para continuar como estava. E ouviu-se, ainda baixinho, que era preciso buscar eficiência para ser mais competitivo.
?O varejo deu um salto e teve de reaprender a operar, saindo de um modelo que se ganhava no financeiro e no giro para um modelo de resultado. Teve de aprender a importar e a lidar com um cenário com grandes redes?, afirma Alberto Serrentino, CEO da Varese Retail Strategy e diretor do conselho consultivo da SBVC (Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo). A década do consumo, de 2003 a 2012, trouxe um novo desafio. O setor mudou de patamar e se tornou um dos grandes vetores que impulsionam o crescimento da economia. Daí o discurso sobre competitividade ganhou força.
Agora o momento é outro. O crescimento econômico deu uma freada brusca, assim como o consumo. Com isso, o varejo cresce a taxas menores e as operações estão pressionadas, com custos de mão de obra e imobiliário aumentando acima da inflação. Do outro lado, a entrada de players internacionais continua. E ser competitivo se tornou um brado, requisito básico para sobreviver em um cenário de disputa acirrada pela atenção do consumidor. ?É o aumento da concorrência que gera esse desafio?, afirma Eduardo Terra, sócio-diretor da BTR Consulting e presidente da SBVC. Se antes o varejo estava calcado em preço, com o novo cenário as bases da competitividade mudaram. E a lógica é olhar a equação de traz para frente. O resultado já é conhecido: pessoas qualificadas na operação, qualidade do produto, cadeia integrada, negócio leve e eficiente, aumento do valor percebido pelos stakeholders, conquista dos clientes, aumento das vendas, queda nas despesas, mais lucro, mais dinheiro em caixa para investir, maior a expansão.
Enfim, uma lista de ganhos qualitativos e quantitativos. No fim dela, somente um agente define quem é o melhor. ?O consumidor é quem no fim da linha faz escolhas e premia as empresas que vão entregar maior valor percebido a ele. O aumento de competitividade só vira valor sustentável de longo prazo se virar valor para o cliente e para o acionista. Se isso não acontecer, a empresa não se sustenta?, avalia Serrentino. Com produto dado, falta agora estabelecer a equação. Ela é longa e envolve fatores internos e externos às empresas ? cada um com um peso, dependendo do segmento do varejo. Na conta, pesa uma agenda externa hoje pouco trabalhada. ?O varejo não tem subsídio nenhum, ao contrário de outros setores, como a indústria, por exemplo?, atesta Terra. Ele explica que o setor precisa ganhar a força que merece pelo tamanho e por tudo o que movimenta e é preciso que o varejo se una para aumentar a voz em torno de uma agenda de mudanças estruturais que travam o crescimento e prejudicam a competitividade das empresas.
Velhas conhecidas do setor, as questões legais e tributárias são algumas dessas mudanças. Juntas puxam o resultado da equação da competitividade para baixo. ?Nesse caso, o varejo tem de fazer uma mea culpa, porque o empresário não consegue agir sozinho e essa agenda tem de ser feita via política?, considera Terra. Nessa lista, a flexibilização das leis trabalhistas é prioridade. ?A legislação é engessada, antiga e dificulta a otimização de recursos?, afirma Terra. Para Serrentino, alocar pessoal de acordo com o fluxo de clientes, utilizando part-time, é uma solução que elevaria o grau de eficiência do setor. ?Mas isso não é possível. E o varejo perde, porque trabalha com um quadro médio, ou seja, atende mal no pico e tem ociosidade na baixa?, diz. As leis trabalhistas não apenas impedem o setor de flexibilizar as contratações. Alexandre Ribeiro, diretor da R-Dias, assessoria para varejo, conta um caso de uma empresa que foi multada por oferecer refeitório para 100% dos trabalhadores. É que a convenção coletiva dizia que era preciso pagar vale-refeição. ?Essa legislação já deu o que tinha de dar. Nem todas as pessoas querem ser tuteladas pelo Estado da forma que se faz com a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas). É um modelo que leva o País para o buraco com toda facilidade?, avalia.
