A falta de acesso à informação sobre serviços ou produtos alimenta a maioria das ações judiciais nas relações de consumo no Brasil. Esta é a avaliação de Guilherme Farid, advogado que chefiou o Procon-SP de 2019 a 2023 e atualmente é sócio do escritório Edgard Leite, na área de direito do consumidor e direito público. Para Farid, as empresas falham ao não investirem em times de atendimento para resolver, de forma rápida e mais barata, os problemas do consumidor. A decepção do cliente ao não conseguir informações sobre seus direitos o leva a procurar outros canais de reclamação.
“As empresas têm administrado as reclamações sem vontade de resolver”, afirma Farid. “Passaram a tratar as questões jurídicas como econômicas. É um olhar muito mais econômico do que de fidelização cliente”.
Bom atendimento pode evitar judicialização
Confira os melhores trechos da entrevista sobre a relação entre empresas e consumidores.
Consumidor Moderno – Qual é o maior problema da judicialização no direito do consumidor?
Guilherme Farid – O principal ponto ainda é a falta de informação. Por exemplo, os dados do Procon de São Paulo mostram que, na maioria das multas lavradas, o artigo mais desrespeitado do Código de Defesa do Consumidor (CDC) é o 31, que trata do direito à informação do cliente.
Soma-se a esta dificuldade a falta de clareza no tratamento ao consumidor, principalmente no pós-venda. Reter o problema do consumidor, para que haja resolução, é uma deficiência no SAC das empresas.
Quando não é bem tratado nos canais adequados de atendimento, o consumidor migra para os órgãos administrativos como o Procon, órgãos reguladores, como Anatel, até seguir para o poder judiciário, instância final das reclamações do cliente.
Ao falhar no atendimento, as empresas perdem a possibilidade da solução direta dos problemas do consumidor. E, por vezes, isso não é mapeado. Quando uma empresa perde a credibilidade de um consumidor, é difícil resgatá-la.
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CM – Há algum setor onde isso tem ocorrido mais recentemente?
Farid – O setor aéreo, por exemplo. Quando se deixa o consumidor perdido no saguão, não sabe para onde ir, se o voo foi cancelado ou se está atrasado, é falta de informação, que acaba gerando uma expectativa para o consumidor de ser indenizado de algum modo lá na frente.
O que acontece hoje no setor aéreo é que cada atraso de voo é uma ação judicial indenizatória buscando danos morais. Claro que há crítica sobre a indústria do dano moral, mas a questão é justamente o que as empresas estão fazendo para evitar esse cenário.
“Quanto estão custando essas reclamações?
É um olhar muito mais econômico do que de fidelização cliente”
CM – O que as empresas podem fazer?
Farid – Falta um olhar amplo para toda trajetória do consumidor. As causas não são novas: são os mesmos pedidos no poder judiciário, nos Procons ou nos canais de atendimento das empresas. O que precisa ser feito é reforçar os times de atendimento para que seja dado acolhimento ao consumidor. E, a partir disso, você começa a mitigar os danos dali provenientes.
A empresas têm administrado as reclamações sem vontade de resolver. Passaram a tratar as questões jurídicas como econômicas. Pensam: quanto estão custando essas reclamações? É um olhar muito mais econômico do que de fidelização cliente.