A NRF Retail’s Big Show Asia Pacific 2024 encerrou seus trabalhos em Singapura com grandes destaques para o setor varejista. Foram mais de 7 mil inscritos, mais de 100 palestrantes reunidos em 60 sessões, além de 238 expositores de mais de 52 países ao longo de três dias de muito conteúdo. Lideranças da Amazon, Coca-Cola, LVMH, Domino’s, Mastercard e muito mais guiaram as discussões e perspectivas sobre o futuro do varejo global.
Essa visão foi marcada, principalmente, por questões associadas a Inteligência Artificial generativa, Realidade Aumentada, Realidade Virtual, Machine Learning, Reconhecimento Facial, Robótica, Data Analytics e Web3. São tecnologias que geram inquietação e inspiração para a construção de uma experiência cada vez mais fluída, segura e encantadora, seja ela física ou digital. Trata-se de uma experiência na qual as soluções se tornam “imperceptíveis” para o consumidor – ou seja, o cliente sente seus benefícios –, porém altamente “perceptível”, em seus mínimos detalhes, para as marcas, que têm acesso a verdadeiros painéis de controle sobre hábitos de consumo e comportamento de vendas, aprimorando a criação de um relacionamento com o cliente para além das transações de compra e venda.
Na pauta, também houveram discussões sobre o poder do legado, história e memórias de marca na criação de posicionamentos estratégicos fortes, a valorização profissional de quem trabalha com a leitura e interconexão de dados, e sustentabilidade, que precisa ser transversal e não tarefa de um departamento isolado. São temas que tornaram o evento único e imprescindível para o setor varejista mundial.
Confira os 5 aprendizados da NRF Retail’s Big Show Asia Pacific 2024, realizado pela primeira vez em Singapura.
1. CX ultratecnológico e mais humano
O evento reuniu executivos, lideranças e expositores de mais de 52 países em um único espaço, o Marina Bay Sands Expo and Convention Centre. No espaço da feira, tanto nos megastands de líderes globais, como SAP, Fujitsu, Google, Intel, Motorola, Sales Force, Sony e Toshiba, quanto na Start Ups Zone, as soluções apresentadas se diferenciavam no nível de complexidade e de tecnologia aplicada. Mas se igualavam em uma proposição comum: aprimorar a experiência do consumidor oferecendo soluções integradas e flexíveis para que os clientes sejam melhor compreendidos em suas expectativas, e mais eficientemente atendidos em duas demandas de consumo, de acordo com as especificidades de cada região e as necessidades de cada pessoa.
A questão foi abordada nas palestras também, comprovando que o segredo está em compreender as dinâmicas relacionais de cada mercado e aproveitar o melhor da tecnologia para ter êxito nas relações humanas. “A Coreia é um dos mercados mais avançados em e-commerce do mundo, com uma experiência mais completa, que entrega uma série de conteúdos em vídeo, infográficos e mais”, explica Adriano Araújo, presidente Asia-Pacific, Middle East and Africa do Ocado Group. “Já no Brasil, o cliente espera uma experiência muito mais limpa na compra online, e muito mais rápida. A experiência do consumidor é diferente culturalmente”.
É fácil lembrar de outros exemplos que marcaram o mercado global, como a penetração do WeChat e do Alibaba nos países asiáticos com seus superapps, ou até mesmo como o Brasil está cada vez mais modernizando seus sistemas de pagamento e financeiro, com o Pix e o Open Finance – enquanto, na Europa, a confiança em bancos ainda avança. Por isso, o entendimento do comportamento do consumidor e de suas expectativas, seja entre países, estados ou cidades, é essencial para a construção de um CX encantador.
2. Preditividade digital e proatividade humana
A NRF Retail’s Big Show Asia Pacific deixou mais do que claro que a Inteligência Artificial (IA) chegou para ficar e, com ela, a integração de dados fará cada vez mais parte do cotidiano do varejo. Processos preditivos para captar as necessidades dos consumidores se tornarão chave para antecipar demandas e criar ofertas proativas – ou seja, sem a necessidade de que o cliente entre em contato com a marca para efetuar uma compra.
Diante desse cenário, é importante que as empresas tenham essas informações muito bem claras e integradas aos demais processos, garantindo a fluidez da experiência em qualquer canal por onde o consumidor quiser se conectar.
“As expectativas dos consumidores estão cada vez mais altas, e não acho que isso vai mudar tão cedo”, destaca Greg Merrill, Global Head of Digital Transformation da Nike. “Quando falamos em obsessão com o cliente, precisamos entender quais são os seus desejos mais profundos e como é possível antecipá-los para que não tenhamos que correr atrás mais tarde”.
Achim Schneider, Global Head of Retail Business Unit da SAP, complementa que essa visibilidade deve estar presente não só no contato do consumidor com a marca, mas também com todos os processos da companhia, incluindo o supply chain. “É preciso coletar dados para ter as capacidades de planejamento adequadas para, assim, entregar a demanda”, explica. “Falamos sobre um comércio unificado. Para um consumidor, não importa se está comprando um produto em uma loja ou online. Ele está comprando uma marca”.
Apesar de tanta tecnologia e lógica viabilizando os processos das marcas, as lideranças concordam que a questão humana se torna cada vez mais relevante, já que são as pessoas quem tomam as decisões de negócios. A pergunta que o varejo deve se fazer é: os tomadores de decisão têm essas informações, e elas estão integradas? E mais: o que está sendo feito com estas análises, de forma prática?