Há ainda outros fatores que impedem o setor de ser mais competitivo: questões logísticas, que oneram a operação, são alguns deles. ?Cerca de um terço das mercadorias que sai de São Paulo para o Centro-Oeste volta para São Paulo para ser vendida. A lógica é tributária, porque mesmo a mercadoria rodando mais quilômetros há ganhos tributários nesse caminho e isso cria uma ineficiência na cadeia que não poderia existir?, explica Terra. A carga tributária no Brasil representou 36% do PIB em 2012, dado mais recente ? o que coloca o País em segundo lugar entre os que têm maior carga na América Latina, segundo a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), ficando atrás apenas da Argentina (37%). O porcentual é o maior desde o Plano Real. Além do peso, a complexidade do modelo tributário também conta. São tributos e impostos federais, estaduais e municipais, que complicam a vida dos varejistas que atendem ou têm operações em outras cidades e Estados. Enquanto os impostos e tributos corroem os lucros, os processos logísticos e de distribuição fazem o varejo perder dinheiro. ?Um mercado do tamanho do Brasil, com redes de abrangência nacional, a logística é um pesadelo, e ter de operar com eficiência, abastecendo lojas, é um desafio brutal?, avalia Serrentino. Nas estradas há de tudo, de má conservação a insegurança. Os furtos representaram perdas de R$ 960 milhões em 2012 no Brasil, segundo a NTC & Logística ? entidade que representa empresas do setor de transporte rodoviário de cargas.
A equação
Embora impeditivos políticos existam, o Brasil conta com muitas redes competitivas que conseguiram minimizar os fatores externos na equação da competitividade e aumentaram o peso daqueles itens que são gerenciáveis. ?Aqui, a gestão faz a diferença?, afirma Terra. E gerir o negócio é mudar o modelo mental de gestão. Isso significa, explica o consultor, avaliar as características do varejo brasileiro, extrair o que traz competitividade, como o atendimento mais humano, e mudar o que precisa ? no caso brasileiro, transformar a criatividade inerente ao setor no País em inovação e implantar processos e controle a partir de um planejamento de longo prazo. ?No nosso modelo mental existe o problema da falta de planejamento, disciplina e falta de controle. Temos um atendimento ao cliente que é referência global, uma humanização muito forte e processo criativo de loja e experiência de compra muito bom, mas isso é ofuscado por uma má gestão da retaguarda, falta de planejamento e poucos controle?, afirma Terra.
Há quem tenha conseguido mudar esse modelo mental e obter resultados. O Grupo Pão de Açúcar conseguiu fazer um trabalho de controle, planejamento e processos, avalia Terra. De fato, no segundo trimestre deste ano, a companhia registrou receita líquida de R$ 15,2 bilhões, com redução das despesas com vendas gerais e administrativas para 18,7% das receitas ? resultado de uma maior eficiência operacional. Para se ter ideia da importância do número, grandes redes de outros segmentos, embora com cr
escimento líquido constante, têm dificuldades de reduzir as despesas. A Marisa, por exemplo, viu a receita líquida em 2013 crescer 7,6%, mas as despesas com vendas foram 29% maiores no período, um montante de R$ 312,4 milhões. Segundo a rede, em relatório, ?a variação é majoritariamente decorrente do aumento dos esforços com propaganda realizados no período?. Outra gigante, a Riachuelo, também aumentou as despesas. Somadas as administrativas e com vendas, a alta foi de 18,6% no primeiro trimestre deste ano, um valor de R$ 378,9 milhões, que representa 42,5% da receita líquida consolidada da varejista. O crescimento, segundo a empresa, é consequência das despesas relativas às lojas novas inauguradas em 2013, entre elas a loja-conceito na Oscar Freire, em São Paulo. Por outro lado, a companhia conseguiu apresentar eficiência ao reduzir as despesas operacionais por loja em 2,5% em 2013 e em 5,7% no primeiro trimestre de 2014.
O controle de despesas é fator importante na fórmula da competitividade, segundo Ribeiro, da R-Dias. Ao lado dessa métrica, a gestão de preço eleva o potencial de a rede estar à frente no mercado. ?Se eu tiver sido eficiente na minha gestão de despesas, já estou gerando resultados e se eu tiver eficiência na gestão de preço, aumento muito o potencial de mais giro e mais margem bruta?, afirma. A precificação é métrica conhecida do varejista para ser mais competitivo. Mas de tão velha, há quem sequer tenha mudado o jeito de se fazer. ?O varejo ainda trabalha muito focado em fazer preço com base em custo, mas esta marcação é muito conservadora?, avalia Ribeiro. Em tempos como os de hoje, longe dos anos de hiperinflação e com consumidor de olho mais em qualidade, as técnicas de pricing devem privilegiar o valor entregue pela marca. ?Uma empresa competitiva não é a que cobra pouco é a que oferece a melhor entrega de valor com o preço compatível com a percepção que o consumidor tem da empresa e o do produto?, diz. Na prática, explica o especialista, quando o consumidor olha para um produto, ele faz um julgamento que considera o ambiente da loja, a exclusividade da peça, a vitrine, o atendimento. Esse consumidor está disposto a pagar mais para quem entrega mais.
Quando uma rede consegue aliar redução de despesas e precificação de acordo com o valor percebido da marca, ela pode ter uma margem ainda mais baixa em produtos que o mercado demanda mais. Na equação do preço, o varejista deve olhar para todos os itens e não apenas os 5% dos produtos que são carros-chefe na loja. ?Cerca de 95% do mix do varejista tem de ser olhado com mais cuidado, porque ele representa os outros 50% dessa conta e o empresário esquece isso?, afirma. ?O varejo não deveria olhar para o custo, mas para o mercado e o quanto ele está disposto a pagar pelo produto?, completa Ribeiro. Para isso, é preciso estabelecer parâmetros de preços a partir da concorrência e, mais importante, definir o posicionamento. Estratégia entendida e assimilada pela Óticas Carol.
A rede mudou a estratégia do franqueado ? agora, ele deve trabalhar com volume e não apenas com margem. ?Não estamos inventando a roda, o que estamos fazendo é mostrar que ganhar 8% de 200 é melhor do que ganhar 8% de cem. No final, para o franqueado, o que vale é o quanto de dinheiro ele vai ter no bolso. Ele não leva porcentual para casa?, afirma Ronaldo Pereira, presidente da companhia. ?Se quisermos montar um negócio preservando baixo volume e só porcentual, estamos fadados ao fracasso e vamos desaparecer no médio prazo. Então, precisamos aumentar a venda por metro quadrado nas nossas lojas?, completa o executivo. Esse trabalho só foi possível com as mudanças que estão sendo efetuadas pela rede desde 2009. A marca investiu cerca de R$ 20 milhões em laboratório de lentes, com as maiores marcas do mercado, aumentando a velocidade e eficiência na entrega e mudando o posicionamento ao ampliar o leque de produtos. ?Entendemos que tínhamos uma oportunidade de explorar os óculos como acessórios, a peça como identidade e estilo, bem como os óculos de sol, que eram difíceis de serem vendidos, porque a ótica tinha uma característica muito médica no passado. Demos uma modernizada?, conta Pereira.
De óculos para correção de grau, a rede passou a ser loja multimarca, com peças de marcas nacionais e internacionais que acompanham as tendências de moda. A partir daí, iniciou-se um trabalho de mudar a percepção que o consumidor tem de preço, principalmente das peças de grifes internacionais. ?Nosso posicionamento culminou com o desejo da indústria de conseguir diminuir a distância entre os preços internacionais do preço local. Tínhamos óculos que custavam no Brasil três vezes mais do que lá fora e hoje já conseguimos diminuir isso?, afirma Pereira. A indústria, diz, já reduziu os preços, mas o consumidor ainda não sabe disso. Por isso, a varejista tem investido pesado em marketing. Em 2013 foram cerca de R$ 22 milhões para mídia televisiva. Neste ano, serão outros R$ 25 milhões. ?O consumidor ainda tem a ideia antiga de preço e é importante comunicar que isso mudou. Essa estratégia [investimento em mídia] deve permanecer nos próximos anos, porque você não consegue mudar a percepção de todo um setor em tão pouco tempo?, afirma. A fórmula de preço e posicionamento tem dado resultado para a rede, que conta hoje com 680 lojas e meta de encerrar 2014 com 750 unidades e um faturamento de R$ 600 milhões, 35% a mais do que em 2013.
Tudo enxuto
A busca pela eficiência envolve também acompanhar outros indicadores internos da companhia para deixar a operação mais leve e permitir que ela possa efetuar as mudanças que o mercado exige de maneira mais rápida. E um dos pontos que as redes têm focado para tornar a operação mais eficiente é a logística. A Marisa mudou o centro de distribuição para uma área de 30 mil metros quadrados, que permitirá a companhia comportar as alterações no processo de alocação e abastecimento e o crescimento orgânico para os próximos cinco anos. O novo CD, em Itaquaquecetuba, será automatizado. Além disso, a rede inicia, a partir deste ano, testes no modelo logístico de push and pull, que abastece as lojas de acordo com a demanda de cada uma delas. Nesse modelo, o software captura as informações de venda em tempo real e permite uma reposição mais ágil das peças que estão saindo mais em cada unidade para evitar outro entrave que barra a competitividade do setor, a ruptura. ?Em gestão de estoque e controle na área comercial, o combate à ruptura é um dos itens que geram resultados absurdos. A cada ponto porcentual de redução de ruptura, há um aumento de 0,5% na venda?, explica Ribeiro.