3. O desafio de ser honesto para surpreender sempre
Christopher Thomas-Moore, também conhecido como CTM, Diretor Digital da Domino’s Pizza LLC, a número um no mercado global de pizzas, apresentou de forma carismática e ilustrada com diversos vídeos os desafios de surpreender os clientes e ultrapassar as expectativas quando o assunto é pizza.
“Estamos há mais de 60 anos no mercado, e ainda conseguimos nos manter na vanguarda da indústria de pizzas”, afirma. E o desafio de ser honesto e reconhecer os erros publicamente tem despertado a empatia dos clientes. “Não é todo dia que uma marca admite suas falhas abertamente, mas nossos clientes responderam positivamente”, disse CTM.
Ouvir os clientes pode fazer toda a diferença nos negócios, isso com muito tecnologia “Transformamos um simples pedido de pizza em uma experiência transparente e envolvente”, destaca. “IA generativa não é apenas uma palavra da moda; trata-se de criar experiências personalizadas e sob medida que ressoam com nossos clientes”.
O executivo ainda deixou uma dica para quem está pensando na melhor forma de estabelecer uma boa comunicação com os clientes. “Suas mensagens são relevantes? Abordam as tensões na vida dos seus clientes?”. É preciso ter valor, inovação e estratégias centradas no cliente para impulsionar seus negócios. E é preciso ter foco no cliente, estar atento às mudanças sem perder a sua essência, ser respeitosamente competitivo, aproveitar o que a tecnologia oferece de melhor.
Em resumo, as recomendações são: abrace a revolução, mas não perca a sua identidade; seja honesto com seus clientes mesmo que isso seja incomum; ouse, questione, desafie tudo e todos. É melhor ser reconhecido como um trabalho em progresso, do que como um antigo sucesso, o que pode levar ao fracasso. E, na dúvida, foque no cliente.
4. Manter a tradição e incorporar a transformação
Um dos painelistas do evento foi Laurent Boidevezi, presidente Asia Pacific da Moët Hennessy, marca do grupo LVMH, dono da Tiffany’s, Sephora, Louis Vuitton e outras boutiques de luxo. A Moët Hennessy possui uma longa história no tradicional setor de bebidas alcóolicas, e ainda assim está criando novas experiências para seus clientes, que vão “além da garrafa”.
Segundo Boidevezi, a Moët Hennesssy possui uma relação muito positiva com o tempo. A marca pertence a um grupo familiar com uma cultura empreendedora muito expressiva, o LVMH, que possui em sua carteira boutiques e negócios de luxo com décadas de vida, algumas com mais de 250 anos, como a Hennessy. Isso demostra uma forte resiliência frente às crises da história.
“Acho que temos uma relação bastante única com o tempo”, afirma o executivo. “Isso começa com o envelhecimento do produto – alguns são envelhecidos por cinco, dez, 20, 50 anos. Mas isso também tem relação com o que queremos alcançar numa visão de longo prazo. Queremos construir nossa maison não para o próximo trimestre, mas para os próximos 50 anos. É isso o que nos torna especiais”.
O executivo ainda destaca que, apesar da Moët Hennessy pertencer ao setor atacadista por natureza, o negócio está evoluindo e se adaptando às novas condições proporcionadas pelo varejo. “Não estou dizendo que nos tornaremos um negócio de varejo. Certamente continuaremos mais no atacado, mas queremos aproveitar o varejo para elevar nossos produtos ao próximo nível”.
A estratégia da Moët Hennessy, portanto, é utilizar o varejo para apresentar suas marcas em espaços dedicados para dar o tom e inspirar consumidores. “Não estamos mais no negócio de vender garrafas, mas de vender experiências”, conta Boidevezi. “Isso significa que precisamos animar nossas lojas e parceiros de varejo. Estamos criando experiências que podem ser uma degustação, uma interação social e masterclasses. Temos um programa de engajamento digital para convidar consumidores às nossas lojas, mas precisamos oferecer algo que vá além disso, com serviços adicionais, como personalização de garrafas, que é algo criticamente importante para nós”.
5. Sustentabilidade Interdimensional
A ideia de criar negócios, produtos e serviços cada vez mais sustentáveis e ecologicamente e socialmente responsáveis também marcaram as apresentações da NRF Retail’s Big Show Asia Pacific. O fio condutor dessa discussão não está somente no compromisso das empresas em relação às mudanças climáticas, mas também nas expectativas dos consumidores em adquirir produtos que condizem com seus valores e visões de mundo.
“A sustentabilidade não é importante apenas para o sistema de logística do varejo, mas também sobre a condução de energia elétrica da loja, como rastreia o supply chain da produção à loja”, afirma Achim Schneider, da SAP. “Trata-se de uma ação chave para fidelizar clientes. Isso também oferece uma oportunidade de negócio, criando uma economia circular dentro do modelo de varejo”.
Em resumo, é inaceitável atualmente o discurso da sustentabilidade fake, só para a campanha publicitária ficar bonita. A postura sustentável precisa ser incorporada de dentro para fora, e a partir daí, permear as dimensões de relacionamento com todos os stakeholders. Esse é o futuro factível do mundo dos negócios no eixo Ásia Pacífico. E no resto do mundo também.
*Artigo escrito em colaboração com a redação da Consumidor Moderno.
**Foto: NRF Retail’s Big Show Asia Pacific 2024.