De olho nessa conta, a Pague Menos aumentou os investimentos em abastecimento nos últimos três anos para evitar rupturas. ?Esta tem sido nossa prioridade?, afirma Deusmar de Queirós, presidente da rede. ?É aí que perdemos venda e onde conquistamos o cliente?, resume. Para tanto, a farmacêutica investiu R$ 60 milhões na construção de um centro de distribuição de 50 mil metros quadrados em Goiânia para abastecer as lojas das regiões Centro-Oeste, Sul, Sudeste e parte da Região Norte. O complexo entrou em operação neste ano e é o terceiro da varejista, que deve abrir mais 88 lojas neste ano, que serão somadas às 700 unidades em operação, e tem expectativas de faturar U$ 2 bilhões em 2014, segundo Queirós. Da mesma forma, o Grupo Paquetá ampliou o centro de distribuição de Recife, que passará de cinco mil metros quadrados para dez mil ainda neste ano. Em 2013, o grupo inaugurou um CD em Porto Alegre, de dez mil metros quadrados, para atender a Região Sul. ?O ganho é na velocidade para distribuição da mercadoria e abastecimento mais efetivo e com qualidade?, afirma Marcos Ravazolli, diretor de varejo do grupo.
Os investimentos em estoque, a logística e a distribuição não param por aí. A rede, que opera 190 unida
des de quatro bandeiras de lojas de sapatos multimarcas, ? Paquetá, Paquetá Esportes, Gastón e Esposende ? adquiriu software de gestão de estoque e compras, que estará em pleno funcionamento em 2015. A ideia é também diminuir a ruptura. ?Se a gente não tiver o produto certo, não adianta ter bom atendimento. Não tem coisa pior do que chegar na loja e não ter o número ou a cor que você quer?, explica. O investimento em estoque e logística também tem o objetivo de acompanhar o crescimento da rede, que espera somar 320 lojas até 2020. Outro fator que tem sido alvo dos investimentos do varejo para ganhar competitividade é a integração dos canais. Meio de atender melhor o consumidor, também tem papel importante no aumento da eficiência das operações. Enxuga os excessos e enxerga o negócio como um só. A integração do canal de e-commerce com a loja física e redes sociais é parte do projeto da loja do futuro da Paquetá. Ainda em teste, a iniciativa reúne várias ações para dar mais opção de escolha aos consumidores, como encerrar uma compra com o vendedor, utilizando dispositivos móveis, permitir a compra na internet com retirada e troca na loja ou mesmo a compra na loja para entrega em casa. ?Tentamos imaginar uma loja moderna, não apenas em termos de tecnologia, mas de atendimento?, afirma Ravazolli.
Integrar os canais garantiu uma operação mais leve para a Magazine Luiza. ?Trabalhamos com o on-line e off-line com a mesma razão social e a mesma estrutura. E isso é um diferencial competitivo muito importante?, avalia Marcelo Silva, diretor superintendente da rede. Para atuar com loja física, e-commerce, aplicativos e vendas nas redes sociais, a varejista se vale de uma plataforma única de venda, oito centros de distribuição e um SAC integrado. Com forte atuação no comércio eletrônico, a rede fez nova movimentação em 2013 para ampliar a oferta de produtos para os consumidores. Adquiriu o e-commerce Época Cosméticos, a primeira aquisição no mundo digital da varejista. ?O sortimento é um dos nossos principais drivers de crescimento. É preciso se adaptar ao que o consumidor deseja e atentar para a renovação desse sortimento?, avalia Silva.
Além do mix de produtos, a empresa também continua em um movimento de ampliar a oferta de serviços. Também em 2013 lançou o site Quero de Casamento, por meio do qual o cliente faz uma lista de presentes e também cria álbuns exclusivos contando a história do casal, sendo possível receber mensagens dos amigos e dar informações sobre a festa. As iniciativas têm gerado resultados. Em 2013, a receita líquida da companhia cresceu 14,5%, para mais de R$ 8 bilhões. Outras ações foram efetivadas no sentido de enxugar a operação. A companhia concluiu a venda de sua participação de 76,7% no centro de distribuição em Louveira (SP) ? o que gerou um ganho operacional líquido de outras despesas não recorrentes no valor de R$ 65,3 milhões no segundo trimestre de 2013. A conclusão de projetos de racionalização de custos e despesas e da finalização da integração das lojas do Baú e da Lojas Maia permitiu ainda a redução de despesas operacionais em 2,7%.
O Sonda também fez ajustes para deixar a estrutura mais leve. Nos últimos quatro anos, eles fizeram a varejista economizar R$ 40 milhões. As mudanças ocorreram, principalmente, em logística e lojas, cujas despesas reduziram quase 20% nos últimos quatro anos. ?Fizemos a melhora nesses processos e revisamos contratos com nossos fornecedores de logística, porque é uma parte dentro dessa conta muito importante?, avalia José Domingos Barral, presidente da varejista. ?Cortamos algumas despesas no osso. Reduzimos tudo o que achamos que era supérfluo e que não prejudicaria o atendimento ao cliente?, afirma. O resultado é que a companhia tem uma das maiores rentabilidades do setor, de 54%, e uma receita de mais de U$ 1 bilhão. ?A empresa está mais leve e sem cortes de pessoal?, afirma Barral.
As negociações com os fornecedores também ajudaram nesse processo. Contratos foram revisados e as negociações não param de acontecer. ?Estamos brigando com os fornecedores. Não existe outra forma. É sentar e mostrar para ele a situação?, conta. Outra mudança que fez diferença na operação é o trabalho de prevenção de perdas, iniciado há três anos, e que envolveu o estabelecimento de processos e um trabalho de cultura junto aos funcionários. O resultado é que o nível de quebra da rede está abaixo dos 1,5%. ?Essa é uma despesa que não é perceptível, mas é um resultado que come a minha margem bruta lá na frente?, avalia. Nessa estruturação, a tecnologia teve seu papel: a companhia ajustou o sistema de pedidos eletrônicos e implantou SAP na área financeira e está implantando na área comercial. ?Deveremos ter ganho em controle?, afirma Barral.
O fim e o meio
Papel maior em todo caminho na busca por eficiência e competitividade, no entanto, teve o quadro de funcionários da varejista. Barral conta que o maior investimento foi fazer o colaborador entender que é dele também a responsabilidade pelo crescimento da empresa. Parte dos ajustes nas lojas ocorreu com a ajuda deles. ?Eles me dizem os problemas que existem e as dificuldades que eles têm. Já tive situação de uma loja estar com problema em um equipamento e o funcionário de outra loja tinha um equipamento sobrando ? essa responsabilização faz com que todos se sintam donos?, conta o executivo. Para que isso aconteça, a rede investe em treinamento e qualificação, com parceria de instituições de ensino, sem contar os próprios especialistas que trabalham na varejista. Todo esse trabalho tem o fim de atender bem o consumidor. ?O que temos de entender é que o brasileiro valoriza o atendimento. É buscar atender melhor o cliente e respeitá-lo. Nos aproximamos dele, ganhamos intimidade e confiança ? e temos reforçado isso?, afirma Barral.
Um dos produtos da equação da competitividade, o consumidor também é meio, motivador das mudanças nas operações, principalmente no ponto de venda. Adaptar a operação, seja inserindo novas tecnologias, seja efetuando mudanças no back office, tem sido linha de atuação bem desenhada pelo varejo para ganhar competitividade. E de todas as opções para estar à frente da concorrência, o atendimento ao consumidor tem sido uma das prioridades da DPaschoal. A rede tem no projeto Economia Verde uma das bases para ser mais competitiva. Ele consiste em apenas sugerir ao cliente a substituição de alguma peça do carro somente se houver uma necessidade real da troca. ?Essa filosofia de bem estar e transparência contribui para a satisfação dos clientes?, afirma Roberto Szachnowicz, presidente-executivo do grupo.
A rede passa por um processo de trabalho da força da marca com o objetivo de atrair o público mais jovem. ?Estamos estudando novos serviços, modelos de atendimento e layouts dos nossos centros automotivos para manter o público de hoje e conquistar novos clientes futuramente?, afirma. O desafio para que tudo isso ocorra passa pela equipe, que recebe treinamentos constantes para não apenas atender bem, mas ser um agente que auxilia na tomada de decisão do cliente. A rede investe em centros de treinamentos técnicos regionais e em ferramenta e-learning para manter o quadro atento. ?Temos também um trabalho especializado de coach com nossos gerentes, filiais e líderes, apresentando as últimas tendências de mercado?, completa o executivo.
O Muffato, que atua no interior de São Paulo e no Paraná, também fez mudanças na ponta. Em 2013, a varejista instalou autocaixas nas operações para acelerar a finalização da compra do cliente. ?Também temos atuado forte em e-commerce, etiquetas eletrônicas e entre outras inovações, além das mudanças no mix de produto e na atualização de lojas, conforme a necessidade do consumidor?, afirma Everton Muffato, diretor da rede. Segundo o executivo, o momento pelo qual o País passa exige mu
danças do varejo. E a rede passou por uma adaptação do mix de produtos, para que ele seja mais adequado ao poder de compra do novo consumidor. Além das adaptações, a companhia conta com as pessoas para fazer frente à concorrência. Há dez anos, investiu em uma universidade corporativa para treinamento da equipe e formação de lideranças. ?O ganho é que você forma pessoas adaptadas aos modelos de negócio e cria um quadro de liderança mais engajado ao projeto da empresa. Quando você forma mais liderança, o resultado é imediato?, avalia.
Para Gabemar Vieira, diretor da rede Cybelar, a competitividade de um varejo passa, necessariamente, pelo fator humano. ?As pessoas é que fazem a diferença no nosso segmento, porque os produtos são similares e a proximidade da nossa equipe com os nossos clientes é importante por sermos uma rede regional?, avalia. Segundo o executivo, não basta o bom atendimento, é preciso aumentar a produtividade da equipe. E isso a rede faz também com capacitação, feita em parceria com uma consultoria especializada em varejo. Por ela passam supervisores, vendedores e toda a administração de uma loja. ?Precisamos ter o funcionário engajado e a retenção é consequência disso. Se ele não estiver comprometido, a gente não consegue reter?, afirma. Essa capacitação, diz Vieira, se traduz em experiência de compra. ?Você tem de ter um atendimento excelente, caso contrário o consumidor fica em casa e faz as compras pela internet?, completa.
Nas próprias mãos
Em um cenário lotado de players eficientes, não é à toa que o varejo tem investido em meios para se tornar mais produtivo e, por isso, competitivo. E embora os entraves externos para crescer sejam muitos e o cenário não seja o ideal, nem tudo é problema. A começar pelas próprias exigências legais. Para Ribeiro, da R-Dias, o governo tem trazido maior competitividade para as empresas do setor. ?Parece maluquice, mas em determinados segmentos o arrocho fiscal e o controle sobre a sonegação têm feito as empresas se voltarem para a gestão. O varejo se viu obrigado a fazer uma gestão contábil e a buscar eficiência para sobreviver nesse novo cenário. E segmentos em que se tinha 3% do lucro líquido hoje conseguem ter até 7%?, explica. O controle fiscal tem feito as empresas perceberem onde estão sendo ineficientes e onde gastam mais. Os níveis de perdas estão sendo melhor controlados e as redes têm, cada vez mais, adotado parâmetros para facilitar o caminho rumo à competitividade. Redes como a Pague Menos não economizam nos indicadores para ter uma visão mais detalhada da performance. ?Medimos eficiência e produtividade, faturamento por metro quadrado e por loja, faturamento por funcionário. Estamos criando parâmetros e comparando com as outras redes?, afirma Deusmar de Queirós, presidente da varejista.
Outro fator positivo trazido pelas dificuldades é a mudança na cabeça dos empresários. Segundo Terra, aumentou a consciência de que cabe a eles fazer as mudanças necessárias para sobreviver. ?Você percebe que as empresas estão atentas aos desafios de gestão e as demandas têm sido nesse sentido, de implementar processos?, avalia. Na Paquetá, o foco não é o problema externo. ?Estas questões externas impactam, mas o que está nas nossas mãos agora é nossa empresa?, afirma Marcos Ravazolli, diretor de varejo da companhia. ?Nossa preocupação é com nossa operação e o que dá para melhorar. Nossa parte tem de estar benfeita?. Se o setor todo pensar assim, não será difícil entender a lógica da competitividade.
?Para ser competitivo, é preciso ser desejado pelo consumidor?
Neil Stern, especialista em planejamento estratégico e sócio da McMillan|Doolittle, consultoria de varejo global, fala sobre a visão que tem sobre a competitividade no Brasil Estrategista, o especialista Neil Stern graduado em Columbia, com MBA na Kellogg School of Management, já desenvolveu estratégias e novos conceitos para companhias como Target, Sears, Radio Shack, McDonald?s, entre outros. Neste bate-papo, ele fala sobre a competitividade no Brasil e nos Estados Unidos.
Como você avalia a competitividade do varejo brasileiro? Quais fatores fazem uma companhia competitiva nesse setor?
A competitividade do setor de varejo no Brasil tem sido de algum modo limitado pela falta de concorrência internacional, especialmente no varejo mais específico. Em todo o mundo, esse tipo de competição eleva a régua. É possível ver isso no varejo de alimentos no Brasil, mas nem tanto em outros setores.
Esse cenário é muito diferente em outros países nos quais o varejo é mais maduro, como os Estados Unidos?
Os Estados Unidos são um mercado muito aberto. Existem poucas restrições para aberturas e um grande mercado consumidor. E isso tem aberto ainda mais o mercado a uma extrema competição. Apesar da maturidade do mercado, nos Estados Unidos iniciou-se um movimento de segmentação e especialização, com varejistas focando em um grupo de consumidores em particular. E isso só pode acontecer quando o mercado é grande e diversificado o suficiente para justificar esse movimento.
No Brasil, o varejo afirma que o modelo tributário e a legislação trabalhista impedem a competitividade. Esse questionamento é o mesmo em outros países?
Acredito que todos os varejistas reclamam sobre as regulações de alguma forma. É verdade que regulações, tanto impostas por governos como por organizações de trabalho, podem impedir o crescimento e a inovação. O princípio central nos Estados Unidos é que o capitalismo e a liberdade para inovar e empreender lideram o crescimento e melhoram os produtos para os consumidores. Certamente, isso leva a uma inovação revolucionária (pense na Amazon, no E-Bay etc.). No entanto, outros países estão enxergando como suas economias estão crescendo e criando suas próprias empresas visionárias.
Que tipo de fatores estruturais impede o varejo americano de ser mais competitivo e como as redes estão lidando com esses entraves?
Eles veem o aumento dos salários e benefícios, como os planos de saúde para todos os trabalhadores, como uma barreira para a competitividade. Eles também se queixam de regras injustas, como a não tributação do e-commerce, como obstáculos ao crescimento. Dito isso, o melhor da classe varejista continua sendo a oferta de um produto superior, experiência do cliente ou algo inovador para que os concorrentes não possam copiar. A melhor maneira de contornar as restrições é ser desejado pelo consumidor.
Como aumentar a competitividade no setor?
A melhor maneira é realmente promover um mercado aberto e colocar poucas barreiras para o crescimento e inovação. Isso faz com que todos sejam mais competitivos e faz com que os consumidores ganhem também.
O que os varejistas brasileiros precisam fazer ou mudar para serem mais competitivos?
Os brasileiros têm fome por aprender e isso se traduz em um rápido crescimento e inovação. Brasileiros são fortes em benchmarket e isso aumenta a competitividade rapidamente.
Quais varejistas você considera competitivos?
Sou impressionado por companhias como o Pão de Açúcar, que supera o crescimento de Walmart e Carrefour, gigantes mundiais. Isso porque eles estão mais próximos do mercado e são melhores na execução. Eu amo a inovação que vemos em marcas como Havaianas e Chilli Beans. Outras redes, como O Boticário, têm crescimento impressionante. Acredito que muitas outras redes vão se juntar a essas marcas rapidamente e se tornarem competitivas em escala global.
Os fatores da equação< br>O que faz um varejo competitivo
- A grande fotografia No varejo, ao contrário da matemática, a ordem dos produtos pode, sim, alterar os resultados. Por isso, para ser mais competitiva uma rede deve começar dentro de casa, fazendo um diagnóstico da situação.
- Posicionamento Nessa análise, a empresa deve ter em mente qual é o propósito da rede, o público que quer alcançar e o valor que quer entregar.
- Pente fino Com o planejamento em mãos, é hora de enxugar a operação para deixá-la mais leve. Os cortes e ajustes de despesas devem ser feitos sempre levando em consideração o posicionamento da marca.